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Governo Lula não doou dinheiro ao Hamas; boato falso ressurge após ataques a Israel

Recurso enviado pelo Brasil e por outros países era destinado à Autoridade Nacional Palestina (ANP) para fins humanitários

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Foto do author Samuel Lima

O que estão compartilhando: que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria doado R$ 25 milhões ao Hamas, em 2010.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Boato nas redes sociais que circula desde 2019 distorce o teor da Lei n°. 12.292, de 20 de julho de 2010, sancionada por Lula no final de seu segundo mandato. A doação de R$ 25 milhões era destinada à Autoridade Nacional Palestina. A ANP é um órgão do governo provisório liderado pelo Fatah e que controla a Cisjordânia, enquanto o Hamas é um grupo rival e extremista que domina a Faixa de Gaza.

Governo Lula não doou dinheiro ao Hamas; boato falso ressurge após ataques a Israel Foto: Reprodução

Saiba mais: a história de que o Brasil teria doado R$ 25 milhões para o Hamas é antiga e já foi desmentida pelo Estadão. Ela ressurgiu nas redes sociais com os ataques recentes do Hamas a Israel que mataram centenas de pessoas e que culminaram em uma declaração de guerra contra o grupo e com novos bombardeios na Faixa de Gaza.

A doação aos palestinos

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A Lei n°. 12.292/2010 autorizou o governo brasileiro a enviar até R$ 25 milhões para a Autoridade Nacional Palestina com a finalidade de apoiar a economia e reconstruir a Faixa de Gaza. A doação seria efetivada pelo Itamaraty por meio de recursos da pasta. Articulada pelo governo Lula, a medida passou pelo Congresso antes de ser sancionada pelo presidente em 20 de julho de 2010.

De acordo com informações da Câmara dos Deputados, a proposta era motivada por um conflito entre Israel e o Hamas que havia matado mais de 1,3 mil palestinos e 13 israelenses entre 2009 e 2010. Lideranças do governo defendiam o remanejo de recursos que seriam usados para a construção de um anexo no prédio do Itamaraty para uma doação de caráter humanitário.

O Brasil não foi o único país a se mobilizar nesse sentido. A agência de notícias Reuters reportou, na época, que a comunidade internacional havia levantado aproximadamente 4,5 bilhões de dólares para a Palestina, a serem encaminhados de forma a contornar o Hamas. Entre os doadores estavam os Estados Unidos e a União Europeia, que classificam o grupo como terrorista.

Entenda a diferença entre ANP e Hamas

Como mostra esta reportagem da BBC, a Palestina, que não é reconhecida oficialmente como Estado por todos os países das Nações Unidas, envolve dois territórios distintos, segundo a Linha do Armistício de 1949: a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, separados por cerca de 45 quilômetros.

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A Faixa de Gaza foi capturada por Israel na Guerra dos Seis Dias, em 1967, e só foi desocupada em 2005. Atualmente, ela é controlada pelo grupo extremista islâmico Hamas, que administra a região de forma independente e não reconhece os acordos assinados entre outros representantes palestinos e Israel.

O Hamas se define como um movimento de resistência baseado no Corão, destaca a CNN Brasil. O seu objetivo é a instauração de um Estado palestino em toda a área de Israel, que inclusive não é reconhecida como uma nação pelo grupo.

A Cisjordânia, por sua vez, é governada pela Autoridade Nacional Palestina, órgão provisório que representa os palestinos em fóruns internacionais, criado em 1993, durante os acordos de paz de Oslo. A ANP é liderada pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP), cujo principal expoente é o Fatah — grupo político que não é islâmico, mas laico. Desde 2005, a ANP é presidida por Mahmoud Abbas.

O primeiro presidente da ANP, antecessor de Abbas, também era filiado ao Fatah: Yasser Arafat, que liderou o governo entre 1994 e 2004, ano de sua morte. Fatah e Hamas tiveram seu conflito acirrado após as eleições legislativas de 2006, quando o Hamas saiu vitorioso. No ano seguinte, o movimento palestino tomou controle da Faixa de Gaza e expulsou o Fatah do território. Apesar de tentativas de aproximação dos dois grupos políticos nos anos seguintes, a cisão permanece ainda hoje.

Bombardeio israelense na Faixa de Gaza, no dia 8/10/2023, em retaliação a ataques do Hamas.  Foto: AP Photo / Fatima Shbair

Politização do conflito

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Desde que os fatos mais recentes sobre o conflito vieram à tona, houve uma politização do assunto no Brasil. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, repudiou o ataque a Israel dizendo que o Hamas é um “grupo terrorista que parabenizou Luiz Inácio Lula da Silva quando o TSE [Tribunal Superior Eleitoral] anunciou o vencedor das eleições de 2022″. Essa mesma informação é explorada pelas postagens que circulam agora nas redes sociais.

É verdade que o Hamas publicou nota elogiando o petista. Assinada por Busin Naim, membro da alta cúpula do grupo, o documento dizia que Lula era um “lutador pela liberdade” e que a sua vitória no pleito era significativa para os “povos oprimidos em todo o mundo” e particularmente para o povo palestino, porque o político era conhecido “pelo seu apoio forte e contínuo aos palestinos em todos os fóruns internacionais”. Lula não respondeu oficialmente ao comunicado.

A respeito dos atentados dos últimos dias, o presidente brasileiro se disse “chocado” e afirmou que o Brasil não poupará esforços para evitar a escalada do conflito enquanto exercer a presidência do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU. Ao convocar uma reunião de emergência, o Itamaraty reiterou compromisso com a solução de dois estados, um israelense e outro palestino, e destacou a necessidade de retomada das negociações para o estabelecimento de uma paz duradoura na região.

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“Ao expressar minhas condolências aos familiares das vítimas, reafirmo meu repúdio ao terrorismo em qualquer de suas formas”, escreveu Lula em post nas redes sociais. “Conclamo a comunidade internacional a trabalhar para que se retomem imediatamente negociações que conduzam a uma solução ao conflito que garanta a existência de um Estado Palestino economicamente viável, convivendo pacificamente com Israel dentro de fronteiras seguras para ambos os lados.”

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