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21/02/2024 -  PISTA DE ATLETISMO - ESPORTES - Pista destruída de atletismo do Icaro de Castro Mello, no Ibirapuera.  FOTO:WERTHER SANTANA/ESTADÃO CONTEÚDO. Foto: WERTHER
Foto: WERTHER

Pista de atletismo do Ibirapuera está destruída; veja a situação das outras pistas em São Paulo

Capital paulista tem três pistas com certificação classe 1 da World Athletics; sem equipamentos adequados, técnico histórico do atletismo brasileiro e Fabiana Murer falam em prejuízo a uma geração de atletas

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Foto do author Ricardo Magatti
Atualização:

O que há anos estava abandonado, esvaziado e sucateado foi destruído. Um dos locais mais importantes para a história do atletismo nacional, a pista do Estádio Ícaro de Castro Melo, no Complexo do Ibirapuera, em São Paulo, onde já treinaram e competiram campeões olímpicos brasileiros e estrangeiros, não existe mais.

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Os tratores da Ultimate Drift removeram recentemente o piso emborrachado que revestia a pista para a realização de um evento de carros de corrida, posteriormente remanejado para outro local pelo Governo do Estado de São Paulo devido à enorme repercussão negativa. Restaram, onde era uma pista, fragmentos de grandes blocos de borracha amontoados, dos quais desviam as pessoas que ainda correm lá, e as memórias de quem tinha o local como a sua segunda casa.

“Levei minha filha anos atrás e a pista já estava cheia de bolha. Eu falei pra ela que saltava aqui, que era tão legal. Para quem treinou, competiu e conseguiu boas marcas, as memórias são muito boas”, diz ao Estadão Fabiana Murer, que treinou por uma década, entre 1999 e 2009, na pista do Ibirapuera. Foi lá que ela bateu pela primeira vez o recorde sul-americano do salto com vara ao alcançar 4,80m.

“Me desenvolvi bastante naquela pista. É muito triste ver a pista cheia de bolha, mal cuidada, com o gramado alto”, afirma a ex-atleta. Ela ressalta que a ausência de bons equipamentos esportivos prejudica o surgimento e desenvolvimento de novos talento e diminui a possibilidade de o Brasil se posicionar entre os melhores em Mundiais e Jogos Olímpicos.

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Sucateada há anos, pista de atletismo do Estádio Ícaro de Castro Melo foi removida por tratores de um evento de carros Foto: Werther Santana/Estadão

“Sempre se cobram muitas medalhas em Mundial e Olimpíada, mas como cobrar um atleta sem estrutura para treinar?”, questiona. “O atleta não tem tranquilidade quando tem de desviar de bolha, de buraco, de não ter um lugar perto da casa dele para treinar”.

Conhecido personagem da comunidade do atletismo, Nélio Moura, de 60 anos, frequenta a pista do Ícaro de Castro Melo há 40 anos. Correu lá como atleta pela primeira vez em 1976. Em 1984, passou a treinar no local grandes nomes do atletismo nacional, como Maurren Maggi, campeã olímpica no salto em distância em 2008, e o panamenho Irving Saladino, também vitorioso na mesma prova no naipe masculino nos Jogos de Pequim, na China.

Nélio Moura ainda dá suas aulas lá, mas de forma bastante limitada. O treinador vai ao espaço três vezes por semana - às terças, sextas e sábados - para passar aos seus comandados um treino de forma e velocidade na rampa, além de usar a academia do complexo esportivo. Mas o mais importante, a pista, ele e seus atletas não podem mais usar.

“O que mais me chateia é a pista ter sido deixada de lado. É um processo de abandono de muitos anos”, constata. O estádio foi usado como hospital durante a pandemia. Depois disso, a pista foi inutilizada de vez. Durante sua gestão, o ex-governador João Doria tentou conceder o Ibirapuera à iniciativa privada, mas o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) determinou, em novembro de 2021, o tombamento provisório do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, onde estão o Ginásio do Ibirapuera, o estádio e a pista de atletismo.

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Quem ainda corre na pista do Complexo do Ibirapuera tem de desviar do amontoado de blocos de borracha  Foto: Werther Santana/Estadão

A tentativa de organizar um evento de drift na já detonada pista e a posterior pressão da comunidade esportiva podem fazer o governo do Estado viabilizar a tão esperada reforma do espaço, acredita Moura.

“O Ibirapuera sempre foi uma referência. Vários atletas estrangeiros, como o uruguaio Emiliano Lasa, finalista olímpico no Rio, vieram a São Paulo para treinar lá. Tinham panamenhos, peruanos, búlgaros treinando lá”, destaca o treinador. “É uma história riquíssima, precisamos reconstruir isso para dar continuidade a essa história”.

A última competição oficial no local foi o Campeonato Paulista de Masters, em 2019. A pista não recebe um torneio nacional desde 2015, quando sediou o Campeonato Brasileiro mirim de atletismo. A última reforma do piso foi em maio de 2011, realizada pela Recoma com o mesmo material da pista do Estádio Olímpico de Berlim, onde o astro olímpico e mundial, Usain Bolt, bateu o recorde dos 100 metros rasos, que até hoje não foi superado.

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A empresa calcula que a durabilidade de uma pista seja de cinco anos, em média. No entanto, a garantia é condicionada ao uso. Depende, portanto, da manutenção e preservação da superfície.

“O material da pista apresentava mantas cobertas com revestimento de borracha EPDM de alto desempenho e absorção de impacto - tecnologia de padrão internacional para a modalidade. Nas bases, havia outra manta adesiva de poliuretano à prova d’água, que requer técnicas especiais de vedação para impedir infiltrações”, explica a Recoma, que afirma ter instalado mais de 70 pistas com materiais aprovados pela World Athletics.

Governo do Estado diz que existe plano de restauro para a pista do Ibirapuera Foto: Werther Santana/Estadão

Plano de restauro

A Secretaria de Esportes do Estado de São Paulo afirma que a recuperação do Conjunto Desportivo Constâncio Vaz Guimarães “é a prioridade da atual gestão” e diz que solicitou ao Iphan a prorrogação de seis meses para a realização de reparos no estádio Ícaro de Castro Melo, incluindo manutenção do gramado, pinturas e obras elétricas.

A pasta anunciou também que a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) e a Federação Paulista de Atletismo passaram a fazer parte do grupo de trabalho responsável pelo projeto de reforma do Complexo do Ibirapuera.

Em nota enviada ao Estadão, o Iphan disse que, após o revestimento emborrachado da pista de atletismo ser retirado, uma vistoria realizada na semana passada não constatou “danos na base da pista”. Também informou que vai analisar, em 45 dias, o pedido da secretaria de Esportes para prorrogar a aprovação de intervenções concedida em março de 2022.

Os planos do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) são outros, porém. Ele tenta, na Justiça, reverter o tombamento do complexo. “Na minha visão pessoal, não há por que a gente ficar preso a uma arquitetura que já está obsoleta”, disse o governador recentemente. “Podemos fazer uma arena com porte, tamanho, da envergadura que São Paulo merece, muito mais moderna, para acomodar competições”.

Pista de atletismo do Centro Olímpico, uma das mais modernas do País Foto: Taba Benedicto/Estadão

Pistas classe 1 em São Paulo

Segundo a CBAt, atualmente, a cidade de São Paulo não tem pistas para a realização de GPs internacionais e do Troféu Brasil, principal competição nacional da modalidade. São três pistas na capital paulista com certificação classe 1 da World Athletics, entidade que comanda o atletismo mundial: a do Ícaro de Castro Melo, no Ibirapuera, a do Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa (COTP) e a do Centro de Treinamento Paralímpico.

No entanto, a listagem feita pela World Athletic com as melhores pistas de cada país é de janeiro de 2023 e não retrata o momento atual, visto que a pista do Ibirapuera está destruída. O município tem outros equipamentos, como a pista do Centro Esportivo, Recreativo e Educativo do Trabalhador (CERET), na zona leste da capital paulista, inaugurada no fim do ano passado, mas sem certificação máxima. Além disso, lá o piso é de grama sintética e a pista não pode ser usado para provas de campo.

Conforme o presidente da CBAt, Wlamir Campos, a pista de atletismo da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em Cuiabá, tem as melhores condições para receber provas internacionais. O local sediará em maio o Campeonato Ibero-Americano, uma das principais competições da modalidade, e recebeu o último Troféu Brasil, em 2023. Para treinamento, a pista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, é considerada a mais moderna.

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Pista de atletismo do Centro Olímpico está em boas condições, mas precisa de reparos nos corredores de salto Foto: Taba Benedicto/Estadão

Pista do Centro Olímpico

O Estadão visitou as três pistas para checar as condições de cada uma. Localizado no complexo do parque das Bicicletas, na Vila Clementina, zona sul de São Paulo, está a estrutura do Centro Olímpico, mantido com recursos da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer. Inaugurada em 2010 e depois reformada em 2019 com investimento de R$ 4 milhões, a pista está em boas condições.

Mas o corredor de saltos está desgastado e passará por reparos que, segundo apurou o Estadão, custarão R$ 350 mil à gestão municipal. “É reparo, não reforma”, salienta o diretor do Centro Olímpico, Mario Maeda Júnior. São 400 metros de pista e oito raias. Há arquibancada para 1.500 pessoas no local.

Em 2022, a pista recebeu o Grande Prêmio Internacional Brasil de atletismo. Em julho do ano passado, foi disputado lá o Campeonato Sul-Americano, no qual o velocista Erick Cardoso se tornou o primeiro brasileiro a correr os 100m abaixo de 10 segundos, tornando-se o recordista brasileiro da modalidade.

Pista de atletismo do Centro Paralímpico Brasileiro recebe majoritariamente atletas paralímpicos e pessoas com deficiência Foto: Taba Benedicto/Estadão

Pista do Centro de Treinamento Paralímpico

Conservada e de qualidade, a pista de atletismo é uma das atrações do Centro de Treinamento Paralímpico, localizado na rodovia dos Imigrantes. Foi lá que o velocista Paulo André competiu pela primeira vez oficialmente depois de participar do Big Brother Brasil, reality show da Globo, em abril do ano passado. No último domingo, Renan Gallina, um dos principais nomes da nova geração do atletismo brasileiro, foi um dos atletas que disputou o desafio CPB/CBAt.

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Ocorre que se trata de um espaço construído para ser usado majoritariamente por atletas paralímpicos, crianças e jovens com deficiência. Eventualmente, atletas olímpicos competem na pista. Em 2023, o espaço recebeu 62 eventos esportivos apenas do atletismo. Na pista, foram quebrados alguns recordes mundiais. Um dos mais recentes fez o atleta paralímpico Petrúcio Ferreira, da classe T47 (amputados de braço), entrar para a nova edição do Guinness Book. Ele fez a marca de 10s29 na prova de 100m rasos da classe T47, em 2022.

O CT paralímpico foi inaugurado em maio de 2016 e custou R$ 264,272 milhões, sendo R$ 149,630 milhões investidos pelo governo Federal – por meio do Plano Brasil Medalhas – e R$ 114,642 milhões pagos pelo governo estadual. Trata-se do principal centro de excelência do Brasil e da América Latina e um dos melhores do mundo no esporte de alto rendimento.

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