Márcia De Chiara Nos últimos cinco anos, a inflação dos serviços tem ficado acima da inflação total, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em 12 meses até setembro, a inflação dos serviços subiu 9,84% e o IPCA acumula alta de 7,31%. "Neste ano e no próximo não deverá ser diferente", diz o economista da consultoria Tendências Thiago Curado, lembrando o elevado nível de indexação, na casa de 40%, que persiste na economia, sustentado especialmente pelo salário mínimo. Para um IPCA projetado pela consultoria de 6,6% em 2011 e de 6% em 2012, ele estima que os preços dos serviços devem subir 8,5% a cada ano. A dificuldade de reduzir a inflação de serviços se deve ao aumento da própria procura por serviços, mantida em boa parte pela nova classe média, que mudou a estrutura social do País. "Entre 2003 e 2011, cerca de 40 milhões de pessoas terão ingressado na classe média", calcula o coordenador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcelo Neri. Com mais emprego e renda no bolso, proporcionada pelo próprio setor de serviços, essa população emergente ampliou sua lista de despesas, que anteriormente estava concentrada em produtos. Com isso, ajuda a manter a demanda aquecida por serviços. "O carrinho do supermercado tem limite. Os serviços, não", observa o sócio diretor do Data Popular, Renato Meirelles, que tirou uma fotografia do perfil de consumo da classe C. A família do porteiro Francisco Lourenço Filho, de 44 anos, é o retrato fiel da nova classe média. Dez anos atrás, os gastos com alimentação dentro de casa representavam metade das despesas que ele e a mulher Anabel Sulpino de Andrade Lourenço, empregada doméstica, de 37 anos, tinham com os três filhos, Camila, Francisco Ramon e Gustavo. Atualmente, os desembolsos com alimentos respondem por 30% das despesas mensais. Nos últimos anos, a lista de gastos da família engordou junto com a renda. Serviços de internet, TV a cabo e celular e até gastos com almoço fora aos domingos não faziam parte da rotina da família. "Hoje não fico sem internet", diz Lourenço, que usa o computador para falar com os parentes na Paraíba, ver notícias de Souza, sua cidade natal, e aprender violão em um curso gratuito disponível na rede mundial de computadores. Já os filhos não abrem mão da TV a cabo e a mulher, do telefone celular. "Celular é um serviço obrigatório", diz Anabel. Ela considera esse um gasto que lhe proporciona conforto, assim como as duas viagens de avião, no lugar do ônibus, que fez nos últimos anos para visitar os pais no Nordeste. De vez em quando, ela conta que opta pelo táxi quando sai com toda a família. A operadora de telemarketing, Elaine Cristina Alves da Silva, solteira, com 29 anos, também considera o telefone celular um serviço obrigatório. "Não dá para ficar sem, virou rotina", afirma. Além do celular, os gastos com internet e as idas à lanchonete com a mãe e a irmã duas vezes por mês são serviços incorporados à lista de despesas. Dez anos atrás, metade da renda dela e da mãe, que era bem menor, era gasta com alimentos. Hoje essa fatia gira em torno de 30%. Corte Apesar de entusiasmada com o conforto que o consumo de serviço pode proporcionar, a nova classe média está atenta às altas de preços. A família Lourenço, por exemplo, reduziu de quatro para duas vezes por mês as idas ao restaurante. Em 12 meses, até setembro, comer fora de casa ficou 8,54% mais caro, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Mercado da FGV. No mesmo período, a inflação cheia, medida pelo mesmo indicador, foi de 7,11%.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.