Atualizada às 16h02 de 19 de março de 2021 para incluir posicionamento da RedeTV!
Defendendo um tratamento ineficaz contra a covid-19, postagens nas redes sociais enganam ao citar uma petição de médicos portugueses a favor do uso da ivermectina. A petição é real, mas os posts enganam ao deixar de dizer que a Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed, entidade que em Portugal é equivalente à Anvisa) negou a autorização do medicamento, devido a "limitações metodológicas nos ensaios em que a ivermectina foi utilizada".
As postagens enganosas usam uma foto do diretor da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom, dando a entender que a entidade concorda com a adoção do medicamento contra covid-19. Na realidade, a OMS e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) não recomendam a ivermectina para propósitos diferentes dos descritos na bula -- o remédio foi desenvolvido para tratar infecções de parasitas. De acordo com os organismos internacionais, a revisão das evidências disponíveis até agora "identificou incerteza nos benefícios e danos potenciais" do medicamento no combate ao novo coronavírus.
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Os posts compartilham uma chamada do programa RedeTV! News, veiculada em 11 de março de 2021, que dizia: "Médicos europeus pedem uso urgente da ivermectina". A reportagem não cita que, no mesmo dia, a Comissão de Avaliação de Medicamentos da Infarmed já havia se posicionado contra o uso de ivermectina contra a covid-19.
A agência portuguesa disse que "à data, dadas as limitações metodológicas nos ensaios em que a ivermectina foi utilizada, e as dúvidas quanto à dose adequada e sua segurança no âmbito da infeção causada pelo SARS-CoV-2, não existem evidências que apoiem a utilização deste medicamento na profilaxia e tratamento da covid-19". A comissão avaliadora acrescentou que "continuará acompanhando ensaios clínicos e seus resultados". O telejornal RedeTV! News informou sobre a negativa da Infarmed apenas quatro dias depois, em 15 de março.
Muitos estudos tentam provar a eficácia da ivermectina na profilaxia e na cura contra o novo coronavírus, mas não possuem padrão e rigor científicos que confirmem benefício do medicamento. O Estadão Verifica já mostrou que um site que reúne pesquisas sobre a ivermectina faz análise enviesada e com erros técnicos para defender seu uso. A Opas também menciona que há "limitações metodológicas" nos estudos que já averiguaram o uso da ivermectina.
A emissora RedeTV! informou ao Estadão Verifica por meio de nota que a matéria trazia informações sobre o uso da ivermectina, mas que "em dois momentos destacou a ausência de comprovação científica das agências controladoras sobre a eficácia do remédio".
Falou também que "Apesar da correspondente Erika Abreu ter enviado questionamentos à Infarmed, sem obter retorno, no dia em que a reportagem foi ao ar, a agência portuguesa declarou insuficiente a evidência para uso da substância através de sua página na internet". A RedeTV reforçou que esta informação foi atualizada em reportagem do dia 15 de março.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.
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