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Luis Roberto fala sobre substituir Galvão na Globo e diz: ‘Não podemos misturar lacração e narração’

Locutor titular da emissora carioca será a voz dos jogos da seleção brasileira na Copa América e vai liderar principais transmissões durante a Olimpíada de Paris

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Foto do author Marcos Antomil
Atualização:
Foto: Helena Barreto/Globo
Entrevista comLuis Roberto de Múcionarrador da Globo

Luis Roberto conquistou um espaço na Globo que já foi de Luciano do Valle, Osmar Santos e Galvão Bueno. Voz dos principais eventos da emissora desde o início de 2023, o paulista de São João da Boa Vista reflete, em entrevista ao Estadão, sobre o novo posto e o desafio de transmitir as partidas da seleção brasileira na Copa América e as mais importantes modalidades nos Jogos Olímpicos de Paris.

O narrador de 63 anos não vê o Brasil como favorito ao título da Copa América e diz acreditar que o País possa superar o recorde de 21 medalhas conquistadas na Olimpíada de Tóquio, em 2021. Luis Roberto estará na companhia dos comentaristas Júnior e Roger Flores durante o torneio continental de futebol e viajará pouco depois para a capital francesa onde vai ancorar apenas a transmissão da cerimônia de abertura dos Jogos antes de retornar ao Rio de Janeiro para a sequência da cobertura.

Luis Roberto diz que o trabalho bem feito é que o conduziu ao posto de narrador titular (ou número um) das transmissões da Globo. Ele destaca que há diferenças de linguagem a serem adotadas durante a exibição de jogos da seleção e de modalidades mais desconhecidas. Ao longo do tempo, as suas narrações se modificaram e ganharam mais emoção. Essa alteração, segundo ele, guarda semelhanças com o tempo de rádio e é própria de uma nova forma como o público acompanha e interage com uma transmissão esportiva.

Luis Roberto de Múcio, narrador Globo, durante apresentação à imprensa sobre a cobertura da emissora nos Jogos de Paris. Foto: Thais Magalhães/Globo

Como você lida com a responsabilidade de ser o narrador titular da Globo e o responsável pelas transmissões dos jogos da seleção brasileira e dos principais eventos da Olimpíada de Paris?

Quando saí de São João da Boa Vista e fui para Campinas e Santos, onde me formei, nunca tive sonhos, eu queria ser um bom jornalista. O rádio sempre foi o motor da minha vida. Sempre quis fazer o meu trabalho direito. Essa é uma receita bacana: quando você está trabalhando direito, fazendo direito, em sintonia com o seu tempo, quando tem uma oportunidade, a tendência é que você a abrace, e é o que estou fazendo. Pressão boa, a cada dia que passa me apaixono mais pela profissão, uma pena que ficamos mais velhos.

Existe uma diferença prática nas narrações de jogos entre clubes e quando a seleção brasileira está em campo?

Do ponto de vista da dinâmica do profissional, a preparação é muito parecida. Mas no caso específico de seleção brasileira, o envolvimento é maior e diferente do cotidiano clubístico, aquela paixão é completamente diferente da seleção. Os mais fanáticos são mais críticos e existe também um Brasil mais profundo, dos rincões mais distantes. Teremos o sujeito assistindo à seleção na sua televisão de tubo. O que muda é como falar com todos esses ‘Brasis’ de uma forma intensa e correta e como trazer essas pessoas para a frente da televisão e cativá-las com o que tenho a dizer. Você fala com públicos diferentes, a linguagem tem de ser coloquial e com um tom emotivo diferente do que num jogo entre clubes. A responsabilidade é parecida, seja com o jogo de domingo ou o da seleção brasileira. Existe apenas essa diferença básica de comunicação.

Por mais de duas décadas você dividiu as transmissões da Globo com o Galvão Bueno e o Cleber Machado. Como é a relação de vocês e qual o impacto que esses anos de convivência trouxe para você?

O Galvão Bueno e o Cleber Machado construíram uma bela história nesse tempo de TV Globo e foram companheiros maravilhosos. O Galvão entendeu que era hora de parar de narrar, não de trabalhar. O Cleber seguiu um outro caminho, também vitorioso. Um companheiro que só deixou coisa boa para nós, somos amigos e temos uma relação bem bacana. Temos influências uns nos outros nesses anos todos.

Por que a narração do Luís Roberto de 2024 se parece mais com a narração do Luís Roberto dos tempos de rádio?

É muito simples: nós tivemos durante um período uma narração de televisão limpa, descritiva, sem teor emocional exacerbado. Entre 2014 e 2016, a gente começa a ter um incentivo dos executivos que passaram a liderar o esporte na Globo para que as narrações fossem mais empáticas, com mais personalidade. Nós começamos a ter mais ousadia, com bordões e pitacos de opinião. Aí existe uma coincidência, embora os veículos (rádio e TV) sejam muito diferentes. No rádio, você cria a imagem para o ouvinte, na TV você dá vida à imagem. Existe uma correspondência do jeito mais empático que a gente já fazia. É algo calculado de liberar para os narradores serem mais soltos. Depois, surgem as redes sociais. Em 2018, vem a cereja do bolo, com a construção do personagem do narrador, como alguém que está sentado ao lado daquele sujeito na sala de casa.

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Como reter a atenção do público que hoje aprendeu a assistir à televisão ao mesmo tempo em que mexe no celular, como uma segunda tela?

Existe agora um momento em que estamos modulando essa relação. A prioridade do narrador é entregar o produto como algo de televisão. Tenho dificuldade de dimensionar um lance banal no meio de campo em comparação com um lance decisivo no fim do jogo. Não consigo ser cooptado por essa tese. A gente não pode misturar lacração com narração de TV. Se vier um meme e isso divertir as pessoas nas redes sociais, tudo bem. Os influenciadores estão nas redes acompanhando a transmissão e quem curte está lá ligado no influenciador preferido. Na internet, não tem a imagem do jogo e, ao mesmo tempo, percebo que quem tenta fazer uma mistura disso está encontrado essa modulação. Inclusive quem está no streaming e está mais para TV do que internet por ter de conviver com a imagem do evento. Não sabemos ainda onde isso vai desembocar e qual será a linguagem correta para conviver rede social e TV simultaneamente. Na bola de segurança, quem estiver narrando um evento tem de entregar com a dimensão que a TV sempre entregou.

Essa modulação à qual se refere também deve partir do pessoal do streaming, nessa adaptação de linguagem que a Cazé TV, por exemplo, está tendo de fazer na transmissão da Eurocopa.

Esse exemplo é perfeito. Eles estão ali fazendo praticamente o convencional, a diferença é que em vez de estarem em pé, estão sentados de perna cruzada, com uma camiseta mais despojada. Mas a comunicação é muito parecida com a televisão. Não sei te cravar como será daqui um tempo, nem mesmo quanto tempo essa modulação vai durar.

Normalmente tratamos o futebol masculino como um esporte profissional e que merece todas as críticas, até as mais severas, enquanto com outras modalidades nos habituamos a relativizar maus resultados diante das possíveis dificuldades mais acentuadas que esses atletas enfrentam em sua rotina. Como você lida com a diferença no tom de uma opinião durante uma transmissão em eventos como um jogo de futebol e um evento olímpico?

Não só quem trabalha com, mas quem torce tem uma profundidade com o futebol. Toda vez que você tem profundidade com algo, o seu tom crítico aumenta, porque se tem domínio sobre o assunto. Isso vale para o futebol e tantas outras coisas da vida. Já quando você vai ver o Marcus D’Almeida no tiro com arco, você não o acompanhou o ciclo inteiro. Você não sabe se foi dada a ele toda a condição de preparação, mas o comentarista especializado sabe. Por isso, esse briefing com o comentarista é essencial para encontrar o ponto de equilíbrio na crítica. Na Olimpíada, a transmissão de alguns esportes é rápida, com mudanças repentinas. Nem sempre terei tempo de abordar até a crítica. É por aí que se aplica essa “tolerância”. Mas hoje em dia outros esportes estão mais expostos, como vôlei, basquete.

Qual sua expectativa para a seleção brasileira na Copa América?

Lamentavelmente temos algumas seleções à frente do Brasil: Argentina, Uruguai e Colômbia têm times mais redondos. Estamos em um ciclo novo com o Dorival Júnior. Precisamos encontrar um esteio defensivo, que proteja a linha de defesa, como foi o Casemiro em outro momento. Esse é um ponto nervoso da seleção. Temos um ataque poderoso capaz de resolver. Então, o Brasil pode ganhar por ter condição individual e por ser futebol!

Acredita em recorde de medalhas do Brasil nos Jogos Olímpicos de Paris?

De ouro, acho difícil. De medalha, acredito. Podemos sonhar com as 22 (uma a mais do que nos Jogos de Tóquio, em 2021). Seria legal ganhar os sete ouros, mas a gente tem cinco favoritos ao lugar mais alto do pódio: a dupla Duda e Ana Patrícia (vôlei de praia), Gabriel Medina (surfe), Alisson dos Santos (atletismo), Bia Ferreira (boxe) e Rayssa Leal (skate).

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