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Atleta de MMA Gabi Garcia não é trans; campanha espalha desinformação nas redes

Postagens têm comentários em apoio a discurso do deputado Nikolas Ferreira, que usou peruca na Câmara

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Foto do author Samuel Lima
Atualização:

Perfis em diversas redes sociais, como Twitter, Facebook e Kwai, estão disseminando desinformação sobre a atleta brasileira de MMA Gabi Garcia. As páginas afirmam que ela é transexual — o que não é verdade — e dão voz a uma série de comentários preconceituosos na internet. Gabi é uma das atletas mais bem-sucedidas do jiu-jitsu brasileiro e faz parte do Hall da Fama da modalidade.

Vídeos a respeito de Gabi passaram a circular nas redes após o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) discursar em sessão solene do Dia Internacional da Mulher na Câmara usando uma peruca. Em comentários nessas postagens, perfis prestam apoio ao parlamentar, que falou contra “homens que se sentem mulheres” e ironizou o feminismo. O discurso motivou três notícias-crime no Supremo Tribunal Federal (STF) por transfobia e um abaixo-assinado com mais de 270 mil adesões a favor de sua cassação. Especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam que o parlamentar violou a Lei 7.716/1989, que se aplica a casos de transfobia e homofobia (leia mais abaixo).

Boato inventa que atleta de jiu-jitsu e MMA Gabi Garcia seria transexual em campanha preconceituosa contra a comunidade LGBT+ no Brasil. Foto: Reprodução / Twitter

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Um dos vídeos virais no Twitter mostra uma luta de Gabi Garcia contra a russa Anna Malyukova, em evento da organização japonesa Rizin, em abril de 2016. “Mulher luta com homem trans que nunca ganhou luta com homens, agora luta com mulheres”, alega a legenda do conteúdo, confundindo termos e inventando fatos.

A campanha de desinformação se estende a outras redes sociais. Em vídeo do Kwai que depois viralizou no Facebook, o material usado é de uma disputa com a brasileira Barbara Nepomuceno, novamente no Rizin, em dezembro de 2018. “Você acha certo homem trans competir com uma mulher? Então, nós homens, só vestir uma saia e estamos iguais”, alega o conteúdo falso.

Gabrielle Lemos Garcia, 37 anos, nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, e é uma das atletas mais bem-sucedidas do jiu-jitsu brasileiro. Ela venceu nove mundiais de faixa-preta e 11 campeonatos pan-americanos. Faz parte do Hall da Fama do do International Brazilian Jiu-Jitsu Federation (IBJJF), desde 2014.

A atleta gaúcha ainda venceu quatro campeonatos do Abu Dhabi Combat Club (ADCC), um dos principais campeonatos de luta agarrada do mundo, e tem um cartel de seis vitórias, nenhuma derrota e um no contest (sem resultado) nas artes marciais mistas, o popular MMA, competindo no Rizin. Ela se aposentou do jiu-jitsu em 2021, mas segue atuando nas artes mistas.

Até a publicação desta checagem, Gabi não havia se manifestado publicamente sobre o assunto. O Estadão Verifica tentou contato com ela por formulários, mensagens diretas em redes sociais e pelo e-mail da sua escola de jiu-jitsu nos Estados Unidos, mas não teve resposta.

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Vídeos passaram a circular após discurso na Câmara

As peças de desinformação começaram a se espalhar na internet depois que o deputado federal mineiro Nikolas Ferreira (PL), o mais votado do País nas eleições do ano passado, fez um discurso contra o feminismo na tribuna da Câmara dos Deputados durante a sessão solene alusiva ao Dia Internacional da Mulher, em 8 de março.

Com uma peruca loura, o deputado se apresentou como “deputada Nikole” para debochar do movimento de direitos das mulheres e defender que elas “retomem a sua feminilidade” concebendo filhos e casando. No discurso, o político ainda sugeriu que o lugar das mulheres na sociedade estaria sendo “roubado” por homens que se identificam com o gênero feminino.

Nikolas Ferreira se tornou alvo de três notícias-crime no STF por transfobia e de um abaixo-assinado a favor de sua cassação com mais de 270 mil adesões, além de pedidos formais de perda de mandato por quebra de decoro na Câmara.

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Especialistas ouvidos pelo Estadão entendem que o deputado infringiu a Lei 7.716/1989, que dispõe sobre crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor e que, por decisão do próprio STF, também se aplica aos casos de homofobia e transfobia.

O deputado rebateu a acusação em suas contas, dizendo ser vítima de perseguição pelo ativismo LGBT+. Mais tarde, diante da repercussão do caso, passou a criticar outros aspectos em gravações e entrevistas, entre elas a presença de atletas trans em certas modalidades esportivas e o uso de banheiros. O parlamentar disse que, se perder o mandato, levanta “10 mil Nikolas no Brasil inteiro”. “A minha vida não acaba com a cassação”, afirmou ele, em um vídeo divulgado em suas redes sociais.

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