Ex-jogador faz rifa solidária para o tratamento de esclerose lateral amiotrófica, doença sem cura

Francisco Carlos Evangelista é portador da ELA há cinco anos e busca arrecadar dinheiro com ajuda de atletas para ir aos EUA

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Foto do author Murillo César Alves
Atualização:

A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma doença sem cura que afeta o sistema nervoso de forma degenerativa e progressiva, e acarreta uma paralisia motora irreversível. Pacientes com a doença sofrem paralisia gradual e morte precoce como resultado da perda de capacidades cruciais, como falar, se movimentar, engolir e até mesmo respirar.

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Francisco Carlos Evangelista, o Carlinhos, 58 anos, é um desses portadores da doença. Ex-jogador de futebol, com passagens por times do Ceará (Ferroviário, Guarany de Sobral, Fortaleza, entre outros), sempre foi um apaixonado pelo esporte. Em 2017, já aposentado e trabalhando como funcionário público, começou a sentir repetidas câimbras, fortes e com dores intensas. Após consultas a diversos neurologistas e fisioterapeutas, foi constatado o diagnóstico da ELA.

“Passei em diversos médicos, que não queriam colocar seu nome no meu diagnóstico. Ainda é uma doença de pouco conhecimento no Brasil”, conta Carlinhos à reportagem do Estadão. Ele foi diagnosticado já em um estágio avançado da doença, em um momento próximo à parada cardiorrespiratória.

Carlinhos passou por várias consultas caras - mais de R$ 800 para cada uma -, além de tratamentos e uso de medicamentos que não foram eficientes nos últimos anos. “Em alguns casos, os médicos praticamente me davam um atestado de óbito ao sair do consultório”, conta. Segundo dados do Ministério da Saúde, apenas 25% dos pacientes sobrevivem por mais de cinco anos após o diagnóstico.

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Por meio de duas alternativas, conseguiu melhorar sua condição de saúde e vida com a ELA. A primeira contou com o auxílio do médico neurologista Cícero Coimbra, que utilizou da vitamina D para promover a melhora no paciente; a segunda trata-se de um método inovador de indução de proteínas de choque térmico, descoberto pelo médico Marc Abreu.

O ex-jogador Francisco Carlos Evangelista, que faz tratamento para esclerose lateral amiotrófica Foto: Arquivo Pessoal

Combinados, os tratamentos promoveram uma melhora na condição de Carlinhos, que voltou a ter alguns movimentos em seus membros, além do fim de sua insuficiência respiratória. “Ainda falta muito para voltar ao meu estado antes da doença, mas pelo menos consigo viver de forma digna agora”, disse. Entretanto, o alto custo dos tratamentos é um empecilho.

Para arcar com uma nova indução de proteínas de choque térmico, Carlinhos e sua família pensaram em soluções financeiras. Lembrando de sua passagem pelo futebol, com diversas amizades e laços criado durante esse período, criou uma rifa, que conta com a ajuda de atletas e ex-jogadores.

Iarley, campeão mundial com o Internacional em 2006, Sérgio Alves, ex-goleiro do Ceará, Vina, atacante do Ceará, entre outros jogadores ajudaram com a “Rifa Solidária: Tratamento Carlinhos”. Até o momento, cerca de metade do valor necessário (R$ 30 mil) foi arrecadado. “É essencial que eu consiga fazer essa indução, para continuar com a evolução da minha condição, convivendo com a doença”.

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“Ter o apoio de colegas me enche de esperanças. Alguns gravaram vídeos, outros assinaram camisas, mas todos me deram forças para continuar a enfrentar essa doença”, afirma Carlinhos. “Eu me sinto um guerreiro, de ter forças para continuar na fisioterapia e de seguir na luta diária”, conta. Além disso, ele espera poder incentivar outros a buscarem ajuda e o diagnóstico. “Há tratamento, tem como viver com a ELA. É difícil, mas eu sou o exemplo de que é possível”.

A esperança é de que, com o passar dos anos, consiga retornar com os seus movimentos, próximo dos níveis anteriores à ELA. Além disso, não abandona sua paixão pelo futebol: aposentado desde os 28 anos, sonha em trabalhar com esporte, seja como dirigente ou até treinador. “Estudo bastante o futebol, mas a doença e o trabalho de servidor público fizeram com que não conseguisse seguir nessa área”, relata.

TRATAMENTO DA ELA

De acordo com a Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica (ABrELA), a ELA é considerada uma doença rara e estima-se que a cada 100 mil pessoas, existam entre 2 e 7 casos. No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, surgem 2.500 casos novos por ano.

É uma doença comum a atletas - conhecida em inglês como “doença de Lou Gehrig”, ex-jogador de beisebol dos anos 20 e 30 -, por conta das concussões sofridas nos jogos, em esportes como futebol, futebol americano, basquete, entre outros. Segundo o médico Marc Abreu, em entrevista ao Estadão, essas lesões de Carlinhos ao longo de sua carreira podem ter agravado a sua condição.

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“Quando ele chegou a mim, ele já estava em uma falência respiratória crítica. Antes de tudo, precisava salvar a sua vida”, disse Abreu. As funções cerebrais, que implicam diretamente no movimento dos membros, também estavam afetadas no caso do Carlinhos. A doença é agravada com o “dobramento de proteínas” no cérebro, que se acumulam e formam uma camada de lixo tóxico. Isso afeta as capacidades psicomotoras dos pacientes.

O tratamento descoberto pelo médico é capaz de reverter o quadro de doenças degenerativas, como a ELA. Em um dos estudos, Abreu encontrou o túnel térmico cerebral - estrutura do órgão que transmite sua temperatura interna para uma pequena área da pele perto dos olhos e nariz. Essa descoberta levou à patente do sistema Abreu BTT 700.

Por meio dele, é possível ter um monitoramento indireto do cérebro, por meio da indução das proteínas de choque térmico. “A ideia era atacar a causa das doenças degenerativas, e não as consequências”, afirma o médico. Ao entrar em uma espécie de cápsula, o tratamento permite medir o nível de atividade e a temperatura do cérebro.

“A melhoria do Carlinhos foi significativa. Isso só foi possível, além do tratamento, pelo apoio que teve dos familiares e ex-jogadores, com ajuda de custos e emocional. Essa solidariedade faz com que possamos salvar vidas, no Brasil e no mundo”, conta Abreu. “Ainda não é possível saber se ele vai voltar a ter seus movimentos 100% restaurados - há casos em que isso aconteceu, com a função muscular -, mas é certo que sua qualidade de vida será melhorada”.

O tratamento também pode ser visto como uma estratégia futura para “treinamento de atletas de elite e prevenção de lesões”. Segundo Marc Abreu, há estudos aprofundados acerca do tema. “A área do cérebro é ampla e vasta para ser explorada, para além das doenças degenerativas”

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