O que estão compartilhando: vídeo em que uma mulher acusa um homem de impedir a entrega de doações para pessoas atingidas pelas fortes chuvas em uma cidade do Rio Grande do Sul. Comentários da postagem relacionam o episódio ao governo do Estado, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao PT.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso, pois o local filmado não é um centro de distribuição de doações e não tem relação com o governo. O lugar funciona como um abrigo organizado por voluntários e os itens arrecadados são direcionados para auxiliar na manutenção das famílias acolhidas. O abrigo fica no salão da igreja Santa Rita de Cássia, na cidade de Gravataí (RS) e acolhe 105 pessoas que precisaram deixar suas casas.
Ao Verifica, o coordenador da comunidade, Jeferson Gonçalves, que no vídeo é apontado como responsável por não liberar as doações, explicou que a gravação foi feita por uma voluntária que não concordou com o fato de os alimentos doados serem reservados para as pessoas abrigadas. À reportagem, a prefeitura de Gravataí informou que o abrigo não é oficial, mas um espaço voluntário que abriu por conta própria e começou a arrecadar mantimentos.
Saiba mais: O vídeo verificado aqui mostra uma mulher apontando um homem de preto como o responsável por não liberar doações para pessoas atingidas pelas enchentes no Rio Grande do Sul, enquanto ele diz estar cumprindo ordens. A postagem com a gravação não identifica o local onde ocorreu o episódio. Os comentários na publicação no Instagram sugerem que o homem de preto teria relação com políticos ou com o governo federal. Um usuário especula que as ordens de não distribuir as doações teriam partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A reportagem identificou que as imagens foram gravadas na igreja Santa Rita de Cássia, que fica no bairro Morada do Vale I, na cidade de Gravataí. Segundo Jeferson Gonçalves, as ordens que ele disse estar cumprindo foram definidas pela equipe de coordenação da comunidade Santa Rita, orientadas e aprovadas pelo Frei Armando Mariani, que é responsável pela comunidade.
Em vídeo publicado no Instagram da Paróquia São José, a qual a igreja Santa Rita pertence, o Frei Armando Mariani mostra o salão da comunidade com pessoas abrigadas ao fundo. Na gravação, ele diz que a igreja tem contado com a ajuda de muitos voluntários e esclarece que o local não distribui alimentos. “Queremos ao mesmo tempo esclarecer que esse é um local de acolhida, e não de distribuição de alimentos, como publicaram em blogs que não são de nossa paróquia e que não dizem a verdade”, informou o Frei.
Qual é o contexto do vídeo?
De acordo com Jeferson, o vídeo foi gravado no último domingo, 5, quando o salão da comunidade foi aberto para receber os desabrigados. Ele negou ter impedido a entrega de doações e explicou que as acusações surgiram após uma voluntária discordar da reserva das arrecadações para os abrigados. No mesmo dia, a voluntária teria divulgado em suas redes sociais, de forma autônoma, que a igreja estava aberta para realizar doações externas a pessoas necessitadas, o que levou algumas pessoas até a comunidade em busca de auxílio.
Jeferson disse que a igreja doou mantimentos a algumas pessoas, mas passou a explicar que o local não era um centro de distribuição de doações, por isso, os alimentos eram destinados para as pessoas que seriam recebidas no abrigo. Segundo ele, a voluntária demonstrou não concordar com a organização da igreja e passou a fazer questionamentos sobre a quantidade de pessoas que estavam abrigadas naquele dia.
“Essa voluntária ficou um pouco alterada, dizendo “mas como assim, você só tem 10 pessoas aqui e esse monte de material vai ficar aqui?”', contou Jeferson. O coordenador disse ter explicado que o número de pessoas poderia aumentar. Segundo ele, entre segunda e terça-feira, outras 90 pessoas chegaram ao abrigo.
Diante do desentendimento, a voluntária começou a gravar a situação. “Ela disse nesse vídeo que estávamos nos negando a doar alimentos para as pessoas necessitadas, e eu tentando explicar que não estávamos negando, estávamos guardando o material para que pudéssemos receber as pessoas desabrigadas”, disse Jeferson.
Segundo o coordenador da igreja, o vídeo causou transtornos para a comunidade, que precisou acionar as forças de segurança da Brigada Militar, Polícia Militar e Polícia Civil para se resguardar. “Muitas pessoas vinham até a comunidade indignadas porque não estava sendo doado esses alimentos ou esses materiais”, disse.
O Verifica não conseguiu identificar a mulher que fez a gravação.
O que diz a prefeitura de Gravataí
Em nota enviada ao Verifica, a prefeitura de Gravataí esclareceu que pessoas não afetadas diretamente pelas enchentes, mas em situação de vulnerabilidade, devem buscar o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) mais próximo de sua residência. Segundo a administração, os abrigos voluntários provavelmente estão priorizando aqueles que foram diretamente impactados pelas inundações. “Em Gravataí, por exemplo, somente três bairros foram atingidos, demais localidades não foram afetadas” informou.
Ainda segundo a administração, o município tem priorizado a entrega de alimentos em abrigos. A prefeitura estima que aproximadamente duas mil pessoas estejam em abrigos oficiais e voluntários. “Dessas duas mil pessoas, 1.500 são oriundas de municípios vizinhos bastante afetados como Canoas, Porto Alegre, Eldorado do Sul, Guaíba, Alvorada e outros”.
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