Marçal divulga falso laudo contra Boulos, com assinatura forjada de médico que já morreu

Ex-coach afirmou que documento é de internação por uso de drogas, mas psolista participou de agenda pública no dia do alegado atendimento

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Foto do author Luciana Marschall
Atualização:

O que estão compartilhando: suposto laudo médico que mostraria que o candidato à Prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos (PSOL) foi atendido em uma clínica em São Paulo em 19 de janeiro de 2021 após “surto psicótico grave” pelo uso de cocaína.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. O documento divulgado pelo candidato à Prefeitura Pablo Marçal (PRTB) apresenta dados errados e inconsistências quanto à data do suposto atendimento. Veja os indícios de falsidade:

  • O documento afirma que Boulos teria sido atendido às 16h45, mas naquela tarde o psolista se encontrou com o vereador Emerson Osasco (PCdoB). O vereador publicou uma foto naquela mesma data e nesta sexta-feira, 5, confirmou que o encontro ocorreu no dia 19;
  • Boulos publicou uma transmissão ao vivo no Facebook na manhã do dia 19;
  • Boulos participou de distribuição de cestas básicas na Comunidade do Vietnã em 20 de janeiro. Foto publicada no Facebook comprova isso;
  • O RG de Boulos no suposto laudo tem um erro de digitação. O número correto pode ser conferido nas certidões disponíveis no site DivulgaCand, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE);
  • O nome da clínica também está errado: segundo o registro no CNPJ, o nome correto é “Mais Consultas”, e não “Mais Consulta”;
  • O médico que assina o laudo, José Roberto de Souza (CRM 17064-SP), morreu, de acordo com registro no Conselho Federal de Medicina (CFM). Ele não tinha especialidade registrada em psiquiatria;
  • O Estadão teve acesso à Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e a uma procuração do médico, constatando que a assinatura presente no material divulgado por Marçal é diferente da que aparece nesses documentos oficiais.
  • A médica Aline Garcia de Souza, filha de José Roberto, declarou ao Estadão que o pai nunca atendeu na capital paulista, mas sim nas regiões de Campinas e Hortolândia, no interior de São Paulo. No documento divulgado pelo candidato do PRTB consta o endereço da Mais Consulta Clínica Médica, no bairro Jabaquara, na zona sul.
  • O documento tem erros de português: “por minha atendido” e “apresentou com quadro de surto psicótico grave”;
  • Boulos republicou foto e vídeo em que o dono da clínica em que teria ocorrido o atendimento, Luiz Teixeira da Silva Júnior, aparece ao lado de Marçal. A rede social dele aparece na manhã deste sábado, 5, como privada;
  • Luiz Teixeira foi condenado por falsificação de documento, como mostrou o Estadão. Ele teria pagado R$ 27 mil a falsários para obter uma documentação necessária para se inscrever no Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul;
  • Boulos já foi internado aos 19 anos, devido a um quadro de depressão. Na ocasião, ele foi admitido no Hospital do Servidor Público Estadual. O psolista é filho de dois médicos e professores de medicina da Universidade de São Paulo (USP). Isso levanta dúvidas de que ele tenha procurado uma clínica de menor prestígio.
  • Médico psiquiatra ouvido pelo Estadão Verifica disse que a quantidade de cocaína que aparece no laudo como tendo sido consumida por Boulos teria sido fatal.

Marçal deletou a postagem com o laudo poucas horas depois da publicação e não se pronunciou mais sobre o caso. Boulos negou a acusação e disse que vai pedir a prisão do adversário.

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Laudo apresentado por Marçal tem erros e inconsistência de datas Foto: Reprodução/Facebook

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Saiba mais: Marçal publicou na noite desta sexta, 4, o documento que alega ser um laudo que aponta suposto uso de cocaína por Boulos. O candidato do PSOL rechaçou a veracidade do laudo, divulgou imagens de redes sociais da data apontada no receituário e afirmou que pedirá a prisão de Marçal e do dono da clínica que aparece na imagem.

A imagem apresenta um suposto receituário médico que indicaria encaminhamento de Boulos para uma emergência psiquiátrica em 2021, por uso de cocaína. O suposto laudo fala em “surto psicótico grave”, com “delírio persecutório e ideias homicidas”.

O Estadão informou na sexta-feira que os telefones da clínica onde teria ocorrido o atendimento estão inativos, e a última postagem no Instagram da instituição ocorreu em setembro de 2020.

Desde o primeiro debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, bem como em suas redes sociais, Marçal vem falsamente acusando Boulos de ser usuário de cocaína, sem apresentar provas. Nesse primeiro debate, promovido no início de agosto pela Band, o ex-coach chamou o deputado federal de “comedor de açúcar”, insinuação que repetiu em vídeos publicados nas suas redes. Marçal foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) por associar o adversário do PSOL ao uso de cocaína.

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O suposto laudo afirma que um exame toxicológico de Boulos teria apontado 2,825 ng/mg de benzoilmetilecgonina no organismo dele e que o valor referencial para o exame seria de 0,5 ng/mg. Contudo, essa seria uma dosagem letal, de acordo com o médico psiquiatra Hamilton Raposo. O especialista explica que o exame toxicológico é capaz de detectar uma quantidade mínima da substância – de 0,005 mg/l de sangue, por exemplo – e que o valor que aparece como referência no suposto laudo, de 0,5, seria considerado uma intoxicação gravíssima.

Um estudo publicado em 1998 analisou 48 mortes relacionadas à cocaína e identificou que a concentração média de cocaína e de benzoilecgonina -- principal metabólito da cocaína -- era de 1,12 mg/l e 1,54 mg/l, respectivamente, nessas pessoas.

Outro indício de fraude é o fato de os valores que aparecem no suposto laudo serem idênticos aos que aparecem em outro documento, que pode ser facilmente encontrado em uma busca na internet. Ele aparece em uma reportagem do portal g1 na qual motoristas acusavam laboratórios de erros em análises de exames toxicológicos.

O Aos Fatos também considerou o laudo como falso.

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