As declarações de Leila Pereira foram bélicas. Ela não usou da diplomacia do seu cargo de presidente para resolver a questão interna do futebol do Palmeiras com sua torcida, ou parte dela, a mais barulhenta e capaz de decidir uma eleição no clube. O que Leila fez foi jogar gasolina na fogueira, uma fogueira de vaidades sem limites das partes e que expõe jogadores e a própria comissão técnica liderada por Abel Ferreira. Ela se deixou levar pela emoção e pelo poder provisório que tem ao ocupar a cadeira das decisões. Ela deveria saber que essa cadeira não lhe pertence e nunca vai pertencer a nenhum presidente, diferentemente da mesma cadeira de suas empresas. Isso é uma constatação. Há ocupantes e não donos.
As desavenças de Leila com a Mancha não dizem respeito ao clube, tampouco ao torcedor comum, muito menos aos jogadores e ao técnico Abel Ferreira. Atletas e comissão técnica só fizeram trabalhar nesses últimos três anos, ganhando títulos históricos e dando muita satisfação e orgulho a todos. Muito mesmo. Basta ir aos jogos do time para constatar isso. A torcida uniformizada tem a obrigação de entender isso, mesmo criticando jogadores que não deram certo. Isso acontece em todos os times do mundo, até mesmo dos badalados Real Madrid e Manchester City.
Os torcedores estão nisso há décadas, então deveriam sacar que isso acontece a todo instante e não condenar jogadores ou dirigentes porque têm um problema mal resolvido com a presidente, de promessas não cumpridas, de dinheiro dado e depois retomado, de carnavais sendo apoiado e outros não mais. Tudo isso não diz respeito ao que o time está fazendo dentro de campo. Não se ganha sempre. Aliás, a maioria só perde. E o Palmeiras mudou essa escrita nos últimos anos. Pedir reforço é diferente de pichar muro ou ‘apavorar’ dirigentes. O problema da Mancha é com a Leila. A torcida injeta muito dinheiro por meios das bilheterias e dos programas de sócio-torcedor. Isso é fato. Esse dinheiro é do mesmo tamanho ou maior do que entra do patrocinador.
Leila também não pode ser arrogante a ponto de achar que ela é responsável por tudo. Não é. Nem ela nem o seu dinheiro como patrocinadora. Isso é uma constatação. Não fossem suas empresas, o Palmeiras batalharia outros acordos, como sempre teve em sua história, como a Parmalat e tantas outras marcas respeitadas ao longo dos mais de um século de existência, ganhando ou perdendo. Seu apoio fez e faz muito, mas para por aí. Então, é preciso que Leila entenda que o Palmeiras não surgiu com a sua administração nem vai desaparecer quando ela pegar sua bolsa e ir embora. Assim como o Palmeiras não vai morrer sem a Mancha. Juntos, o Palmeiras é mais forte. Não há vencedor nessas bravatas entre as partes, assim como nunca há vencedor numa guerra. É ingenuidade achar o contrário. como pensa Leila e como pensa a Mancha.
Por causa de Leila e da Mancha, jogadores vão embora e até mesmo o técnico Abel Ferreira pode não ficar até o fim do seu contrato em dezembro de 2024. Ele já dá sinais de desgaste. Está em um fogo cruzado entre seu comando, Leila, e a torcida do Palmeiras, a quem chamou de a mais bonita. Ele também, a propósito, não é dono de nada e nunca trabalhou sozinho, portanto, as conquistas não pertencem somente a ele. E se for embora, o Palmeiras vai encontrar outro, como sempre encontrou e foi vencedor também.
O Palmeiras se apequena em todos os seus segmentos quando coloca para dentro de sua casa discussões infantis, picuinhas entre as partes, duas lideranças que preferem a guerra do que a diplomacia, incapazes de resolver e administrar problemas sem puxar a arma um para o outro. Não há certos nessa história e há muitos errados. É impossível conviver dessa maneira e deixar o futebol do time, o que mais interessa, forte e competitivo. Daqui a pouco vai ter jogador que não vai mais querer jogar no Palmeiras para o bem de sua segurança e saúde mental. Onde estão os conselheiros e o conselho deliberativo do clube? Ninguém tem voz ativa nesse imbróglio?
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.