“Tudo certo. ‘Tá' na súmula. Antes do intervalo nós fomos perguntar certinho (ao juiz).” A frase revela que os atletas aliciados pela “máfia das apostas” chegaram a perguntar para a arbitragem se eles já haviam sido advertidos com o cartão amarelo. Foi escrita por Gabriel Tota, ex-jogador do Juventude, em diálogo com Bruno Lopez de Moura, conhecido como BL e um dos principais articuladores do esquema de manipulação das apostas. A conversa também indica que Tota funcionava como um aliciador dentro do vestiário, além de participar das ações em campo.
A investigação do Ministério Público de Goiás (MP-GO), na segunda fase da Operação Penalidade Máxima, denunciou Gabriel Tota à Justiça na última terça-feira. O jogador, hoje no Ypiranga, é um dos 14 atletas citados no documento preliminar de 113 páginas e teria, segundo o órgão, participado ativamente das armações em dois jogos do Brasileirão de 2022, contra Fortaleza e Goiás.
Nas conversas interceptadas pelo MP, e anexadas ao documento, Tota participou diretamente da manipulação, agindo como um receptor e aliciador de seus companheiros de Juventude. De acordo com o MP, o meia fez a conexão entre os apostadores – BL, Romário Hugo dos Santos, o Romarinho, Ícaro Fernando Calixto dos Santos e Victor Yamasaki Fernandes – e os companheiros do time que teriam aceitado participar das ações. Até o momento, dois jogadores tiveram sua participação confirmada no esquema: Paulo Miranda e Moraes Jr., sendo que nenhum deles continua no clube.
De acordo com as investigações, Tota chegou a receber até R$ 10 mil, de forma adiantada, para repassar a seus companheiros. Caso recebessem cartões amarelos, o valor aumentaria para R$ 50 mil. No vestiário, realizaram videochamadas com os apostadores para comemorar os ganhos ilícitos por meio das apostas. Pelos registros, e segundo o MP, é possível afirmar que Tota seria o articulador nesse esquema. Além de receber o valor, ele ficava responsável por “convencer” novos atletas a entrar no movimento.
No dia 2 de novembro, Romarinho perguntou a Tota se conseguiria atletas para participar do esquema na partida contra o Coritiba, pelo Brasileirão de 2022. Inicialmente, este jogo não está entre os denunciados do MP. No dia 5, no duelo com o Goiás, o meia se certificou de que Paulo Miranda efetivamente recebesse o cartão amarelo.
“Deixa tomar, manda o Paulo (Miranda) tomar”, escreveu Romarinho. “Já tomaram. Todos acho que ‘tomou’ (sic)”, respondeu Tota. Neste dia, o meia foi perguntar à arbitragem no intervalo se Paulo Miranda teria recebido o cartão amarelo no primeiro tempo, um dos critérios para receber os R$ 50 mil prometidos pela organização. Não estava preocupado em perder o colega no jogo caso ele recebesse o vermelho. Seu interesse era outro.
Aos 21 anos, Gabriel Tota surgiu para o mundo do futebol no último ano, na Copa São Paulo de Futebol Júnior, pelo Mirassol. Três gols e três assistências na campanha da equipe às quartas de final da competição. Em janeiro, foi comprado pelo Juventude, que disputaria pelo segundo ano consecutivo o Brasileirão; oito meses depois, envolvia-se na manipulação de resultados, conforme atesta o MP.
Tota assinou contrato até junho de 2025 com o Juventude, mas em abril deste ano, ele foi emprestado ao Ypiranga, no mesmo mês em que saíram os primeiros detalhes da segunda fase da Operação Penalidade Máxima. O clube gaúcho afirmou que daria todo o suporte ao atleta, que ainda não havia disputado sequer uma partida pela Série C do Brasileiro.
Enquanto aguarda a resolução do caso, o Ypiranga não descarta encerrar, previamente, o contrato de empréstimo com o jogador e “devolvê-lo” ao Juventude. Antes de sua experiência no Rio Grande do Sul, Tota atuou no Rio Preto, na Série A3 do Campeonato Paulista. Ele tem 21 anos.
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