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É falso que Lula tenha criado lei para obrigar crianças a aprenderem sobre ‘ideologia de gênero’

Não há qualquer declaração do presidente ou projeto de lei nesse sentido; autor de vídeo no Kwai disse que se baseou em informações da própria rede social

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Foto do author Clarissa Pacheco
Atualização:

O que estão compartilhando: que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva revelou detalhes de uma nova lei e disse querer que crianças também participem da “ideologia de gênero” assim que aprendam a escrever.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Não há qualquer declaração de Lula sobre uma lei que obrigue crianças a terem contato com “ideologia de gênero” assim que aprendam a escrever. Também não há decretos presidenciais ou Projetos de Lei do Executivo que tratem do assunto. O vídeo não cita qualquer referência sobre a fonte da alegação. A Secretaria de Imprensa da Presidência (Secom) afirmou que o conteúdo é evidentemente falso e repudiou a publicação de conteúdos políticos desinformativos. O autor do vídeo publicado no Kwai disse que usou informações “da própria plataforma” para produzi-lo.

 Foto: Arte/Estadão

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Saiba mais: O homem que aparece no vídeo investigado possui uma conta com 26 mil seguidores no Kwai e foi lá que ele postou, inicialmente, o conteúdo falso sobre crianças e “ideologia de gênero”. O Estadão Verifica não conseguiu localizar o vídeo original, mas encontrou outra publicação, igualmente feita no dia 10 de outubro de 2023, com teor similar.

Nela, o autor do vídeo diz que vai provar que Lula é um “ramal do Hamas” no Brasil, porque teria dito que as crianças aprenderão sobre “ideologia de gênero” e sobre homossexuais nas escolas. No entanto, não há qualquer menção a uma fonte para a suposta declaração. Questionado pelo Estadão Verifica, o autor do vídeo, que se identifica como JC Notícia, disse que retirou informações da própria plataforma e que não era possível ser preciso no momento.

A expressão “ideologia de gênero” é comumente usada para alegar que há uma intenção de influenciar crianças a se “tornarem” homossexuais. Na realidade, a orientação sexual não se trata de uma escolha do indivíduo, nem é defeito ou doença, segundo classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Executivo não apresentou projetos de lei sobre o assunto

Uma busca na lista de Projetos de Lei do Executivo de 2023, ou seja, propostas apresentadas pela Presidência da República ao Congresso Nacional, mostra que não existe nenhum projeto com o teor citado pelo autor do vídeo entre as propostas de 2023. Também não há decretos presidenciais sobre isso.

Em nota, a Secom disse que o vídeo é falso. “O presidente Lula não abordou a temática e o governo federal não enviou, e nem enviará ao Congresso, qualquer proposta com este escopo”, informou.

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Entre os 24 Projetos de Lei do Executivo apresentados este ano, seis foram convertidos em leis: o que garante direito à maternidade às atletas gestantes ou puérperas no âmbito do programa Bolsa Atleta; o que dispõe sobre a igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens para o exercício de mesma função; o que dispõe sobre aplicação da pena por perda de mercadoria, veículo ou moeda; o que dispõe sobre garantia de operações de crédito e do direito de resgate assegurado aos participantes de planos de previdência complementar aberta; o que institui o Programa Escola em Tempo Integral; e o que institui o Programa de Aquisição de Alimentos.

Ministério da Saúde anunciou volta da educação sexual em escolas públicas

Em 25 de julho deste ano, o Ministério da Saúde anunciou a retomada da educação sexual e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis na grade do Programa Saúde na Escola (PSE), política implementada em parceria com o Ministério da Educação. O programa foi criado em 2007, mas o tema não era bem visto no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que chegou a mandar que o Ministério da Saúde recolhesse a Caderneta de Saúde do Adolescente, distribuída por meio de parcerias com o PSE.

Este ano, a Portaria 1.004/2023, que definiu os municípios com adesão ao programa para o ciclo 2023/2024, foi publicada pela ministra Nísia Trindade no dia 21 de julho. O Artigo 3º da Portaria define que saúde sexual é um das ações prioritárias para o ciclo 2023/2024. As ações devem incluir: “alimentação saudável e prevenção de obesidade e promoção da atividade física, ou saúde mental, ou prevenção de violências e acidentes, ou promoção da cultura de paz e direitos humanos, ou saúde sexual e reprodutiva e prevenção de HIV/IST”.

O público alvo das ações são crianças, adolescentes, jovens e adultos da educação pública brasileira. Em nota, o Ministério da Saúde informou que “as temáticas e a forma de abordagem são adequadas à faixa etária e ao ano escolar do estudante, em consonância com a Base Nacional Comum Currícular (BNCC)”.

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A alegação presente em peças desinformativas de que a educação sexual irá estimular a atividade sexual precoce em crianças é desbancada por estudos. “As pesquisas do mundo inteiro indicam claramente que a educação em sexualidade (EIS) raramente, ou nunca, leva à iniciação sexual precoce”, dizem as Orientações Técnicas Internacionais de Educação em Sexualidade, publicadas em 2019 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

“As pesquisas têm demonstrado que a EIS não tem impacto direto na idade em que a iniciação sexual ocorre, na verdade, resulta em postergação da iniciação sexual e em comportamentos sexuais mais responsáveis”, completa o texto.

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