A gravidade do esquema de apostas e a capilaridade da quadrilha apontada pelo Ministério Público de Goiás como responsável pela manipulação de partidas do futebol brasileiro fizeram o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, determinar na semana passada que a Polícia Federal também entrasse no inquérito.
Dino fez barulho, afirmou dar prioridade ao combate dos grupos criminosos que fraudam eventos esportivos, apontou os problemas e alternativas para mitigá-los e disse que haveria ações rápidas das autoridades. No entanto, passados nove dias desde o seu pedido para a PF entrar o caso, o inquérito ainda não foi instaurado.
“Diante de indícios de manipulação de resultados em competições esportivas, com repercussão interestadual e até internacional, estou determinando hoje que seja instaurado Inquérito na Polícia Federal para as investigações legalmente cabíveis”, afirmara o ministro no dia 10 deste mês.
A Polícia Federal se limitou a dizer ao Estadão que “realiza investigações preliminares sobre o caso” e que não pode comentar sobre investigações por se tratar de trabalho sigiloso. Nos últimos dias, a reportagem tentou entrar em contato com o ministro repetidas vezes, mas ele não respondeu às mensagens e ligações.
Dino disse na semana passada, em entrevista ao site GE que “atos concretos” como depoimentos e bloqueio de bens deveriam ser iniciados para prevenir “perpetuação de outros crimes”.
Pedido da CBF
Foi a CBF que pediu que a Polícia Federal entrasse no caso. A entidade descartou paralisar as séries A e B do Campeonato Brasileiro por não haver indícios de que os torneios em curso estejam contaminados. As competições analisadas são o Campeonato Brasileiro das séries A e B de 2022 e partidas do Paulistão e do Campeonato Gaúcho de 2023. A confederação, apurou a reportagem, ainda não recebeu qualquer contato dos policiais.
“As próprias entidades esportivas têm manifestado preocupação com essa situação. A nossa atuação junto à Polícia Federal derivou de um ofício que eu recebi da CBF. Ou seja, a CBF acionou o ministro da Justiça pedindo providências, tal é a gravidade disso”, disse Dino em entrevista à GloboNews.
Dino apontou que uma das soluções para o problema é regulamentar as casas de apostas no País. A Medida Provisória que o governo elaborou, porém, não chegou sequer à Casa Civil. Ainda está circulando nos cinco ministérios coautores da proposta e pode até virar projeto de lei com urgência. Em paralelo ao texto do Executivo, existem dois projetos de lei tramitando no Senado de autoria de Jorge Kajuru (PSB-GO) que também propõem estabelecer regras às casas de apostas.
“A regulação é dupla face: por um lado ela é fiscal, ou seja, tem a finalidade de arrecadação, para levar ao aparelhamento de um sistema de fiscalização. E ela é extrafiscal no sentido de não ser apenas arrecadatória, mas também no sentido mesmo da regulação para proteger a boa prática esportiva e a economia. Proteger até a imagem dessa atividade tão relevante para o Brasil”, afirmou o ministro.
Investigações do MP
As investigações seguem concentradas em Goiás, embora Ministérios Públicos de outros Estados estejam em contato com os responsáveis pela apuração principal. Os dados já foram compartilhados com a Justiça Desportiva. O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) já suspendeu preventivamente, por 30 dias, oito jogadores envolvidos no esquema. São 25 pessoas denunciadas pelo MP nas duas fases da operação Penalidade Máxima, entre atletas, aliciadores e apostadores.
Desde que a segunda denúncia da operação foi oferecida à Justiça, um novo procedimento investigatório foi iniciado no MP de Goiás. Ele dará sustentação a uma terceira fase da operação, que vai constatar se mais jogos da Série A do Campeonato Brasileiro foram contaminados.
Como mostrou o Estadão, em uma das trocas de mensagens descobertas, um dos investigados na operação afirmou ter influência sobre “mais de 50 jogadores da Série A”. Em outra, dois alvos da operação falavam de atuação em oito Estados brasileiros. O total de jogos manipulados, de atletas cooptados e o volume de recursos movimentados ainda estão sob apuração.
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