O que estão compartilhando: que o Padre Kelmon, candidato à Presidência da República em 2022 pelo PTB e aliado de Jair Bolsonaro (PL), foi preso por roubo.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. Postagem no TikTok mostra trecho de uma reportagem verdadeira do SBT sobre a prisão de um padre por roubo no Rio Grande do Sul em 2021. No entanto, a matéria é falsamente associada à imagem do Padre Kelmon, que substituiu Roberto Jefferson na chapa do PTB à Presidência da República no ano passado e declarou apoio a Bolsonaro no segundo turno.
O padre detido após assaltar três estabelecimentos diferentes em Passo Fundo (RS) se chama Elizeu Lisboa Moreira e tinha 27 anos na época. À polícia, ele disse apenas que os crimes foram cometidos em um “momento de loucura”. Uma semana após a prisão, ele foi transferido para uma clínica psiquiátrica.
Saiba mais: O vídeo investigado tem pouco mais de um minuto de duração e é encerrado antes que o repórter Lucas Abati, do SBT em Porto Alegre, diga o nome do padre preso por cometer assaltos com uma arma de brinquedo na cidade de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul. A reportagem foi ao ar em 3 de março de 2021, um dia após os crimes e bem antes de o Padre Kelmon se tornar uma figura conhecida nacionalmente.
O vídeo, contudo, cria uma narrativa enganosa ao inserir uma imagem do Padre Kelmon junto com o trecho da reportagem e aproveitar uma frase dita pelo apresentador Marcão do Povo, do programa Primeiro Impacto, para confundir e dar a entender que o preso era o ex-candidato à Presidência.
Pouco antes de chamar o repórter de Porto Alegre (RS), o apresentador diz: “Não, você tá falando que é aquele padre? Não, você está de sacanagem comigo, é o fim dos tempos”. Em seguida, o repórter começa a falar, mas o vídeo, que tem 1:06, não mostra toda a reportagem, que tem 2:32 de duração. No minuto 1:38 da matéria, o repórter diz o nome do padre preso em flagrante e informa que ele atuava na cidade de Tapejara, vizinha de Passo Fundo.
‘Momento de loucura’
O site Gaúcha ZH, de Porto Alegre, fez um perfil do padre no dia 3 de março daquele ano contou como os assaltos ocorreram. Segundo a reportagem, o padre Elizeu assaltou três estabelecimentos: ele chegava aos locais, comprava itens, ia até o caixa, pagava em dinheiro e, quando o operador de caixa se preparava para dar o troco, ele sacava a arma e levava todo o dinheiro do caixa.
O ato se repetiu em dois supermercado e uma farmácia, até que o padre foi preso em flagrante pela Brigada Militar quando estava no centro da cidade a bordo de um carro que pertencia à Arquidiocese de Passo Fundo. O delegado da cidade à época, Diogo Ferreira, disse que o padre afirmou que cometeu os crimes em um “momento de loucura”.
“Foi a única frase que ele disse. Estava totalmente calmo, parecia que não tinha caído a ficha do que ele fez e que estava no mundo da lua. A arma de brinquedo que ele usou não deve pesar 10 gramas, é de plástico e oca. Um fato sem explicação”, disse o delegado.
O arcebispo de Passo Fundo, Dom Luís Weber, fez um pronunciamento no dia 3 de março de 2021 sobre o caso e disse que o padre seria suspenso provisoriamente até que se esclarecesse o que aconteceu, e que ele receberia apoio para a defesa. “É um fato que choca, que chama atenção, que provoca. Portanto, todos nós nos sentimos muito tristes, muito pensativos sobre esse acontecimento”, disse. Segundo ele, o padre era bem aceito pela comunidade.
Transferência para clínica psiquiátrica
Uma semana após o caso, no dia 10 de março de 2021, a prisão do padre Elizeu foi revogada pela Justiça, que determinou a internação em uma clínica psiquiátrica com base em dois laudos, um deles assinado pela psiquiatra que já o acompanhava antes dos assaltos. No dia seguinte à transferência, a Polícia Civil enviou à Justiça o indiciado do padre por roubo.
À Gaúcha ZH, a advogada Maura da Silva Leitzke disse que ele foi diagnosticado com transtorno de hábitos e impulso e seria tratado em uma clínica de Passo Fundo. Segundo ela, ele fazia tratamento psiquiátrico e, três semanas antes dos crimes, deixou de tomar os remédios por conta próprio. No dia dos roubos, ele havia ido a Passo Fundo para celebrar a missa de morte da irmã de um amigo, que era próxima do padre.
“Ele não cometeu esse crime em sã consciência. Não saiu de casa para assaltar, mas para celebrar uma missa, encomendar o corpo de uma amiga jovem. No meio daquele turbilhão de emoções, ele surtou. Isso vem sendo comprovado pelos laudos, tanto que o juiz determinou a internação dele”, disse a advogada.
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