Consumo de água com flúor e uso de pasta de dente faz bem para saúde, ao contrário do que diz post

Especialistas apontam que o uso do flúor nos níveis recomendados pelo Ministério da Saúde e OMS é seguro e importante para a prevenção de cáries

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Foto do author Giovana Frioli
Atualização:

O que estão compartilhando: postagem compartilha notícia sobre suspensão da adição do flúor na água do abastecimento público em cidades dos Estados Unidos por conta de uma decisão judicial, que teria mostrado o risco da fluoretação no QI das pessoas. A legenda do conteúdo indica que o flúor “representa riscos para os mais vulneráveis” e causa danos cerebrais, e que o uso da pasta de dente é ainda “pior”.

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O Estadão Verifica checou e concluiu que: é enganoso. De fato, houve determinação de um juiz dos Estados Unidos para o fortalecimento das recomendações sobre o uso do flúor na água do abastecimento público do país. Porém, essa decisão se baseou em um estudo que analisou o efeito para crianças de concentrações muito altas de flúor; na concentração em que a substância costuma ser adicionada à água não há risco, de acordo com especialistas consultados pelo Verifica.

A fluoretação de água é uma medida indicada para a prevenção de cárie dentária pela Organização Mundial da Saúde e pelo Ministério da Saúde do Brasil. Dentistas do Conselho Federal de Odontologia (CFO) explicaram à reportagem que não há evidências para concluir que o flúor cause danos cerebrais, considerando os níveis recomendados para uso na água. Segundo os especialistas, a fluoretação e o uso da pasta de dente são seguros e trazem benefícios para a população.

A reportagem entrou em contato com o responsável pela publicação, mas não recebeu retorno até a publicação.

Não é verdadeiro que consumo de água com flúor ou uso de pasta de dente seja prejudicial para saúde Foto: Reprodução/Redes Sociais

Saiba mais: Um postagem compartilha uma notícia sobre a interrupção do uso do flúor no abastecimento de água em cidades dos Estados Unidos após a decisão de um juiz que apontou “risco” para o QI de crianças. Como publicou o UOL, o magistrado pediu a revisão das regulamentações sobre a fluoretação de água no país; porém, as evidências científicas disponíveis até agora ainda não permitem concluir que há consequências para o cérebro pelo uso de flúor em níveis recomendados pelas autoridades de saúde.

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Apesar de algumas comunidades norte-americanas terem decidido pela suspensão, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, autoridade de saúde do país, segue recomendando a fluoretação de água para a prevenção da cárie dentária. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também indica a medida para a saúde bucal da população.

Por que o flúor é aplicado na água?

A adição do flúor (ou fluoreto, forma em que o elemento é usado) na água do consumo é uma medida de saúde usada para a prevenção da cárie dentária, que provoca a deterioração dos dentes. O flúor é adicionado à água no Brasil desde 1953. A primeira cidade a fazê-lo foi Baixo Guandu, no Espírito Santo. Na época, o município convivia com um elevado índice de cárie na população e, após 14 anos do uso do flúor, reduziu em 65% a doença em crianças. No ano de 1975, a OMS lançou um programa para a promoção da fluoretação de água, que foi aprovado por 148 países-membros.

“A fluoretação está incluída entre as dez melhores medidas de saúde pública do mundo, segundo a agência de saúde dos Estados Unidos. Isso acontece por conta da sua efetividade na prevenção de cárie e sua segurança”, disse a diretora da Faculdade de Odontologia de Bauru/USP, Marilia Buzalaf. De acordo com a pesquisadora no tema, o único efeito colateral observado no uso do flúor da água é uma condição chamada de fluorose. “Foi observado que o excesso do fluoreto pode originar casos de manchas brancas no dentes. Porém, elas não são um problema de saúde pública”, explicou.

A fluoretação da água é obrigatória no Brasil desde 1974, de acordo com a Lei nº 6.050/74. Conforme estabelecido pelo Ministério da Saúde, o valor máximo permitido (VMP) de fluoreto na água para consumo humano é de 1,5 miligramas por litro (mg/L). A concentração também é recomendado pela OMS e pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). No Estado de São Paulo, a Sabesp informa que o teor ideal de flúor é de 0,7 mg/l, podendo variar entre 0,6 a 0,8 mg/l.

“Na concentração recomendada pela OMS e pelo Ministério da Saúde, a chance de o flúor, utilizado na água de abastecimento público, provocar prejuízo ao organismo é ínfima. Mesmo entre crianças e gestantes”, afirmou o doutor e membro do CFO Evaristo Volpato.

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“Qualquer substância em uma dose muito alta pode ser prejudicial, mas temos um controle do flúor que é colocado na água. Os estudos mostram que o uso é seguro nesses níveis”, concordou a professora Marília.

Risco do flúor existe em concentrações acima do permitido

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Como foi noticiado pela imprensa dos Estados Unidos, algumas comunidades decidiram remover a fluoretação de água, como na cidade de Weston, Geórgia, e Portland, Oregon. Porém, a medida foi tomada em alguns locais por conta da concentração do elemento acima dos limites permitidos para a população. No Texas, foi relatado, por exemplo, que o Aquífero Ogalla tinha dosagem de 5 mg/L de flúor. O órgão de saúde norte-americano recomenda 0,7 mg/L para a prevenção de cáries no país.

Em agosto deste ano, o Programa Nacional de Toxicologia dos EUA (NTP) publicou um relatório analisando mais de 500 experimentos avaliando possíveis efeitos negativos do flúor para a população. O estudo concluiu que há “confiança moderada” da correlação entre a exposição à níveis elevados do elemento – mais de 1,5 mg/L – com um QI mais baixo em crianças. O documento resume uma revisão de estudos conduzidos no Canadá, China, Índia, Irã, Paquistão e México.

Especialistas apontam que a adição do flúor na água não causa riscos à saúde Foto: REUTERS / Eduardo Munoz / Arquivos

No relatório, o NTP enfatiza que a avaliação foi feita em concentrações maiores ao recomendado. Além disso, não foram encontradas evidências de que a exposição ao flúor teve efeitos adversos na cognição adulta. Também foi apontado que são necessárias mais pesquisas para concluir se há riscos à saúde quando a concentração do elemento na água é menor. “A publicação do NTP, que avalia experimentos em animais e humanos, não trazem clareza da relação do flúor com efeitos cognitivos ou de neurodesenvolvimento”, disse a pesquisadora Marília.

O estudo analisado pelo NTP considerou o QI das crianças para a avaliação, porém são necessários exames cerebrais e neurológicos complexos para uma análise mais fiel. As pontuações do quociente de inteligência não consideram, por exemplo, fatores socioeconômicos, que podem impactar no desenvolvimento do cérebro. Dos 72 estudos relacionados ao QI, apenas 19 foram sinalizados pelo NTP como tendo baixo risco de viés. Não houve conclusões robustas sobre como o flúor pode afetar o aprendizado, memória ou inteligência.

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“As alegações de que o flúor causaria prejuízos ao cérebro ou QI de crianças não são embasadas em evidências científicas. Os estudos que avaliam isso são relacionados à concentrações muito diferentes do que é utilizado na prevenção da cárie. Há segurança nos níveis recomendados”, afirmou o especialista Evaristo.

“A dose que é adicionada à água é totalmente consagrada pela comunidade científica”, complementou a pesquisadora da USP.

Uso da pasta de dente é seguro

A postagem analisada afirma ainda que o uso da pasta de dente é “pior” e traz prejuízos, porém isso é falso. O elemento é um ingrediente importante nas pastas porque age na prevenção da cárie dentária e na reconstituição de cáries existentes, segundo os dentistas. “De maneira alguma o uso do creme dental é negativo para as pessoas”, evidenciou a professora Marília. A indicação do CFO e da Anvisa é que a concentração de flúor seja entre 1.000 a 1.500 partes por milhão (ppm) para sua eficácia.

Segundo o doutor Evaristo, é importante que as pessoas compreendam que as diferentes pastas disponíveis no mercado variam de acordo com a indicação. “Há aquelas cujos objetivos principais é a prevenção da cárie, mas há outras que combatem, por exemplo, a sensibilidade”. Para escolher a melhor opção, é necessário saber qual se adequa a situação de cada paciente. O dentista também afirma que o uso flúor é seguro e recomendado pelas autoridades de saúde.

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O Estadão Verifica tentou contato com o dentista Ivo Alves Jr., responsável pela publicação analisada, mas não obteve retorno até a publicação da checagem.

Como lidar com posts do tipo: É comum que estudos científicos sejam retirados de contexto para desinformar sobre temas relacionados à saúde. Antes de acreditar em publicações na internet, procure por reportagens na imprensa profissional ou pelas pesquisas originais para saber se as informações são verdadeiras. Também é importante consultar as recomendações dos órgãos de saúde e de especialistas habilitados para verificar se as alegações são confiáveis.

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