Atual vice-campeão da Street League Skateboarding (SLS), a liga mundial de skate, da qual foi vencedor em 2023, Giovanni Vianna se mantém conectado às suas origens a cada pódio em que sobe e em todo lugar por qual passa com seu skate. O jovem de 23 anos tem raízes italianas, por parte do já falecido avô Savério, e cresceu em Santo André, onde aperfeiçoou suas manobras na pista do Parque da Juventude Ana Brandão.
O avô foi homenageado na video part - como são chamadas as produções audiovisuais de manobras na rua - lançada em 2023 e intitulada Ritorna, em referência a uma coletânea de músicas românticas italianas muito ouvidas por ele em vida. A palavra, que pode ser traduzida como “volta”, tinha a ver com o momento de Vianna, que finalmente estava andando em alto nível novamente após ser prejudicado por lesões sérias.
Tal nível de skate foi alcançado pelo atleta por causa de seu talento e esforço, mas tem a ver também com sua origem. O ABC paulista lançou muitos skatistas para mundo, desde de aqueles que se destacam competitivamente aos que se dedicam ao lado cultural e voltado ao lifestyle do esporte de rua.
“Acho que começou tudo antigamente na época da pista velha de São Bernardo. Se eu não me engano, foi uma das primeiras pistas de skate a ser feita em São Paulo. Ali, já começou sendo um berço do skate em São Bernardo. Como a gente está do ladinho de São Bernardo, a gente pegou essa cultura e foi crescendo”, diz Giovanni Vianna ao Estadão.
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Ainda na década de 1980, a chamada pista velha de São Bernardo do Campo, hoje reformulada e parte de um parque público, criou muitos skatistas, como o local Marco Aurélio ‘Jeff’ e o andreense Sandro Dias, o Mineirinho, que mais tarde se tornaria um dos maiores atletas de vert do mundo, com oito medalhas em X-Games.
A cultura de skate de São Bernardo se expandia para todo o ABC, criando uma tradição na região, de forma que sempre há renovação de gerações, seja qual for o estilo de skate praticado.
Hoje, Santo André tem três pistas públicas. Além da pista do Ana Maria Brandão, que passou por reforma recente, a cidade inaugurou em 2024 uma pista localizada no Parque Sérgio Cyrino da Silva. Há, ainda, uma terceira pista, no Jardim Ana Maria ,onde são realizadas aulas de skate em parceria com Mineirinho.
Vencedora da primeira medalha de ouro feminina do Brasil em X-Games, Karen Jonz é nascida em Santos e criada em Santo André. Ítalo Penarrubia, também medalhista da “olimpíada dos esportes radicais”, e Edgard Vovô, atual treinador da seleção brasileira olímpica de park, são outros nomes que cresceram na cidade.
“Eu acho que Santo André, o ABC em si, é uma máquina de talentos”, avalia Vianna. “Não só no skate, mas na arte, na cultura, em tudo, é muito forte esse lado. Acho que isso ajuda no skate também, porque o skate globaliza tudo isso. Então, por ser uma cidade que tem muita gente talentosa, a gente se espelha nas pessoas certas. Tem muitos skatistas profissionais em Santo André, principalmente Raicca agora, evoluindo bastante, a cada dia mais.”
O skatista, que já tem duas Olimpíadas no currículo, fala de outra andreense, Raicca Ventura, de apenas 17 anos. Ela debutou nos Jogos Olímpicos neste ano, terminando na 12ª posição, após um ótimo ciclo de classificação, no qual foi sétima colocada do ranking. Um mês depois, em setembro, foi campeã do Mundial de Park, feito inédito para o Brasil.
A adolescente é especialista no park, mas competia no street quando criança e lembra de ainda criança ver Giovanni praticando pelas pistas de Santo André e competindo. “Eu e o Giovanni, a gente já competiu muitas competições. Inclusive, quando tinha uns 12 anos, eu lembro que competia no street, e ele estava lá também, era mais novinho. A gente sempre competia por Santo André e era muito legal”, diz ao Estadão.
O sucesso competitivo de Raicca reforça a força do skate do ABC, até porque ela vem de uma família de skatistas tradicionais da cidade. Seu tio é Wanderley Arame, conhecido no mundo do skate pela criatividade e afeição por desafios. Já montou uma minirrampa flutuante na represa Billings, em 2011, e fez uma sessão sobre as águas, registrada no vídeo “Um sonho flutuante” e em fotos publicadas na revista “CemporcentoSKATE”. Em 2013, foi capa da mesma revista após realizar mais uma de suas ideias: fazer manobras em uma rampa suspensa no ar por um balão.
Hoje, Raicca é referência como Giovanni, o tio Arame e o pai Elber Bereta, também skatista, são para ela. Presente na cena do skate da cidade, mesmo depois de ganhar o mundo, ela é vista como exemplo pelos meninos e meninas que encontra pelas pistas. “Os pais também falam para os filhos assim. Ó, filha, você pode ser igual eles, olha só. Veem a gente como inspiração, eu acho muito legal”, afirma.