Seis anos atrás, o Madison Square Garden Company, grupo do qual participa James Dolan, dono do New York Knicks e do New York Rangers, anunciou uma entrada triunfal na vanguarda do esporte: uma liga profissional de videogames. Os investidores de Nova York gastaram mais de US$ 10 milhões para comprar uma participação majoritária na equipe de eSports Counter Logic Gaming e disseram que os videogames profissionais agora estavam “perto de uma enorme mudança, que acreditamos ter o potencial de gerar crescimento.”
Mas o crescimento estagnou. Quando a receita dos esportes eletrônicos começou a ficar abaixo das expectativas e os investidores passaram a desconfiar do setor, os proprietários do Madison Square Garden tentaram encontrar uma maneira de sair do negócio e, no ano passado, venderam sua equipe de destaque.
Depois de anos de alarde, os eSports nos Estados Unidos estão dando lugar à realidade econômica. Sem conseguir lucro, os donos de equipes cortaram custos demitindo funcionários e encerrando contratos com estrelas. Em alguns casos, estão vendendo suas equipes com prejuízo, desferindo um choque de realidade nas pessoas que acreditavam que os esportes eletrônicos poderiam ser a próxima grande novidade do entretenimento.
O mais alarmante é que alguns espectadores parecem estar perdendo o interesse. Eles assistiram 14,8 milhões de horas da temporada de primavera de 2023 da League Championships Series, a maior liga de eSports dos Estados Unidos, queda de 13% em relação ao ano anterior e de 32% em relação a 2021, segundo estimativas da empresa de dados Esports Charts.
“Chegamos ao ponto em que todo mundo precisa fazer um grande exame de consciência”, disse Rod Breslau, analista de games e eSports. “Foi muito hype e pouco valor de verdade”.
Assim como nos esportes tradicionais, os craques dos eSports chegam a ganhar salários de sete dígitos e competem em campeonatos que atraem patrocinadores e milhões de fãs. Na última década, investidores compraram participações em times que jogam em ligas profissionais de games como League of Legends, Overwatch e Call of Duty.
A maior delas é a League Championship Series, liga de 10 times criada em 2013 e administrada pela Riot Games, a empresa que criou League of Legends. Na liga, os times se enfrentam no League of Legends, um jogo com tema de fantasia, em partidas que lotam estádios e atraem milhões de espectadores.
Mas as ligas estão com dificuldade de fazer dinheiro. As parcerias para transmitir torneios de e-sports em sites como YouTube e Twitch se dissiparam, os patrocinadores estão cortando seus orçamentos de publicidade e os proprietários estão operando equipes com prejuízo, pois pagam altos salários aos jogadores de eSports.
Algumas equipes de esportes eletrônicos, como a Evil Geniuses, dispensaram muitos de seus jogadores mais caros de League of Legends. Outras, como a 100 Thieves, estão demitindo funcionários e executivos seniores.
O preço das ações do FaZe Clan, um grupo de eSports que abriu o capital no ano passado, caiu para apenas 50 centavos de dólar por ação. Em março, o FaZe recebeu um aviso de fechamento de capital da Nasdaq, alertando que poderia ser removido da bolsa de valores se suas ações não voltassem a subir acima de US$ 1. Na sexta-feira, a FaZe disse que estava demitindo cerca de 40% dos funcionários, após uma rodada de cortes em fevereiro. A notícia foi publicada pelo Digiday.
Jack Etienne, presidente-executivo do grupo de eSports Cloud 9, disse que cortou custos retirando-se de quase metade das ligas das quais sua organização participava (eram cerca de quinze, agora são oito).
A TSM, uma das organizações de eSports mais valiosas, disse no sábado que estava vendendo sua vaga na League Championship Series. É um grande golpe para a liga, semelhante a uma franquia marcante deixando a NBA ou a NFL, porque a TSM é uma das marcas mais antigas e proeminentes dos eSports norte-americanos.
A TSM começou a conversar com grupos interessados há cerca de três semanas, de acordo com uma pessoa com conhecimento das discussões, e reduziu sua lista de possíveis compradores a cerca de uma dúzia de entidades, sobretudo da mídia e do mundo dos esportes tradicionais. O preço pedido está na faixa de US$ 20 milhões, disse a pessoa.
Andy Dinh, presidente-executivo da TSM, disse em entrevista que a saída da liga dos Estados Unidos tinha a ver com seu desejo de disputar um campeonato mundial, e não com problemas econômicos. A maioria das melhores equipes de League of Legends vem de lugares como China ou Coreia do Sul, e a América do Norte há muito fica atrás dessas regiões em termos de força competitiva.
Dinh disse que planeja comprar uma vaga em uma das principais ligas de League of Legends em outras partes do mundo depois de vender sua vaga nos Estados Unidos.
A Riot Games agora está sob pressão. League of Legends gerou bilhões de dólares em vendas ao longo de sua história, mas a liga de eSports em torno do título está perdendo dinheiro faz tempo. Isso funcionou bem para a Riot, de propriedade da gigante chinesa da internet Tencent, porque a Riot pode usar a liga para atrair interesse pelo jogo.
Mas essa fórmula a tem colocado em conflito com os donos das equipes de eSports, que pagaram à Riot pelo menos US$ 10 milhões por uma vaga na liga e receberam a promessa de que teriam lucro. Este mês, depois que as equipes solicitaram, a Riot concordou em remover a exigência de que as equipes participassem de uma liga de League of Legends em desenvolvimento - um degrau abaixo da League Championship Series - o que poderia ajudar as equipes a economizar dinheiro.
No mês passado, a Riot publicou uma longa postagem em seu blog admitindo erros e tentando tranquilizar os investidores. Os otimistas dos eSports apontam para dois pontos positivos principais: a juventude dos espectadores de esportes eletrônicos, o que atrai os anunciantes, e a promessa de ganhar dinheiro com a venda de itens com temas relacionados a eventos de eSports. No ano passado, a venda desses itens em outro jogo da Riot, o Valorant, rendeu US$ 42 milhões, metade dos quais foram para times que participam da liga Valorant, disse a Riot.
John Needham, presidente de eSports da Riot, reconheceu que o setor tem problemas. “Grande parte do que estamos vendendo é o sonho, é o futuro de longo prazo dos eSports. E quando perdemos uma equipe e ela não consegue gerar investimentos com base nesse sonho, vemos isso como um fracasso”, disse Needham em entrevista. “Então, estamos sentindo a pressão, com certeza”.
Para o grupo Madison Square Garden, vender a Counter Logic Gaming, sua equipe de eSports, foi um esforço para reduzir perdas. Mas a empresa não conseguiu encontrar um comprador que pagasse o suficiente para cobrir os custos, disseram quatro pessoas com conhecimento da situação.
Em vez disso, o Madison Square Garden demitiu várias dezenas de funcionários da Counter Logic Gaming e no mês passado fechou um acordo para fundir seu ativo restante - sua equipe de League of Legends - com a NRG Esports, uma outra organização de eSports.
O grupo Madison Square Garden não recebeu nenhum pagamento em dinheiro pelo negócio. Ao contrário, pagou à NRG vários milhões de dólares para assumir os custos das instalações da CLG e os salários dos 25 funcionários restantes, disseram três pessoas familiarizadas com a transação. Alguns aspectos do acordo foram relatados anteriormente pela The Jacob Wolf Report, uma plataforma de notícias de eSports.
O grupo Madison Square Garden recebeu uma participação minoritária na empresa-mãe da NRG, chamada Hard Carry Gaming, o que lhe permitiu manter uma posição nos eSports. Dan Fleeter, vice-presidente sênior do Madison Square Garden Company, também foi nomeado para o conselho de administração da Hard Carry Gaming como parte do acordo, disseram as pessoas.
David Hopkinson, presidente do Madison Square Garden Sports, disse em comunicado que o acordo permitiria à empresa “continuar sendo um investidor significativo no setor de eSports”.
Alguns veem o êxodo como uma oportunidade. Andy Miller, presidente da NRG Esports - que comprou a equipe League of Legends do Madison Square Garden - disse que viu uma abertura no setor com a saída dos grandes nomes. “É um momento difícil, mas é o nosso momento”, disse Miller, ex-executivo de tecnologia e coproprietário do Sacramento Kings, da NBA. “Acho que é uma oportunidade para roubar um monte de fãs”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
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