Campeão olímpico em Atenas-2004, Giba acompanhou de perto as seleções brasileiras de vôlei na Olimpíada de Paris-2024. Uma cena que viralizou foi quando o ex-jogador colocou sua medalha de ouro no pescoço de Gabi Guimarães, capitã do time feminino. Para alguns, o ato “deu azar” à equipe, que perdeu na semifinal para os Estados Unidos e ficou com o bronze após vencer a Turquia.
Ao Estadão, Giba desdenha de superstições, mas justifica o bigode usado em partidas decisivas. O ex-ponta repetiu que a sua geração deixou o brasileiro mal-acostumado com o pódio e reitera que foi a equipe da qual fez parte a responsável por mudar o voleibol. Ele também estava nas campanhas de prata, em Pequim-2008 e Londres-2012.
Veja também
O Brasil voltou a ser ouro no Rio-2016, antes de chegar a dois ciclos sem pódio no masculino. Para Giba, é difícil avaliar de fora, mas ele crê que a equipe feminina, desde a base, tem um futuro mais promissor. O campeão olímpico é elogioso com a manutenção de Zé Roberto e Bernardinho e espera que o Mundial de 2025, nas Filipinas, já sirva para começar mensurar como o Brasil pode chegar em Los Angeles-2028.
Quando as seleções chegarem aos Estados Unidos, a tendência é que Giba também esteja lá, a serviço da Federação Internacional de Voleibol (FIVB), como foi em Paris-2024. Um futuro na beira da quadra ou na gestão de uma equipe, porém, está fora do caminho para o ex-atleta.
A reportagem do Estadão Esportes conversou com o campeão olímpico durante o Charity Day, evento organizado pela corretora BGC Liquidez para destinar parte da receita de corretagem do dia 11 de setembro para as instituições sociais Meu Lar de Volta (RS), Casa Santa Teresinha (SP) e Instituto Oswaldo Ribeiro de Mendonça (SP).
É comum, no período pós-Olimpíada, um “esquecimento” até mesmo de modalidades que estouraram. Com o vôlei se mantém forte?
O vôlei tem um patrocinador que é o Banco do Brasil. Deu todo suporte necessário para que a gente desenvolva o voleibol, chegando no nível que chegou, no masculino e no feminino. Nós não temos muito que reclamar porque a gente sempre tem um centro de treinamento só nosso, tem um apoio de um patrocinador que é uma maior banco estatal do Brasil. Mas eu sei a dificuldade, convivendo com muitos atletas. Eu sempre falo: as empresas precisavam procurar os atletas dia 12 de agosto de 2024 pensando em Los Angeles-2028 e não deixar para patrocinar somente no ano. Você não faz um atleta olímpico campeão em um ano. Quanto mais tempo de apoio, mais ele vai poder desenvolver o potencial.
Eles aprenderam com a gente, né? Toda mudança do voleibol que aconteceu hoje foi com a gente, com o nosso time jogando rápido para caramba.
Giba, em resposta sobre ter humildade em aprender com equipes de fora do Brasil
O que faltou para as seleções masculinas que ficaram sem medalha em Tóquio-2020 e Paris-2024?
Eu costumo falar o seguinte. Se eu não estou dentro do processo, eu não tenho como opinar, porque eu não sei a dificuldade que eles passaram, não sei quanto eles viajaram. Eu não sei se teve alguma briga interna ou não, se teve alguma alegria demais ou não.
Posso falar o que faltou para nós, em 2008, em 2012, porque eu estava dentro do processo. Em 2012, foi que a minha geração parou. Em 2013, o Brasil fez a final da Liga Mundial. Em 2016, foi campeão olímpico. Em 2014, foi vice-campeão mundial. O Brasil fez todas as finais. E quem tava do outro lado? Os Estados Unidos, Rússia, Polônia. O outro lado estava sempre mudando, e o Brasil continuava lá. Eu falo isso, e tem gente que leva pelo lado bom, tem gente que leva pelo lado ruim. A culpa não é deles (seleção atual). A culpa é nossa. A gente acostumou vocês mal.
Após a eliminação, Bernardinho falou sobre ter humildade de aprender com os outros lá fora, porque o vôlei já é outro. O que você acha disso?
Eu não tenho como opinar, porque eu não estou lá dentro do processo, entendeu? De novo, se você perguntar: ‘O que aconteceu em 2008, quando vocês ganharam a medalha de prata?’. “Ganharam”, não perdemos o ouro. “E 2012, que ganharam a prata e perderam para a Rússia”. Eu sei o que aconteceu. Agora eu não sei. Eu não estou lá no dia a dia deles.
Quando ele tá falando de humildade... Eu vou tipo bem sincero, eu não tinha nem visto essa entrevista dele. Eu não sei o que eles treinaram, o que eles deixaram de treinar.
E no sentido de aprender com equipes de fora?
Como eles aprenderam com a gente, né? Toda mudança do voleibol que aconteceu hoje foi com a gente, com o nosso time jogando rápido para caramba. E todo mundo joga igual hoje. Só não sabia que iam tomar uma porrada para o resto da vida.
Faltou algo nos ciclos que você participou, foi medalhista, mas não chegou ao ouro?
Eu acredito que não. Eu trabalho hoje na Federação Internacional, como embaixador da fundação dos projetos sociais. Eu estava fazendo um estudo lá na Suíça e, desde 1896, foram distribuídas em torno de 16.000 medalhas, para 140 países. Então, só da gente ter três é coisa para caramba. O outro número que eu vi também: são hoje são 8 bilhões de pessoas praticamente do mundo, 254 mil pessoas que participam de uma olimpíada. É 0,03% da população mundial, então só chegar na Olimpíada, você já era um campeão. Eu acredito muito nisso e a gente conseguiu chegar em três finais.
Você não pode tirar o mérito do adversário. Os Estados Unidos jogaram muito bem em 2008. O time da Rússia, em 2012, fez uma mudança ali que nós não estudamos e não conseguimos marcar o central, que foi para o oposto. Isso realmente complicou um pouco a nossa vida ali naquele 2 a 0 para a gente. Mas, assim, mérito deles. Muitas vezes a bola bateu na trave e entrou para o nosso lado, e a gente fez o máximo, a gente empenhou o máximo, mas o outro time tava melhor naquela ocasião.
Já a seleção feminina conseguiu uma medalha em Paris. Como você avalia o resultado?
O ciclo foi maravilhoso, né? O Zé foi meu primeiro técnico da seleção em 1995. Ele vai naquela calma dele ali trabalhando sempre, mas que sempre teve o respeito muito grande da equipe. O ciclo olímpico foi maravilhoso, e acredito que a sucessão do feminino está mais propícia do que o masculino. As categorias de base do Brasil hoje, infelizmente já tem alguns anos, não sobem no pódio. Recentemente, perdeu o sub-17 para o Egito por 3 a 1, ficou em oitavo lugar no campeonato. Isso preocupa, porque vai refletir na Olimpíada daqui a quatro, oito, 12 anos. Isso é o que realmente preocupa, enquanto o feminino realmente está numa ascendente, nas categorias de base, que reflete na categoria adulta.
O que dá para responder para quem diz que você zicou ao dar a medalha para a Gabi?
Eles têm que parar de achar que usar uma cueca vermelha vai funcionar, ou que se a medalha foi dada, vai dar... O que vale é o trabalho, empenho e a dedicação que a gente teve durante o tempo inteiro para poder fazer isso. E isso é a minha opinião. Eu não acredito nisso (superstição). Tem gente que acredita. Eu não acredito.
Nem em bigode?
O bigode virou um pedido dos atletas. Eu fiz ele em 2004, uma homenagem para o meu pai, que usava aquele bigode. O apelido dele era mexicano. Fiz uma homenagem para o meu pai e fui o melhor jogador da Olimpíada. Enfim, a gente ganhou. E aí chegou no outro campeonato, os caras falam: ‘Agora você vai deixar o bigode’. Virou uma superstição para o time e o para o adversário. Eu passei a ver também. ‘Puxa, o Giba está aquele bigode hoje ferrou’. Então virou uma arma psicológica, tanto para o meu time quanto para o adversário. Então eu falei: ‘É só eu fazer o bigode. Beleza eu vou jogar mesmo, estou treinando’. Virou um ícone mesmo para gente.
Você tem receio em dizer que foi o maior jogador de vôlei da história?
O maior, não acredito. Eu acredito que tenha sido um deles. “O maior” muita engloba muita coisa. Você está falando de Japão na década de 1960, Rússia na década de 1970; em 1980, Estados Unidos. Tiveram grandes jogadores. Eu faço parte de um grupo seleto, sim, mas eu não me coloco como maior.
O que você acha da manutenção de Zé Roberto de Bernardinho nas seleções?
Você tem o respeito do time, da Confederação Brasileira de Vôlei. São dois ótimos técnicos. Agora vamos esperar para ver. A gente sabe que tem mundial a cada dois anos. Isso daí vai dar uma visão muito maior de como o Brasil vai estar. O ano que vem já tem o primeiro campeonato mundial. A gente tem como ter uma noção muito maior de como o Brasil vai chegar lá na Olimpíada.
O torcedor pode esperar o Giba na beira da quadra ou na gestão de uma equipe?
Tenho bem traçado, faz parte de um planejamento. A partir do ano que vem, vamos ter um novo presidente da FIVB, o Fabio Azevedo, que hoje é o diretor-geral da federação. Nosso atual presidente, Ary Graça, está deixando depois de 12 anos.
Eu já tive alguns cargos lá. Fui presidente da comissão dos atletas, depois fui diretor-executivo da África, para o desenvolvimento do voleibol no continente. E hoje trabalho como embaixador da fundação de projetos sociais. Isso é uma coisa que realmente me encanta. Tivemos na Índia, Tailândia, vamos para Quênia e Filipinas. Estar perto dessas crianças e poder passar a nossa experiência e nosso amor pelo esporte é algo que me encanta.
Perto da quadra, não vão ver o Giba tão cedo, a não ser para bater palma.
Você pensa em um futuro na área da política?
Não. Hoje eu estou empenhado. Tenho contrato com um grupo do Paraná, dono de resorts. Estou lá com a parte de clínica de voleibol. Estou bem organizado, fazendo palestras corporativas, que têm tudo a ver.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.