População não deve fazer estoque de arroz por causa de chuvas no RS, dizem representantes do setor

Associações, empresas e economistas descartam risco iminente de desabastecimento com a crise climática no Sul; estocar alimento pode contribuir para alta do preço

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Foto do author Gabriel Belic
Por Gabriel Belic e Bernardo Costa
Atualização:

Postagens alarmistas nas redes sociais pedem que a população faça estoque de arroz em decorrência das enchentes que assolam o Rio Grande do Sul. O Estado é o maior produtor do grão do Brasil, responsável por 70% da safra nacional. Apesar disso, representantes dos setores de produção e venda do alimento ouvidos pelo Estadão descartam a possibilidade de desabastecimento e afirmam que não é preciso fazer estoque.

O Estadão Verifica explica os impactos das chuvas na produção do arroz, além de analisar uma possível falta do produto e se há necessidade de estocagem. Leia abaixo.

Vista aérea do bairro Mathias Velho, em Canoas, Rio Grande do Sul  Foto: Diego Vara/REUTERS

Não há desabastecimento, dizem produtores

O presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Alexandre Velho, afirmou que, até o momento, foi feita a colheita de 83% da safra. Apesar do atraso na colheita em determinados locais, principalmente aqueles que foram mais atingidos pelas chuvas, Alexandre destacou que a área colhida apresentou boas médias de produtividade. Segundo ele, não há risco de desabastecimento no País.

“Embora a gente tenha este grande problema com relação à colheita que falta, nós temos plenas condições de afirmar que não temos problemas com relação ao abastecimento do mercado interno”, afirmou Alexandre. “Temos, sim, um problema de logística momentaneamente, principalmente a ligação com o interior do Rio Grande do Sul, mas a ligação com os grandes centros, através da BR-101, está normal. Temos bastante arroz para deslocar para as regiões centrais do Brasil. Então, não existe qualquer problema com relação ao abastecimento ou uma necessidade urgente de importação”.

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Segundo Antônio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), o risco de desabastecimento de arroz nos supermercados do País é “zero”: “Não há nenhum risco de isso acontecer. Há arroz mais do que suficiente nos supermercados e centros logísticos. O risco é zero”.

O economista também descartou a possibilidade de desabastecimento de outros itens com forte produção no Rio Grande do Sul, como soja, leite, frutas, óleo e trigo. “Não há risco. O Brasil é o maior exportador líquido de alimentos do mundo e produz em várias regiões. O consumidor brasileiro sempre teve e sempre terá preferência”.

Procurada pelo Verifica, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) informou que está monitorando a logística e o abastecimentos dos produtos essenciais à população. Até o momento, segundo o órgão, “os estoques e as operações de abastecimento do varejo estão normalizados com diversas marcas, preços e promoções para atender à demanda de consumo tanto nas lojas físicas quanto pelo e-commerce”.

Na mesma linha, a Combrasil, empresa que fornece arroz, feijão e grãos a vários Estados, disse que apurou junto a fornecedores e parceiros no Rio Grande do Sul que mais de 70 a 80% da safra do produto já foi colhida na região. Mesmo nas áreas afetadas, a produção não foi totalmente comprometida. A empresa tem centros de distribuição no Rio de Janeiro e em Brasília.

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A empresa destaca que a situação não é de desabastecimento iminente, já que tem reserva para seis meses de fornecimento. “Além disso, existem outras regiões produtoras no País, como Santa Catarina e Tocantins, que podem contribuir para suprir a demanda”, acrescenta a nota.

Ao Verifica, o representante da Associação de Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Rio Indústria), Sergio Duarte, também afirmou que, no momento, não há desabastecimento devido ao estoque das empresas e dos esforços em buscar fornecedores em outras regiões. Além do arroz, Duarte cita outros itens do setor de alimentos com forte produção no Rio Grande do Sul, como leite, trigo, milho e soja.

“Ainda não está tendo desabastecimento. Mas eu acredito que, se essa crise perdurar, podemos, sim, ter dificuldades. Não vou dizer desabastecimento, mas vamos ter dificuldades”, destaca Duarte.

Qual o impacto das chuvas na safra

Um relatório da safra 2023/24 de arroz irrigado do Rio Grande do Sul, divulgado pelo Instituto Rio Grandense de Arroz (Irga) em 8 de maio, detalha que foram semeados 900.203 hectares do grão. Até o momento, 758.066 hectares foram colhidos, com uma produção total de 6.440.528 toneladas.

Conforme a nota, restam 142.137 hectares para serem colhidos – destes, 22.952 hectares estão totalmente perdidos, 17.903 hectares estão parcialmente submersos pelas águas e 101.309 hectares não foram atingidos pelas cheias. Considerando a produtividade da áreas não atingidas e o que já foi colhido, o Irga estima uma produção total de 7.149.691 toneladas de arroz na safra atual. A safra anterior (2022/2023) registrou produção de 7.239.000 toneladas. Veja a nota abaixo.

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Corrida aos mercados para fazer estoque é prejudicial

Os representantes consultados foram unânimes em desaconselhar que a população estoque alimentos. Segundo a Abras, é importante que as pessoas não façam estoque de arroz em casa para garantir que todos tenham acesso contínuo ao produto.

Segundo Antônio da Luz, a medida pode provocar aumento de preços em curto prazo. “A princípio, não há previsão de aumento de preço do arroz. Mas se as pessoas saírem comprando em um efeito manada, eventualmente podem ter aumentos de curto prazo, até que as pessoas percebam que não faltará e parem de demandar além do que estão acostumadas”, diz o economista-chefe da Farsul.

O mesmo defende Sergio Duarte. De acordo com ele, se os consumidores passarem a comprar mais do que precisam para estocar, pode haver dificuldade de oferta. “Aí sim podemos ter problemas de abastecimento. Não há necessidade de o consumidor fazer esse movimento”, diz.

Pode haver aumento de preço do arroz

Na avaliação de Sergio Duarte, haverá impacto no preço dos alimentos, especialmente do arroz, para o consumidor final. “Dependendo do produto, as margens são muito baixas. O arroz não tem jeito, vai ter impacto no consumidor final, porque é uma matéria prima única. Quando você tira um player importante como o gaúcho, vai haver impacto, não tenha dúvida. O leite, dependendo de como os outros Estados vão conseguir absorver essa dificuldade de fornecimento do Sul, pode ter impacto. O trigo também pode ter impacto. Então, dependendo do produto, pode haver impacto maior ou menor”, avalia.

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Economistas consultados pelo Estadão/Broadcast calculam que a tragédia climática na região Sul do Brasil deve pressionar o preço das principais culturas do Estado e elevar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2024 em pelo menos 0,10 ponto porcentual.

Analistas observam que soja, leite, frutas e, principalmente, arroz devem ser os mais afetados. As fortes chuvas causaram perda de parte da safra e impactaram a logística do Estado, fato que deve dificultar o escoamento da produção e impactar nos preços.

Governo federal analisa importação de arroz

Nesta terça-feira, 7, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que o governo federal poderá importar até um milhão de toneladas de arroz. O ministro explicou que a medida é uma forma de evitar um possível aumento no preço do grão.

“Uma das medidas já está sendo preparada, uma medida provisória autorizando a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a fazer compras, na ordem de 1 milhão de toneladas, mas não é concorrer. A Conab não vai importar arroz e vender aos atacadistas, que são compradores dos produtos do agricultor. O primeiro momento é evitar desabastecimento, evitar especulação”, afirmou.

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Inicialmente, de acordo com Fávaro, a Conab deve comprar 200 mil toneladas de arroz. Essa importação deve ocorrer de países do Mercosul, como Argentina, Uruguai e Paraguai e Bolívia. O restante, até completar um milhão de toneladas, será importado somente de acordo com a necessidade do mercado.

O governo ressalta que a Conab deve revender o que for importado diretamente para pequenos mercados, nas periferias das cidades, especialmente no Norte e Nordeste. O objetivo da estratégia é não afetar a produção brasileira, já que os principais clientes dos produtores do País são os atacadistas.

Em nota à reportagem, a Conab afirmou que “ainda é precipitado” fazer qualquer previsão da influência das fortes chuvas em relação ao abastecimento. “Com o intuito de regularmos o mercado e evitarmos aumentos substanciais nos preços do grão, o governo federal está analisando a possibilidade de importação de arroz do Mercosul”, afirmou.

Especialistas divergem sobre a medida. O economista Antônio da Luz afirma que a necessidade de importação levantada pelo governo é apenas política. “A chance de o governo atrapalhar e aumentar o preço ao invés de reduzir com suas ações é grande”, defende.

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Já Sergio Duarte avalia que a medida do governo é acertada: “Acho que é uma maneira inteligente de sanar um problema de demanda diante de uma eventual falta de oferta. Embora o processo de importação não seja tão ágil, acredito que seja um caminho correto, assim como a libertação de verbas para recuperar o Rio Grande Sul, para que as estradas voltem a ser viáveis, e a retirada do Estado do Regime de Recuperação Fiscal por um tempo, para dar ao governo estadual oxigênio e capacidade de investir”.

Se receber algum conteúdo suspeito sobre a situação no Rio Grande do Sul, envie para o WhatsApp do Estadão Verifica pelo número (11) 97683-7490.

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