Mais um presidente da CBF é retirado do cargo pela porta dos fundos. O cartola da vez é Ednaldo Rodrigues. Ele não roubou nem foi envolvido em corrupção. Mas não cumpriu, de acordo com a Justiça do Rio, as leis e regras para se eleger. Vale dizer que o presidente da CBF é o esportista mais importante do futebol brasileiro, representante de peso na América do Sul e também na Fifa, não por ele mesmo, mas pelo fato de o Brasil ser o único país pentacampeão do mundo.
Ednaldo é mais um cartola da entidade que deixa o cargo a fórceps. Não surpreende, mas deveria. Todos os últimos presidentes das últimas décadas, do século passado, inclusive, se valeram do cargo para aumentar a folha corrida de falcatruas, alguns foram presos, outros andaram de tornozeleiras eletrônicas, alguns condenados por corrupção não podem deixar o País com a certeza de que serão presos pela polícia internacional. Tem de tudo. Todos eles passaram a atuar nas sombras.
Tudo isso aconteceu nos últimos 40 anos debaixo das barbas dos patrocinadores da CBF e, por consequência, da seleção brasileira. O compliance dessas marcas parece não se incomodar em se juntar com a entidade, ou está satisfeito com as explicações recebidas cada vez que um desses cartolas são retirados do cargo pela Justiça. É problema deles. Toda vez que o Estadão procurou esses mesmos patrocinadores para comentar sobre essa imagem arranhada, as respostas foram do tipo “estamos acompanhando para tomar nossas decisões”.
De Ricardo Teixeira a Ednaldo Rodrigues, passando por Marco Polo del Nero, José Maria Marin e Rogério Caboclo, todos eles foram escorraçados do comando do futebol nacional por abuso do poder. Isso talvez explique o estágio da seleção brasileira, da gestão esportiva, do empobrecimento dos clubes, da falência de outros, dos estádios ruins, da cegueira do VAR, do calendário desumano de jogos, mas dos cofres sempre cheios. A CBF divulgou receita de R$ 1,1 bilhão em 2022, seu recorde. Os números de 2023 não foram divulgados.
Como avançar num esporte dessa forma, quando quem manda não passa confiança? A CBF vive sob essa condição há anos, com respiros instantâneos quando uma taça é erguida ou uma bola entra no gol. A saída de Ednaldo Rodrigues, sem entrar no mérito da lei da instituição privada e das explicações jurídicas, enfraquece a CBF e o comando do futebol.
Queria me ater ao fato de o presidente ter negociado com o italiano Carlo Ancelotti, do Real Madrid, para assumir o comando da seleção em junho de 2024. Olha a vergonha! Agora, Ednaldo está afastado e novas eleições na entidade serão marcadas para eleger um novo cartola. Como fica o convite feito a Ancelotti? E os valores negociados? O tempo de contrato? Que segurança a CBF passa ao treinador estrangeiro? E aos patrocinadores que despejam milhões de reais nas contas da entidade?
É uma vergonha o que ocorra na CBF. Não digo que todos lá dentro compactuam com os mandos e desmandos nem que não haja profissionais competentes e dispostos a melhorar o futebol. Mas tudo parece acontecer no jeitinho condenável der sempre, empurrando a sujeira para debaixo do tapete, atropelando regras e leis, dando de ombros para os caminhos retos e tomando direções tortuosas, de modo a sempre dar brechas para advogados e para a própria Justiça intervir.
A cúpula da CBF é torta. Já passou da hora de uma intervenção na entidade que comanda o futebol brasileiro, o maior bem do País, mais até do que a MPB (Música Popular Brasileira) e o carnaval. O futebol não pode ficar mais nas mãos dessa gente. É tudo farinha do mesmo saco. São muitos favores e comprometimentos. Deve haver uma maneira democrática e honesta de arrumar a casa.
Os presidentes de clubes, mais relacionados com os torneios nacionais e suas coisas, também têm culpa nessa dependência da CBF porque são incapazes de se organizar a ponto de criar uma liga para cuidar do dinheiro das transmissões dos jogos. Se tirar esse serviço da CBF, eles poderão se tornar mais independentes da entidade. Depois, poderão fazer o mesmo com o VAR. Depois ainda com quem organiza o calendário. E assim os clubes vão esvaziando a entidade, de modo a deixar para ela apenas a seleção masculina e feminina e de base e toda a sua insignificância. E torcer para que apareça alguém mais competente e que respeite as leis. Hoje, não se sabe nada sobre o futebol brasileiro e seus caminhos. Ninguém confiança na CBF.
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