Esta checagem foi produzida por jornalistas da coalizão do Comprova. Leia mais sobre nossa parceria aqui.
- Conteúdo verificado: Circula nas redes sociais uma imagem do senador Renan Calheiros (MDB) apertando a mão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes com o texto: "De um lado, 17 inquéritos, incluindo corrupção e lavagem de dinheiro. Do outro, quem o julga", questionando a imparcialidade do ministro ao sugerir que ele teria julgado processos em que Renan Calheiros foi réu, o que não é verdade.
É enganosa uma publicação compartilhada em grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro com uma foto do senador Renan Calheiros (MDB-AL) apertando a mão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e o texto: "De um lado, 17 inquéritos, incluindo corrupção e lavagem de dinheiro. Do outro, quem o julga".
De fato, Calheiros foi réu pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, mas, ao contrário do que a peça de desinformação afirma, os processos que envolvem o senador no STF não têm Alexandre de Moraes como relator.
Além disso, a foto usada no post enganoso é de 8 de fevereiro de 2017, quando Moraes era ministro da Justiça licenciado e havia sido indicado pelo então presidente Michel Temer (MDB) à vaga de Teori Zavascki no STF.
A reportagem contatou o usuário que compartilhou o post e um dos administradores do grupo Bolsonaro 2022 no Facebook, que já apareceu em outras verificações do Comprova, mas não recebeu resposta. O conteúdo foi considerado enganoso porque tira a foto de seu contexto original e publica um texto para induzir a uma interpretação diferente da realidade.
Como verificamos?
Primeiramente, a reportagem buscou verificar se a foto utilizada no post era verdadeira e em que contexto Renan Calheiros e Alexandre de Moraes tinham se encontrado. Por meio de uma busca reversa pela imagem no Google, identificamos que ela foi tirada em 8 de fevereiro de 2017, após Moraes ter sido indicado ao cargo de ministro do STF pelo presidente Michel Temer.
Nesta pesquisa, encontramos reportagens de diversos veículos sobre o encontro, por meio das quais foi possível identificar a autoria da foto, já que os jornais El País e Folha de S.Paulo utilizaram a mesma imagem que foi compartilhada no post verificado. Assim, a reportagem constatou que o registro foi feito pela repórter da Agência Brasil Débora Brito.
O próximo passo foi pesquisar se Renan Calheiros é réu em algum processo em que o ministro Alexandre de Moraes é relator, conforme o post dá a entender. A reportagem contatou a assessoria de imprensa do STF e acessou documentos no site do órgão.
A equipe tentou contato com o autor do post para questionar se ele estava ciente do contexto da foto e se verificou as informações antes de compartilhar, mas não obteve retorno.
Verificação
O encontro
A imagem utilizada no conteúdo aqui verificado foi feita em 8 de fevereiro de 2017, pela fotógrafa Débora Brito, da Agência Brasil. A legenda no site da empresa é: "Brasília - Líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, recebe Alexandre de Moraes, indicado para ministro do STF. Moraes foi ao Congresso Nacional apresentar suas credenciais aos senadores".
De acordo com reportagem da Folha do dia 14 de fevereiro daquele ano, Moraes, então ministro da Justiça licenciado, buscava apoio para ter seu nome aprovado no Senado para a vaga no STF. Ele foi indicado pelo então presidente Michel Temer (MDB) para ocupar a vaga deixada por Teori Zavascki, que morreu em um acidente aéreo no início de 2017.
Na ocasião da foto, Alexandre de Moraes foi recebido pelo senador Renan Calheiros em seu gabinete. A reunião aconteceu uma semana antes da sabatina do indicado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Em 21 de fevereiro de 2017, a CCJ aprovou Alexandre de Moraes para o cargo de ministro do STF. Moraes tomou posse como ministro no dia 22 de março de 2017.
Ações no STF
A busca pelo nome completo de Renan Calheiros (José Renan Vasconcelos Calheiros) no sistema de consulta processual pública do Supremo Tribunal Federal mostra que o senador é parte em 45 processos. Desses, 12 estão em tramitação,:
- 8 Inquéritos
- 1 Habeas Corpus
- 1 Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
- 2 Petições
Renan é investigado em oito inquéritos, como é possível verificar abaixo:
A última movimentação dos inquéritos foi:
- Inq 4851: Expedido pela ministra Rosa Weber à Polícia Federal no dia 18/10/2021. A última decisão foi assinada pela relatora no dia 29/06/2021, em segredo de justiça
- Inq 4833: Processo recebido na PGR no dia 05/11/2021. A última decisão foi um deferimento de pedido, assinado pelo relator, Edson Fachin, no dia 27/08/2021
- Inq 4832: Processo recebido na PGR no dia 09/11/2021. A última decisão foi um deferimento de pedido, assinado pelo relator, ministro Edson Fachin, no dia 27/08/2021
- Inq 4492: Envio dos autos do processo ao relator no dia 08/11/2021. A última decisão foi um deferimento de pedido, assinado pelo relator, ministro Luis Roberto Barroso, no dia 14/06/2021
- Inq 4426: Processo recebido na PGR no dia 28/10/2021. A última decisão foi um deferimento de pedido, assinado pelo relator, ministro Edson Fachin, no dia 27/08/2021
- Inq 4382: Determinação da expedição de ofícios em 10/11/2021. Última decisão foi um deferimento parcial de pleito da PGR, assinado pelo relator, ministro Edson Fachin, no dia 22/10/2021
- Inq 4326: Julgamento marcado para o dia 09/12/2021, em Sessão Extraordinária a ser realizada às 14h. Última decisão foi a inclusão na pauta, tomada pelo tribunal pleno.
- Inq 4215: Despacho assinado pelo Ministro Edson Fachin, relator do processo, no dia 17/09/2021. A última decisão foi um pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes, no dia 28/06/2021.
Como pode-se observar, Alexandre de Moraes não encontra-se na relatoria e não julgou algum desses inquéritos. O ministro pode votar sobre esses processos caso eles virem pauta, mas sua participação se dará como membro do colegiado, votando como os demais ministros da Corte.
Autor do post já disse ter sido bloqueado pelo Facebook
O autor do post checado nesta verificação é membro do grupo Bolsonaro 2022 no Facebook desde agosto de 2021. Em poucos meses, ele compartilhou diversas postagens se posicionando contra a esquerda e suas bandeiras.
O usuário da rede social também criticou diretamente a Rede Globo e disse já ter sido bloqueado pelo Facebook em um post compartilhado no mesmo grupo, em que completa perguntando aos outros membros "O que vcs acham da CPI do circo?".
Recentemente, o usuário criticou diretamente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pediu apoio "para derrubar" o técnico do time de vôlei masculino do Brasil, Renan Dal Zotto. Isso ocorreu após o técnico vetar o jogador Maurício Souza, que fez declarações homofóbicas relacionadas a um quadrinho em que o filho do Superman se declarava bissexual. Na mesma linha, o usuário compartilhou uma montagem em que Jon Kent beijava o ex-presidente Lula.
De um total de 11 publicações visíveis no perfil do autor do post para qualquer usuário do Facebook, nove foram feitas no grupo Bolsonaro 2022, que já teve várias publicações verificadas no Comprova neste ano. Até o dia 8 de novembro, o grupo tinha cerca de 1,2 milhão de membros e contava com 10 mil publicações feitas somente no último mês, conforme informações do próprio Facebook. No total, o grupo tem três administradores e quatro moderadores. O Comprova tentou contato com um dos administradores, mas não obteve resposta.
Renan, Moraes e Bolsonaro
O conteúdo em questão interessa ao discurso bolsonarista, pois cria uma relação entre o senador Renan Calheiros e o ministro Alexandre de Moraes, alvos de ataques do presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores.
O senador começou a atuar de forma ativa na oposição ao governo Bolsonaro em fevereiro de 2021, quando foi eleito líder da maioria no Senado. "Eu nunca fui próximo do governo. Estive um pouco ausente, primeiro por conta da pandemia, e depois porque fiz duas cirurgias, fiquei um tempo me recuperando. Eu quero trabalhar e manter a intensidade do mandato. Tenho que fazer a minha parte e somar meus esforços aos esforços existentes na oposição", disse em entrevista ao jornal O Globo.
Calheiros, porém, entrou de vez na mira dos apoiadores do presidente em abril, quando começaram os trabalhos da CPI da Covid no Senado Federal, da qual o parlamentar foi o relator. No relatório final, redigido por Renan, pediu-se o indiciamento de Jair Bolsonaro e de membros do primeiro escalão do governo, como o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
Em uma das sessões, o alagoano foi chamado de "vagabundo" pelo senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente. Já o chefe do Executivo federal disse que "vagabundo" seria elogio ao senador.
Alexandre de Moraes, por sua vez, se tornou alvo de Bolsonaro e seus apoiadores no contexto dos inquéritos dos atos antidemocráticos. Em maio de 2020, uma operação da Polícia Federal, autorizada pelo STF, realizou buscas e apreensões em endereços de empresários e blogueiros bolsonaristas.
A operação partiu do inquérito das fake news, que apura ameaças e ofensas ao STF, e tem como relator o ministro Alexandre de Moraes. Na época, manifestantes protestavam a favor de Bolsonaro no contexto da Pandemia, após a corte decidir pela concorrência dos poderes com relação às medidas de combate à crise.
Além disso, foi Alexandre de Moraes quem determinou a prisão de lideranças bolsonaristas, como o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), que defendeu o AI-5 e fechamento do STF, e Roberto Jefferson, presidente do PTB.
O ápice da campanha de Bolsonaro contra Alexandre de Moraes aconteceu durante as manifestações de 7 de setembro deste ano. Na ocasião, o presidente discursou na Avenida Paulista diante de apoiadores e disse que não cumpriria decisões assinadas pelo ministro e ainda gritou: "Sai, Alexandre de Moraes. Deixa de ser canalha".
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post que sugere uma aliança entre o ministro do STF, Alexandre de Moraes, e o senador Renan Calheiros teve 321 compartilhamentos, 105 comentários e mais 356 reações até o dia 12 de novembro.
Comentários na postagem, como: "É um conluio muito devastador. Corruptos e corruptores políticos infiltrados nos três poderes." e "É lamentável ver como funciona (sic)as coisas neste país. Aliás sejamos honestos, com estes caras fazendo o serviço sujo não precisa desenhar. Vou ser sincero, tudo é manipulado, muitos estão de rabo preso." mostram que a publicação é nociva porque reforça o ódio contra as instituições do país, em especial, o STF, que vem sendo alvo de ataques impulsionados pelo próprio presidente Jair Bolsonaro.
O Comprova já verificou, neste ano, diversas postagens enganosas que sugerem ações e relações de políticos, instituições ou movimentos na tentativa de descredibilizá-las. Foi o caso da publicação falsa que inventou que o ex-presidente Lula é acionista do jornal Folha de S.Paulo e de vídeos que atribuíram a movimentos sociais e a partidos a depredação de um residencial do Minha Casa Minha Vida em Pernambuco.
O Estadão Verifica também já publicou verificação sobre inquéritos de Renan Calheiros no STF.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
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