Em vídeo, Arthur Lira falava de problema técnico na Câmara, não de urnas eletrônicas

Post no Facebook tira de contexto imagens de julho de 2022 e engana ao comparar inconsistência em painel de votação dos deputados com as eleições gerais

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Foto do author Luciana Marschall

O que estão compartilhando: vídeo em que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), fala sobre inconsistências técnicas no painel de votação. Sobre as imagens, aparece data de 15 de abril de 2023 e legenda afirmando que o parlamentar está denunciando um atentado na Casa. Em post no Facebook, uma usuária diz que algo semelhante aconteceu nas eleições de 2022, quando o patrão dela tentou votar em Jair Bolsonaro (PL) e o “sistema caiu”.

O Estadão investigou e concluiu que: é enganoso. O vídeo, na verdade, é antigo, de julho de 2022. Na ocasião, uma empresa que presta serviço ao Congresso Nacional alegou ter havido rompimento de uma fibra óptica em Brasília, o que resultou em problema técnico durante sessão legislativa. Meses depois, em outubro e novembro, nos dois turnos das eleições, as urnas eletrônicas registraram votos sem estarem conectadas à internet.

Lira falava sobre inconsistência técnica na votação da 'PEC Kamikaze', não das eleições 2022. Foto: Reprodução

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Saiba mais: A postagem utiliza trecho de vídeo gravado em 13 de julho de 2022, durante Sessão Deliberativa Extraordinária iniciada em 12 de julho, na Câmara dos Deputados. Na ocasião, Lira falava sobre a suspensão dos trabalhos no dia anterior, gerada por um problema técnico no sistema de votação que atrasou a aprovação da polêmica PEC 1/2022, conhecida como PEC Kamikaze, que concedia benefícios sociais às vésperas das eleições.

Uma legenda no vídeo compartilhado afirma que Lira estava denunciando um atentado na Câmara. Durante o discurso, no entanto, o presidente nega ter inferido anteriormente qualquer tipo de responsabilidade sobre o ocorrido a qualquer parlamentar ou partido. Ele afirma se tratar de um fato extraordinário, de grave agressão ao funcionamento do Poder Legislativo, seja casual, acidental ou proposital. Ao explicar que a Câmara possui dois sistemas paralelos, operados por empresas diferentes, sendo um de suporte ao outro, insinua ter sido “muita coincidência dois sistemas autônomos caírem ao mesmo tempo”. Por fim, Lira acrescenta não imputar isso a uma fraude, mas ressalta que a Polícia Federal esteve no local para investigar o caso.

Lira se referiu às eleições presidenciais ou às urnas eletrônicas?

Não. Ao contextualizar a pane ocorrida naquela semana, Lira relembra ter havido também uma inconsistência na votação da PEC do Voto Impresso, rejeitada pela Casa no ano anterior. Na época, em dois momentos da sessão, o deputado Alexandre Padilha (PT-SP) informou à Mesa que votou “não”, mas que o voto não foi registrado no painel eletrônico.

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Esse não foi o único exemplo utilizado por Lira, que citou também o ocorrido em 14 de junho de 2022, quando houve adiamento da votação da PLP 18/2022, que fixou limite para a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre itens considerados essenciais. O caso foi registrado em ata.

Deputado citou inconsistência na votação da PEC do Voto Impresso, em 2021, apenas como exemplo Foto: Adriano Machado/Reuters

Em seguida, o deputado cita a inconsistência ocorrida na votação da PEC Kamikaze. Como noticiou o Estadão, no início dos trabalhos legislativos, em 12 de julho, Arthur Lira anunciou que a sessão seria também virtual – permitindo que os deputados pudessem registrar presença de forma remota. Durante a análise dos destaques após a aprovação da PEC em primeiro turno, Lira interrompeu a sessão pela instabilidade da conexão de internet na Câmara.

No dia seguinte, a sessão foi retomada para ser oficialmente encerrada. Na ocasião, o presidente informou haver duas empresas responsáveis pela conectividade da Casa, a Lúmen e Algar. A primeira confirmou à presidência que houve interrupção do sinal por rompimento de uma fibra óptica em Brasília.

O vídeo com o discurso de Lira está disponível no YouTube e no site da Câmara dos Deputados, onde também há a transcrição da sessão. No texto, o trecho utilizado no Facebook pode ser conferido na página 68 e nas imagens pode ser acompanhado de 17 minutos e 13 segundos a 20 minutos e 41 segundos.

A reportagem procurou a Câmara dos Deputados e a Polícia Federal questionando o resultado da investigação aberta na ocasião, mas não houve retorno.

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Urnas eletrônicas utilizam a internet durante a votação?

A autora da publicação sugere que as urnas utilizadas no pleito que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva não são confiáveis, ao dizer que “o sistema caiu” quando o patrão dela tentou votar em Bolsonaro. Ela ainda defende que “por isso proibiram o cel”, referindo-se ao aparelho celular e sugerindo que a decisão de não permitir o uso do equipamento na cabine de votação é uma forma de os eleitores não conseguirem registrar supostas fraudes.

O problema ocorrido na Câmara dos Deputados, contudo, não pode ser associado às urnas eletrônicas porque, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), elas funcionam de forma isolada, ou seja, não dispõem de qualquer mecanismo que possibilite a conexão a redes de computadores, como a Internet.

Os equipamentos de votação não têm o hardware necessário para se conectar a uma rede ou mesmo a qualquer forma de conexão com ou sem fio. “As urnas eletrônicas não possuem interface de rede física ou sem fio. Não possuem bluetooth ou qualquer outra forma de comunicação. O sistema operacional da urna, os softwares de votação, dados de eleitores e de candidatos são inseridos por meio de pendrive. Os boletins de urna e outros arquivos gerados no dia da votação também são extraídos por meio de pendrive”, explicou o TSE.

Urna eletrônica não tem conexão com a internet. Foto: Reprodução/TSE.

Assim como a Câmara dos Deputados, o TSE possui contratos com a Lumen e com a Algar. Porém, o Tribunal comunicou que os acessos fornecidos pelas empresas nunca são usados na totalização de votos, na votação, nas urnas ou nos sistemas eleitorais. Elas estão envolvidas apenas na transmissão dos votos, assim como a Claro e a Oi, em uma operação feita por enlaces de comunicação privada, sem acesso à internet comum.

“A comunicação dos dados extraídos das urnas é realizada mediante uso de criptografia (ou seja, as operadoras não conseguem “ler” o que está sendo trafegado) e com assinatura digital (caso alguma informação - mesmo criptografada - seja alterada, o TSE identificaria prontamente que teria sido corrompida)”, disse o Tribunal em nota.

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Após os boletins de urna chegarem ao TSE, estes são comparados com os boletins de urna que foram impressos nas seções eleitorais, afixados nos locais de votação e distribuídos aos fiscais de partidos. A alegação de que houve fraude nas eleições que elegeram Luiz Inácio Lula da Silva – amplificada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, derrotado nas urnas – já foi amplamente desmentida.

A alegação da autora do post referente ao uso de celular no momento da votação também não é verdadeira. De fato, no ano passado, o TSE decidiu que os eleitores deveriam deixar o celular com os mesários antes de votar, mas para garantir o sigilo do voto previsto na Constituição Federal, além de evitar eventuais coações aos eleitores.

A reportagem procurou a responsável pela publicação no Facebook, mas não obteve retorno até essa publicação.

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