A foto de um faqueiro vendido em leilão por R$ 120 foi tirada de contexto para acusar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de se apropriar do item ao deixar o Palácio da Alvorada em 2010. A imagem do conjunto de talheres foi compartilhada no Facebook como se mostrasse um presente oferecido pela rainha Elizabeth II ao ex-presidente do regime militar Artur Costa e Silva, em 1968. O post com a informação falsa foi compartilhado 6,6 mil vezes.
"Costa e Silva ganhou um faqueiro de ouro da rainha da Inglaterra em 1968, mas considerou o presente sendo para a nação brasileira. Luiz Inácio Lula da Silva mandou empacotar e levou consigo quando deixou o palácio em 2010. Ele considerou que o faqueiro era dele", diz o meme compartilhado no Facebook. A postagem acompanha a foto de um encontro entre a rainha Elizabeth II e Costa e Silva, bem como uma imagem do suposto presente.
Com o mecanismo de busca reversa do Google, é possível identificar a foto do conjunto de talheres no site de leilões Mozart Leiloeiro. A descrição do produto diz se tratar de um faqueiro coreano, sem estojo, feito de aço inoxidável e banhado a ouro. O item foi vendido a R$ 120 no dia 23 de fevereiro de 2013.
Presentes são patrimônio da União
O general Artur Costa e Silva e a rainha Elizabeth II se encontraram no Palácio da Alvorada em 5 de novembro de 1968. A monarca inglesa estava acompanhada do Príncipe Philip. O evento foi noticiado pelo Estadão na época.
Na ocasião, a rainha foi presenteada com balangandãs de ouro, um retrato do presidente brasileiro e um quadro de Glauber Lima. Elizabeth II, por sua vez, ofereceu a Costa e Silva uma taça de prata ovalada e um centro de mesa.
Presidentes da República não podem ganhar presentes de valor. Por isso, objetos recebidos devem ser incorporados ao patrimônio da Presidência ou doados a uma entidade de caráter cultural ou filantrópico. Este é o caso, por exemplo, de presentes oferecidos por outros chefes de Estado.
Presentes de Lula
Durante buscas na casa do ex-presidente Lula em São Bernardo do Campo, em 2016, a Polícia Federal (PF) encontrou indícios de que o presidente manteria objetos de valor em um cofre de um banco em São Paulo. O então juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, proferiu decisão que permitiu aos agentes fazerem buscas e apreensão no cofre.
No local, os policiais encontraram joias, moedas, condecorações e peças de arte que o petista alegava serem de seu acervo pessoal. A sala abrigava um total de 133 peças, todas elas recebidas pelo ex-presidente durante seus dois mandatos. Não há relato de que algum faqueiro de ouro estivesse no cofre. O local era usado desde 21 de janeiro de 2011, mesmo ano em que Lula passou a faixa presidencial para sua sucessora, Dilma Rousseff (PT).
Moro determinou à Secretaria de Administração da Presidência da República que formasse comissão para apurar se os objetos deveriam ser incorporados ao patrimônio da Presidência. O então juiz federal acatou o relatório dos técnicos e determinou o confisco de 21 peças, dentre as quais esculturas em formato de camelo, três espadas e uma coroa. Ele se baseou no artigo 10, inciso II do Decreto Nº 4.081/2002, que ainda estava vigente.
Este conteúdo também foi checado por Boatos.org.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.
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