Às vésperas das quartas de final da Copa do Mundo 2022 no Catar, um gato invadiu a entrevista coletiva de Vinicius Júnior. O animal foi retirado por um assessor da CBF, que o pegou pelo cangote, de maneira que gerou polêmica e até acusação de maus tratos. Coincidentemente, ou não, a seleção brasileira foi eliminada no jogo seguinte, além de ter encarado outros fracassos, atribuídos por torcedores a uma suposta “maldição do gato”.
A mística por trás disso não é à toa. Os felinos são considerados animais sagrados em partes do Oriente Médio. O povo egípcio, já na Antiguidade, considerava esses animais como símbolos de proteção, companhia e divindade. O Centro Americano de Pesquisa no Egito atribui isso as características de dualidade, como graça e agressividade.
Há uma relação entre os gatos e o islamismo, religião de cerca de 90% da população da região. O Hadith, livro muçulmano que complementa as escritas sagradas do Alcorão, menciona a história de uma mulher que teria ido para o inferno por aprisionar um gato e privá-lo de alimento até a morte. O texto teria sido contado pelo próprio profeta Muhammad, há 2.620 anos.
Seleção em queda
A traumática eliminação nos pênaltis para a Croácia, com empate dos croatas faltando quatro minutos para o fim da prorrogação, foi o primeiro baque desde então. Em seguida, veio a indefinição pelo comando técnico. Tite já havia anunciado que não permaneceria. A CBF, então, contou com Ramon Menezes e Fernando Diniz, como temporários, enquanto aguardava a chegada de Carlo Ancelotti, tida como praticamente certa.
O italiano, porém, preferiu renovar com o Real Madrid, em mais um vexame brasileiro. Em campo, o pior desempenho brasileiro em Eliminatórias na história recente. O Brasil é sexto, atrás de Argentina, Uruguai, Colômbia, Venezuela e Equador.
O principal jogador, Neymar, que já não vinha tendo destaque depois do Mundial, está fora desde outubro de 2023, após lesão no joelho. Poderia a salvação estar em uma geração futura? Talvez, mas a seleção brasileira sub-23 foi mal no torneio Pré-Olímpico e não conseguiu a vaga para Paris-2024, mesmo com Endrick no time.
Agora, já com Dorival Júnior, o time até venceu Inglaterra e México em amistosos, mas foi eliminada nas quartas de final da Copa América após empate sem gols e derrota nos pênaltis para o Uruguai.
A competição, que era vista como uma oportunidade de consolidação e superação da fase negativa, acabou se tornando mais um capítulo frustrante na história recente da Seleção Brasileira com a renovação da equipe ainda não rendendo os frutos esperados. O Brasil venceu apenas um dos quatro jogos disputados, contra o Paraguai, último colocado do grupo D e segunda pior defesa da competição.
Descontrole populacional
Apesar das razões mais esotéricas para o grande número de gatos no Oriente Médio, há outras evidências. No Catar, há uma superpopulação dos felinos a partir da década de 1960, quando eles foram introduzidos para fazer o controle populacional de ratos. A situação gerou outro problema. Uma publicação da Universidade Hamad Bin Khalifa indicou, ainda em 2016, que o Catar tinha entre 2 e 3 milhões de gatos, e quase 3 milhões de pessoas.
A preocupação, então, é com doenças como a toxoplasmose, que pode ser contraída por humanos em contato com fezes dos gatos. Dois estudos, de 2008 e 2014, conduzidos por Universidade do Catar, Universidade de Nottingham (Inglaterra) e Universidade Park (EUA) analisam a incidência de infecção do protozoário causador no Catar. O primeiro apontou prevalência de 29,8%, e chegou a 41,2% entre maiores de 45 anos. Seis anos depois, a segunda publicação descreveu que as infecções mantiveram-se “estáveis”.
Cuidado ao segurar gatos
Na época que o gato invadiu a entrevista, o Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP) apontou que não houve maus tratos por parte do assessor da CBF. “Profissionais e demais pessoas mais habituadas a felinos conteriam o animal de forma diferente, mas na situação mencionada, a maneira utilizada foi a que, provavelmente, se apresentou ao assessor como a mais segura para se resguardar, tendo em vista não se saber a origem e condição de saúde do animal”, afirmou a nota do conselho.
A veterinária Laura Ferreira foi ouvida pelo Estadão na época do incidente do gato na entrevista da seleção. Especialista em comportamento animal da Guiavet, plataforma de acompanhamento de saúde para pets e certificada pela Cat Friendly Handling Program, ela apontou que aquela não é a forma adequada de segurar os animais. “Para mudar (um gato) de local, a melhor maneira é uma mão no tórax e a outra mão ser usada como suporte para as patas traseiras. O próprio braço da pessoa pode servir como um suporte para todo o tronco do gato, sempre respeitando o jeito que ele se sentir mais confortável”, explicou a veterinária.
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