É falso que existam 100 mil organizações não-governamentais (ONGs) no Estado do Amazonas, e nenhuma no Nordeste brasileiro. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicaram levantamentos sobre número de ONGs no Brasil e, embora haja discrepância entre as estimativas feitas por cada instituição, nenhuma delas chega aos números apresentados pelo boato. No Facebook, uma postagem com essas informações falsas teve 1,5 mil compartilhamentos.
A versão mais atualizada do Mapa das Organizações da Sociedade Civil, feito pelo Ipea, registra 10.326 entidades no Amazonas, em comparação com 194.033 nos nove Estados do Nordeste brasileiro. Já a última versão do levantamento "As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil", do IBGE, calcula que existam 1.462 ONGs no Estado, em comparação com 44.496 na região.
A discrepância entre os dados do IBGE e do Ipea está explicada na nota técnica reproduzida abaixo. Os dois institutos de pesquisa utilizam bases de dados diferentes; o mapa do Ipea faz um recorte mais amplo. Enquanto o IBGE utiliza o Cadastro Central de Empresas (Cempre), o Ipea parte do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), da Secretaria da Receita Federal (SRF) e de outras 14 fontes de dados auxiliares.
O mesmo mapa do Ipea registrava que existiam, em agosto do ano passado, 102.080 entidades da sociedade civil com sede em municípios da Amazônia Legal -- área que corresponde à totalidade dos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do estado do Maranhão. O IBGE estimava que eram 236.950 fundações privadas e associações sem fins lucrativos no País, sendo 15.919 nos Estados que compõem a Amazônia Legal.
No ano passado, quando o aumento das queimadas na região da Amazônia tornou-se um assunto internacional, uma série de correntes começou a circular pelas redes sociais questionando a verdadeira intenção de ONGs com a floresta brasileira. Os primeiros registros da peça de desinformação mencionada neste texto são de agosto do ano passado. Naquele mês, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o embaixador do Brasil na França, Luís Fernando Serra, afirmou: "Você vê 300 ONGs na Amazônia e zero no Nordeste".
O mesmo fenômeno aconteceu neste ano com o aumento das queimadas no bioma do Pantanal, quando esta postagem voltou a circular.
Uma postagem checada pelo Estadão Verifica semana passada alegava sem nenhuma evidência que "ONGs e militantes de esquerda" eram os responsáveis pelos incêndios no Pantanal. Outra, também desmentida semana passada, alegava que o ex-ministro do Meio Ambiente Sarney Filho vendeu a Floresta Amazônica "para ONGs por 60 milhões de dólares". Ano passado, organizações não-governamentais também foram acusadas falsamente de incendiar a floresta Amazônica; um vídeo citou um roubo falso de barras de ouro por uma ONG do Brasil e outro vídeo forjou a apreensão de um diamante gigante contrabandeado por ONG na Amazônia.
Outra versão deste boato também foi verificada por UOL Confere, Fato ou Fake, Boatos.org e Agência Lupa.
Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.
Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.
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