Lula não disse que vai implantar ditadura no Brasil em entrevista a canal chinês

Vídeo tira de contexto trecho em que ex-presidente responde sobre o baixo desempenho econômico de outros países em comparação com o desenvolvimento da China

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Por Projeto Comprova
Atualização:

Esta checagem foi produzida por jornalistas da coalizão do Comprova. Leia mais sobre nossa parceria aqui.Conteúdo investigadoVídeo em que o influenciador digital e candidato a deputado federal de Goiás Gustavo Gayer, do Partido Liberal (PL), afirma que Lula declarou abertamente querer implantar uma ditadura no Brasil. Gayer se baseia em trechos de entrevista do petista ao canal chinês Guancha.

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Onde foi publicado: Facebook e YouTube.

Conclusão do Comprova: É enganoso o vídeo publicado por Gustavo Gayer no qual ele afirma que Lula declarou abertamente querer implementar uma ditadura no Brasil. No material, são apresentados trechos de entrevista feita em julho de 2021, pelo jornalista chinês Eric Li, em que não há nenhuma afirmação com este sentido. O trecho usado por Gayer para exemplificar o suposto desejo do ex-presidente de implantar uma ditadura no país é o seguinte: "A China tem um partido que tem poder, tem um Estado forte, que toma decisões e que as pessoas cumprem. Coisa que nós não temos aqui no Brasil. Nós tivemos um golpe na Dilma Rousseff, na nossa presidente, por conta de uma mentira".

 

As falas de Lula foram retiradas de contexto e eram parte de uma resposta sobre a razão do baixo desempenho de outros países do bloco BRICS (formado por Brasil, Rússia, Índia e África do Sul) em comparação com o desenvolvimento da China.

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Nem nos trechos recortados e utilizados no vídeo publicado por Gayer, nem no vídeo original, foi afirmado o desejo de implantar uma ditadura no país. Nos cerca de 51 minutos da entrevista, o petista não utiliza a palavra ditadura nem fala nada sobre o desejo de instaurar um regime autoritário no Brasil. Em resposta ao Comprova, a assessoria de imprensa de Lula também negou que ele tenha falado em implantar uma ditadura.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. No Facebook, a publicação original do pré-candidato Gustavo Gayer alcançou, até o dia 11 de agosto de 2022, 269 mil visualizações. Nela, houve 34 mil compartilhamentos, 3,3 mil comentários e 35 mil reações. Gayer também publicou o link do vídeo do YouTube em sua página no Facebook, conseguindo mais 354 compartilhamentos, 692 reações e 109 comentários. O vídeo no YouTube, até a mesma data, teve 180 mil visualizações e 2,7 mil comentários. Segundo dados captados pelo CrowdTangle, o vídeo foi postado em 17 diferentes páginas, com um total de seguidores chegando a 386 mil.

O que diz o autor da publicação: Procurado por e-mail pelo Comprova, Gustavo Gayer não respondeu.

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Como verificamos: Durante o vídeo, Gayer menciona que as falas foram retiradas da gravação de uma entrevista para uma para um canal chinês. A verificação, então, teve início com a pesquisa em buscadores como o Google por palavras-chave como "Lula", "entrevista canal chinês" e "ditadura". A partir das buscas, a equipe chegou à íntegra da entrevista do ex-presidente da República ao jornal Guancha, publicada em julho de 2021.

Após transcrever tanto a entrevista de Lula ao canal chinês, quanto o vídeo publicado por Gustavo Gayer, o Comprova analisou todos os recortes de fala do petista usados no vídeo verificado. Também foram procurados os envolvidos e citados no vídeo por e-mail e WhatsApp. A assessoria de Lula também foi procurada.

Lula não fala abertamente sobre implantar ditadura, como afirmado no vídeo

Diferentemente do que foi alegado por Gustavo Gayer, Lula não declara, em nenhum momento, a intenção de implantar uma ditadura no Brasil. O termo "ditadura" não é mencionado nos trechos recortados e utilizados no vídeo de Gayer nem na entrevista original, transmitida ao vivo pelo Guancha e por veículos nacionais, como a Rede TVT em parceria com o jornal Brasil de Fato.

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No vídeo de Gayer, são apresentados pedaços da resposta de Lula ao questionamento feito pelo jornalista chinês Eric Li sobre o baixo desenvolvimento econômico de outros países do BRICS frente ao desempenho da China nas últimas décadas. O ex-presidente responde: "Por que é que a China fez isso? Porque a China tem um partido, a China é resultado de uma revolução de 1949 do Mao Tse Tung. A China tem um partido que tem poder, tem um Estado forte, que toma decisões e que as pessoas cumprem. Coisa que nós não temos aqui no Brasil. Nós tivemos um golpe na Dilma Rousseff, na nossa presidente, por conta de uma mentira."

Na mesma entrevista, em sua visão dos fatos, Lula fala que "muitas das políticas sociais que o povo precisa" foram feitas na China, por conta do "Estado forte". Além disso, segundo o ex-presidente, o país asiático combateu o coronavírus com rapidez devido a uma política de Estado forte. Apesar do conteúdo elogioso ao governo chinês e sua avaliação pessoal diante da questão, Lula não disse que desejava implantar uma ditadura comunista no Brasil.

O petista afirma que "a China é um exemplo de desenvolvimento para o mundo" e diz esperar que outros países aprendam com o país , "para que sejam mais ricos, mais fortes, ter mais distribuição de riqueza e ter um mundo mais humano".

Lula cita a China para destacá-la como um exemplo de "organização política", característica que julga ter sido a base para que os chineses tenham conseguido evoluir nos últimos 20 anos "com muita competência, com muita cultura, com muito investimento e com muito conhecimento científico e tecnológico".

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Entrevista ao canal chinês ocorreu em 2021

Gayer enfatiza, de maneira enganosa, que a entrevista de Lula ao portal chinês teria sido realizada recentemente. No entanto, a conversa foi transmitida ao vivo no dia 7 de julho de 2021 no YouTube. O vídeo de Gayer foi publicado em 28 de julho de 2022, portanto um ano depois.

Ao jornal Guancha, o hoje candidato à Presidência da República menciona ainda que a China, para além das questões de partido, "evoluiu de forma extraordinária" porque também acreditava no "investimento em educação". "Foram milhões de jovens chineses que viajaram pelo mundo afora para se formar, para aprender, e é por isso que a China deu um salto extraordinário de qualidade", exemplificou o petista. Todos esses fatores, na avaliação de Lula, foram determinantes para que a China, hoje, se apresentasse com "uma economia consolidada" e menos vulnerável às outras superpotências.

Na entrevista, Lula defende ainda que, durante seu mandato, pensava muito na sua relação não apenas com a China, mas também com a Índia e com a África do Sul. Ele disse ter tentado articular para que países em desenvolvimento formassem uma "parceria estratégica" para que tais regiões, "sendo metade da humanidade", não ficassem "dependendo da política do dólar" para, por exemplo, atuar no comércio exterior ou fazer parceria no desenvolvimento tecnológico.

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Para além do comparativo e das associações sobre o modelo de desenvolvimento, o petista não diz que pretende implantar um modelo ditatorial no Brasil.

Gustavo Gayer

Gustavo Gayer já foi desmentido em verificações do Comprova que demonstraram que vídeo engana ao mostrar resultado parcial de enquete com intenção de voto para presidente, que um documento não prova fraude nas eleições 2018, e que uma pesquisa brasileira não usou doses letais para matar pacientes e desacreditar o uso da cloroquina. O empresário foi candidato a prefeito de Goiânia em 2020 pelo Democracia Cristã (DC) e ficou em 4º lugar, com 7,6% dos votos. Conforme informações divulgadas em seu canal no YouTube, que tem um milhão de inscritos, é pré-candidato a deputado federal.

Por que investigamos: O Comprova reforça a importância da investigação de conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais e investiga o vídeo por conta da relação direta com as eleições presidenciais. A publicação verificada cita o ex-presidente e candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva. Conteúdos enganosos e falsos que envolvem atores políticos são prejudiciais ao processo democrático e atrapalham a decisão do eleitor, que deve ser tomada com base em informações verdadeiras. No vídeo verificado, é afirmado que Lula "tinha que ser impossibilitado de concorrer à Presidência" por querer "implantar uma ditadura do Brasil" e incentiva a disseminação da informação falsa nas redes sociais.

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Outras checagens sobre o tema: O mesmo trecho da entrevista de Lula foi verificado anteriormente pelo Comprova em duas oportunidades. Na primeira, o ex-presidente era acusado de querer aplicar restrições religiosas no Brasil e, no segundo, de defender a implantação do comunismo. Os dois conteúdos foram classificados como enganosos.

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