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Petro não anunciou confisco de poupança na Colômbia; posts distorcem proposta do governo

Medida estabelece que bancos destinem recursos para conceder crédito a setores selecionados pelo governo; contas individuais não sofrerão variação

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O que estão compartilhando: que o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, anunciou que vai assinar um decreto para confiscar todo o dinheiro que a população colombiana tem na poupança.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. As postagens distorcem a proposta do governo colombiano de “investimentos forçados”. Na verdade, o que Petro propõe é que os bancos destinem obrigatoriamente uma parcela de seus depósitos para destinarem crédito a setores que sofrem com falta de financiamento. No país vizinho, esse tipo de investimento não seria novidade, uma vez que já foi implementado na agricultura. A medida, caso aprovada, não iria acarretar no confisco da poupança da população.

Não, governo da Colômbia não irá confiscar poupança da população Foto: Reprodução/Instagram

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Saiba mais: no dia 9 de agosto, durante o Fórum de Reativação Econômica, Petro detalhou uma série de propostas para reativar a economia. Uma das medidas apresentadas, os chamados “investimentos forçados”, impulsionou insegurança e desinformação nas redes sociais, sob justificativa de que o governo da Colômbia iria confiscar o dinheiro da população guardado na poupança. Mas não é bem assim.

De acordo com o jornal El Colombiano, a medida estabelece que o sistema financeiro deve alocar recursos para conceder créditos a setores selecionados pelo governo. A questão que levantou inseguranças nas redes sociais é que o dinheiro que os bancos utilizam para dar estes empréstimos de investimento forçado provém de depósitos dos clientes -- ou seja, da poupança da população.

O jornal independente La Silla Vacía, contudo, afirmou que a medida não acarreta a expropriação do dinheiro dos colombianos. Na realidade, a ideia é que os bancos destinem obrigatoriamente uma parte dos depósitos para levantar recursos, sob a forma de empréstimos e com taxas de juros mais baixas, a setores específicos, como indústria, turismo e habitação.

A proposta funcionaria da seguinte forma: os bancos devem conceder uma porcentagem, ainda a ser definida por lei, dos seus depósitos para adquirir títulos de dívida, empréstimos que os governos contraem para se financiarem, a determinadas entidades públicas. Essas entidades utilizariam o dinheiro para fornecer empréstimos com juros baixos.

Especialistas consultados pelo La Silla Vacía garantem que os investimentos forçados não confiscam o dinheiro da população guardado na poupança. Na realidade, as poupanças dos cidadãos são protegidas pelo Fundo de Garantia das Instituições Financeiras (Fogafín), autoridade financeira ligada ao Ministério da Fazenda e Crédito Público da Colômbia.

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O Fogafín garante, por meio do Seguro de Depósitos, a devolução de até 50 milhões de pesos colombianos por pessoa em caso de liquidação da instituição financeira cadastrada. No Brasil, por exemplo, existe o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que também protege a população em caso de problemas com as instituições financeiras. A garantia no País é de até R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, por conjunto de depósitos e investimentos em cada instituição ou conglomerado financeiro.

Germán Machado, professor de Economia da Universidad de los Andes (Uniandes), defende que o dinheiro das pessoas não estaria em perigo com a proposta do governo colombiano. O especialista explicou que os bancos destinam apenas uma porcentagem pequena para adquirir títulos de dívida. Machado reforçou ao La Silla Vacía que o governo tem sido “historicamente criterioso” no pagamento dos empréstimos.

O meio digital colombiano Economía para la Pipol afirmou que esse tipo de investimento já acontece no país vizinho na área da agricultura, sem afetar a poupança da população. São os Títulos de Desenvolvimento Agrícola, ou TDA. Eles foram implementados na década de 1990 para incentivar o financiamento na agricultura, que sofre com desafios variados.

O RTVC Noticias, serviço público de rádio e televisão da Colômbia, explicou que duas opções estão sendo consideradas para a medida analisada. A primeira seria apresentar o “investimento forçado” como projeto de lei no Congresso da República. Já a segunda opção envolveria um acordo com os bancos para implementar a proposta, sem necessidade do processo legislativo.

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Defensores do projeto enxergam a medida como uma oportunidade para reativar a economia e garantir maior rentabilidade da poupança. Já os críticos dos investimentos forçados alertam que as taxas de juros poderiam aumentar para setores não beneficiados pela proposta.

No Brasil, a proposta colombiana é distorcida para criticar governos de esquerda e alegar que o mesmo será feito no País. “Brasileiros, acordem! A mensagem para o Brasil, está aí”, escreve um usuário. “E só uma questão de tempo está moda chegar aqui no Brasil”, afirma outro.

Na verdade, no Brasil, algo semelhante ocorre com o setor imobiliário. Conforme explicado pelo E-Investidor, os bancos destinam 65% dos depósitos da poupança para o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que é responsável pela maior parte dos recursos utilizados em financiamentos de imóveis no País. Vale lembrar que 15% dos recursos da caderneta de poupança são de uso livre pelas instituições financeiras.

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Boatos envolvendo confiscos recentes da poupança de brasileiros já foram desmentidos. O Estadão Verifica já mostrou que, no Brasil, a prática de confiscar a poupança ou qualquer ativo financeiro foi proibida pela Emenda Constitucional 32, em 2001: “É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria que vise detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro”.

Como lidar com postagens do tipo: é importante ter cautela com propostas legislativas de outras nações, já que o cenário é diferente do contexto brasileiro. A imprensa nacional costuma noticiar e cobrir assuntos internacionais de interesse público. Dessa forma, caso o confisco de poupança fosse aprovado na Colômbia, o fato ganharia repercussão nos jornais. Antes de disseminar um conteúdo duvidoso nas redes sociais, faça uma pesquisa por meio de palavras-chave no seu buscador de preferência (aqui, a reportagem buscou, em português, “Colômbia”, “confisco” e “poupança”; em espanhol, o Estadão Verifica pesquisou por “inversión forzosa” e “ahorro”).

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