O que estão compartilhando: vídeo em que o pastor Lamartine Posella parece falar sobre como ele teria recuperado a visão usando um medicamento natural chamado Oculiv depois de ter sido diagnosticado com catarata. No início da gravação, a apresentadora Ana Maria Braga parece falar que estaria utilizando o mesmo produto e afirma que teria ajudado a enxergar novamente letras da Bíblia e receitas.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Duas ferramentas de detecção de uso de inteligência artificial apontaram que a voz das duas personalidades foi clonada usando a tecnologia. A peça verificada utiliza trechos de participações da apresentadora da TV Globo e do pastor em podcasts para divulgar um produto que não está registrado ou notificado na base de dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A imagem de Ana Maria foi extraída da participação no podcast Podpah, em junho deste ano, enquanto a de Posella foi retirada de um episódio do podcast Inteligência Ltda, em novembro de 2022. Nos dois vídeos, não há qualquer menção a tratamentos para doenças oculares.
Saiba mais: publicado no Facebook no dia 11 de dezembro, o vídeo consiste em um conteúdo patrocinado para vender um produto que promete tratar diferentes problemas oculares. Até a publicação desta verificação, a página responsável pelo post possuía 16 anúncios ativos, todos relacionados à venda de produtos que alegam curar catarata, glaucoma e outras condições oculares. Essas informações estão disponíveis na Biblioteca de Anúncios da Meta.
Além das imagens de Ana Maria Braga e do pastor Lamartine Posella, outros conteúdos utilizam a imagem do jornalista Cid Moreira, que morreu em 3 de outubro, e da jornalista e apresentadora Fátima Bernardes.
O Verifica submeteu o conteúdo a duas ferramentas: a TrueMedia, que detecta deepfakes em mídias sociais, e o Hive AI Detector, que identifica o uso de inteligência artificial em imagem, áudio e vídeo. A TrueMedia identificou indícios de manipulação tanto no áudio quanto na imagem. Já o Hive AI concluiu que há 98% de probabilidade de o áudio ter sido gerado por inteligência artificial.
Em buscas por informações sobre o tratamento divulgado, a reportagem encontrou o texto do suposto relato do pastor Lamartine publicado em um site chamado Scribd, plataforma que afirma ser uma biblioteca de documentos digitais. No script, que segue o mesmo estilo de testemunho falsamente atribuído ao pastor, há a menção de outro medicamento, que também promete tratar catarata e glaucoma.
Ao Verifica, o médico oftalmologista Oswaldo Moura Brasil, que é presidente da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), pontuou que todo medicamento deve ter seu uso respaldado por estudos científicos, com evidências robustas que comprovem a eficácia e segurança.
De acordo com Oswaldo, medicações que não passam por ensaios clínicos randomizados — ou seja, pesquisas que testam a eficácia de uma terapia ao administrá-la em pelo menos dois grupos diferentes, nos quais os participantes são selecionados aleatoriamente para receber o tratamento ou um placebo — devem ser vistas com desconfiança. A mesma cautela se aplica a tratamentos que prometem resultados milagrosos e afirmam tratar doenças que possuem causas diferentes.
“A catarata é a opacidade progressiva do cristalino, nossa lente natural que fica dentro do olho”, explicou o presidente da SBO. Segundo ele, esse é um processo esperado em decorrência do envelhecimento. “O tratamento da catarata é cirúrgico, a lente opaca é removida e no seu lugar é implantada uma lente artificial”, disse Oswaldo.
Em relação ao glaucoma, o oftalmologista explicou que a doença atinge o nervo óptico e, na maioria das vezes, está associada ao aumento da pressão ocular. “[O glaucoma] é caracterizado pela perda progressiva do campo visual e pode levar à cegueira se não for diagnosticado e tratado adequadamente”, disse. O tratamento, segundo o médico, pode ser feito com medicamentos que baixam a pressão ocular, laser e cirurgia.
Como lidar com postagens do tipo: vídeos que utilizam inteligência artificial para manipular a voz de figuras públicas e criar a falsa impressão de que elas estariam recomendando um produto circulam com frequência nas redes sociais. Desconfie de conteúdos que promovem um tratamento que afirma curar diferentes doenças de uma vez. Pesquise sobre o que está sendo anunciado em fontes confiáveis e busque orientação médica antes de adquirir medicamentos divulgados na internet.
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