Felipe Santos está na cidade de Haifa, em Israel, à espera de quatro vagas em algum avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para deixar o Oriente Médio e retornar ao País com seu filho de três anos, mulher e avó. Se antes pensava em permanecer por lá, o primeiro alerta de bombardeio na região em que vive por causa da guerra declarada após o ataque terrorista do Hamas fez o jogador brasileiro mudar de ideia. Em conversa com o Estadão, logo após retornar de um bunker, o atleta do Hapoel Haifa relatou como têm sido os últimos dias em território israelense em meio ao conflito.
“Nós estávamos na sala conversando e vendo o noticiário. Tenho um aplicativo que mostra em tempo real quais cidades estão sendo atacadas, quando recebemos o alerta, preparamos algumas coisas, deixamos na porta e dois ou três minutos depois o alarme tocou. Foi algo assustador que nunca pensamos em passar. Foi difícil. Tínhamos um minuto e meio para nos esconder. Saí descalço, peguei meu filho e fechamos a porta do bunker com outra pessoa e esperamos o tempo passar”, contou Santos, posicionado diante da câmera com uma bandeira de Israel pendurada na parede às suas costas.
O atacante passou pelas bases do Palmeiras, Paulista de Jundiaí e Vasco, mas fez sua carreira profissional no futebol do Leste Europeu, conquistando títulos nacionais na Eslovênia e Azerbaijão. O jogador de 26 anos conta que quando se transferiu para o futebol israelense optou por viver em uma residência que contasse com bunker próprio que ele divide com a família dona do local. “Ficamos com as mãos sobre a cabeça e esperamos o tempo passar. Um sentimento muito ruim. A orientação é ficar de cinco a 15 minutos no bunker. Ficamos ouvindo no rádio as notícias esperando o aviso para sairmos de lá.”
O abrigo em que Santos deve se proteger é descrito como uma sala com uma pequena janela, cuja utilidade é uma só: fuga em caso de a porta principal emperrar ou algum invasor tentar entrar no local. O bunker ainda conta com um rádio, algumas cadeiras e garrafas d’água.
O abastecimento a Haifa, segundo Santos, continua normal, mas o mercado começa a ser uma preocupação. “Não sabemos como serão os próximos dias. Disseram para deixarmos as casas com água e alimento não perecível, porque não sabemos quanto tempo pode durar a guerra. No mercado, algumas coisas estão faltando, outras estão repondo”.
Santos está em Haifa com o filho Asafe, de três anos, a mulher Sabrina, de 29, e a avó Rosângela, de 66. Quando a sirene tocou, o jogador só pensou em salvar sua vida, de seus familiares e deixou tudo para trás. “Uma coisa é você ver outras pessoas correndo, outra é você ter de correr. Nós não sabemos se a bomba vai cair longe daqui ou no lugar onde estamos.”
O susto e a tensão que acompanham o soar do alarme não vieram acompanhados de nenhuma explosão ou barulho de bombas. Até o momento, a circulação em Haifa permanece intacta. “Quando olho pela janela, vejo as pessoas andando na rua e de carro normalmente. Vou com meu filho em uma quadra perto de casa, mas sempre fico perto de algum bunker caso soe o alarme. Está difícil olhar para as pessoas se despedindo de filhos que foram convocados para a guerra.”
Santos tem dois colegas de time que foram chamados para servir o exército israelense. O camisa 10 do time, Tomer Yosefi, autor do último gol do Hapoel Haifa no Campeonato Israelense, foi um dos convocados, como conta o brasileiro. Um analista de desempenho do time também foi chamado para servir o exército. “O analista do clube foi para Gaza, e o camisa 10 foi para a fronteira com o Líbano”.
Saiba mais sobre o conflito entre Israel e Palestina
No último sábado, o maior ataque terrorista protagonizado pelo Hamas contra Israel deixou 1,2 mil pessoas mortas e cerca de 2,6 mil feridas. Desde então, os torneios esportivos no país foram suspensos, tanto em torneios locais como internacionais. A seleção israelense, que enfrentaria Suíça e Kosovo nesta Data Fifa pelas Eliminatórias da Eurocopa de 2024, teve as partidas adiadas.
Santos não tem expectativa de quando poderá voltar a jogar pelo Hapoel Haifa. Seu foco agora é encontrar alguma forma de deixar Israel. Sua família no Brasil envia mensagens constantemente para obter notícias e pedir que ele volte o quanto antes para São Paulo.
Dessa vez, bateram o medo e a aflição. Minha avó toma remédio de pressão, meu filho tem três anos e é possível ver no rosto dele que há algo estranho. Quando passam aviões de caça por cima da nossa casa, conseguimos ouvir. A segurança da minha família é mais importante. Já entrei em contato com a Embaixada brasileira e a única resposta é que temos de esperar uma vaga para embarcar. É um momento delicado, mas o clube me dá todo o suporte. Eles me dão a liberdade de voltar para o Brasil.
Felipe Santos, jogador do Hapoel Haifa, de Israel
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