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Geórgia vive 1ª Eurocopa após investimentos no futebol e quer sediar Mundial

Seleção conta com exportação de talentos enquanto federação tenta desenvolver categorias de base no país vizinho da Rússia, mas que busca aproximação com o Ocidente

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Foto do author Leonardo Catto

As imagens da comemoração da Geórgia comemorando a vaga inédita na Eurocopa 2024 rodaram o mundo. Ali, a seleção ganhou a simpatia de torcedores de diferentes lugares do mundo, enquanto possível “time simpático” no torneio europeu. A classificação é fruto de um investimento do país no desenvolvimento de jogadores. A Geórgia continua a ver como crescer no futebol e quer sediar, junto da Armênia, a Copa do Mundo Sub-20 de 2029. Tudo isso, enquanto flerta politicamente com o Ocidente, mas ainda tem parte do território ocupado pela Rússia.

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“O hino do nosso país foi tocado, a nossa bandeira foi hasteada e isso foi a maior felicidade. Foi um dia emocionante, com tantos torcedores georgianos e o ambiente em Dortmund. Foi especial”. A comemoração foi do presidente da Federação Georgiana de Futebol (FGF), Levan Kobiashvili, após a derrotada para a Turquia, por 3 a 1, na estreia da Eurocopa.

No elenco convocado para o torneio, três jogadores atuam em alguma das principais ligas europeias. O mais conhecido é o ponta Kvaratskhelia, que foi campeão italiano com o Napoli na temporada 2022/23. O goleiro Giorgi Mamardashvili defende também o Valencia, da Espanha. Georges Mikautadze é outro atacante e joga no Metz, da França.

Kvaratskhelia é a principal estrela da seleção georgiana. Foto: Ina Fassbender/AFP

Os três têm 23 anos. Kvaratskhelia e Mamardashvili foram revelados no Dinamo Tbilisi. O clube, junto do ucraniano Dínamo de Kiev, foi o único soviético a ganhar um torneio europeu, quando foi campeão da antiga Taça das Taças, em 1981. Recentemente, as categorias de base do Tbilisi passaram por uma reformulação, com mais foco no desenvolvimento de atletas.

O movimento é seguido nacionalmente. Recentemente, a FGF inaugurou a Academia Imereti, na cidade de Cutaisi. O local vai receber atletas nascidos entre 2009 e 2010 com base em uma seleção local. Os garotos de 14 e 15 anos poderão viver e estudar na academia por dois anos de forma gratuita e terão treinamentos aliados a aulas de idiomas, história e matemática. O centro técnico tem dois campos artificiais e dois naturais, um edifício residencial, onde foram instalados dormitórios, cantina, salas de conferências, para aulas e administrativas. O projeto teve apoio também da Fifa e da Uefa.

Entre montanhas e o Mar Negro, a Geórgia está longe de se tornar um centro do futebol mundial, mas não deixa de querer aumentar suas participações. Junto da Armênia, o país vai apresentar uma candidatura conjunta à FIFA para sediar o Mundial Sub-20. A última edição foi vencida pelo Uruguai, na Argentina. “Dois amigos e países vizinhos ricos em história do futebol, vamos candidatar-nos para sediar o torneio. Irá nos ajudar a desenvolver o futebol na Geórgia e no futuro”, comentou o presidente Kobiashvili.

Academia Imereti vai formar novos jogadores para o futebol da Geórgia. Foto: Federação Georgiana de Futebol/Divulgação

Após derrota para Turquia, ninguém quer ‘só participar’

O desafio da Geórgia no restante da Eurocopa é difícil: os próximos compromissos são contra Chéquia e Portugal. Ainda assim, ninguém pensa que está na Alemanha a passeio. “Estamos orgulhosos porque representamos a Geórgia, mostramos caráter. Este é um bom exemplo para as gerações futuras Hoje, a seleção georgiana não é uma equipe para qualquer um”, avalia o zagueiro Giorgi Gvelesiani, um dos “veteranos” do elenco, com 33 anos.

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O time é comandado por Willy Sagnol, ex-lateral direito francês do Bayern de Munique e da seleção da França. “Perder nunca é agradável, embora tenhamos apresentado o futebol georgiano de uma forma boa. Tenho certeza que jogaremos no mesmo nível no sábado”, projeta o técnico.

Acostumado com o alto nível do esporte na Europa, Sagnol não deixa de celebrar a conquista da Geórgia. “Esta Eurocopa é o resultado de muitos anos de desenvolvimento do futebol georgiano, com a federação de futebol fazendo muito pelas crianças. Jogar este torneio é uma recompensa pelo trabalho realizado. Tenho orgulho de fazer parte deste lindo momento”, disse o treinador.

Francês Sagnol já foi auxiliar técnico do Bayern de Munique, clube pelo qual jogou maior parte da carreira, e hoje comanda a Geórgia. Foto: Damien Meyer/AFP

Geopolítica entre Ocidente e Rússia

A independência da Geórgia veio em 1991, após a dissolução da União Soviética. Em diferentes momentos, os russos invadiram o território georgiano. O mais recente foi em 2008, na região da Ossétia do Sul, na fronteira entre as duas nações. “Geopoliticamente, a Geórgia e os outros países do Cáucaso, como Armênia e Arzeibaijão, são importantes, mas não tem um peso que a Ucrânia tem”, cita o professor do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Flávio Lira Nascimento, que estuda política e sociedade internacional. Após a invasão da Ucrânia, uma das sanções sofridas pela Rússia foi a suspensão de torneios da Uefa, como a Eurocopa.

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“A Rússia invadindo a Geórgia (em 2008) basicamente era um sinal que ela estava mandando para esses países da região e para o Ocidente também. Como se dissesse: ‘Esses países que fizeram independência da União Soviética são área de influência da Rússia’”, analisa Lira.

É comum a migração de russos para a Geórgia. A recepção se divide entre acolhimento e um movimento anti-Rússia. Parte do território ocupado em 2008 continua sob comando russo até hoje. A ação é condenada pela União Europeia. Ao mesmo tempo que a Geórgia tenta entrar no bloco, o país sofreu críticas por uma lei que previa taxar como “agentes de influência estrangeira” organizações que recebem mais de 20% do financiamento do exterior. A legislação dividiu a população, e protestos tomaram ruas, por a medida se assemelhar com políticas russas. A situação é um exemplo de como o país flutua entre o Ocidente e a Rússia.

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