Refinarias de gás na Bolívia foram vendidas, e não doadas por Lula

País vizinho pagou US$ 112 milhões para ter o controle de unidades que pertenciam à Petrobras

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Uma postagem viral no Facebook recicla um boato de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria doado uma refinaria para a Bolívia. A afirmação é falsa. Em 2006, o país vizinho assumiu o controle de duas refinarias da Petrobras após decreto do recém-eleito presidente Evo Morales, que nacionalizou toda a exploração de gás. Mas os bolivianos pagaram US$ 112 milhões ao Brasil pela aquisição das unidades, após negociações.

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"O gás tá caro? Só pra lembrar que eu doei a refinaria pra Bolívia e agora a gente paga uma fortuna pra comprar gás deles", afirma a publicação, com uma foto de Lula ao fundo. A alegação sobre o custo do produto também é enganosa, pois o preço final ao consumidor do gás liquefeito de petróleo (GLP) pouco tem a ver com a importação do gás natural -- e não sofreu nenhum reajuste significativo no período da venda da refinaria, tampouco nos últimos anos.

Lula não 'doou' refinaria para a Bolívia, ao contrário do que diz postagem. Foto: Reprodução

"O custo fundamental do gás vem da Petrobras, que faz a extração e transporta o produto até o limite dos Estados, além de ser a responsável por cerca de 70% do gás do Brasil", explica o economista Darcio Martins, pesquisador do Insper. "A questão da Bolívia pode afetar indiretamente, mas é um fator menos importante que a política de preços da Petrobras".

Ao comparar o valor nominal do botijão de gás de 13 kg antes, durante e depois da venda das refinarias na Bolívia (de 2005 a 2007), é possível concluir que não houve um aumento significativo, e sim um reajuste natural.

Em 2005, por exemplo, o preço final ao consumidor variou entre R$ 29,56 e R$ 30,18, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). No ano seguinte, o mínimo foi de R$ 30,38, com pico de R$ 33,17. O teto em 2007 foi mais baixo, na casa dos R$ 33,10.

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O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás) disponibiliza em seu site informações sobre a composição do preço médio do botijão de gás na atual década. As informações da página confirmam que, atualmente, a fatia determinada pela Petrobras -- cerca de 40% -- é a mais significativa do preço.

Estes são os fatores preponderantes no preço do botijão de gás, segundo o Sindigás:

  • Petrobras
  • Tributos
  • Margem bruta e custos de distribuição
  • Margem e custos de revenda

Embora a publicação de setembro de 2020 dê a entender que houve um grande salto recente no preço do gás, não há qualquer indício de reajustes significativos nos últimos anos. Entre 2019 e 2020, o aumento nominal foi de 1,63%. No ciclo anterior, houve queda de 0,35%. O último grande reajuste aconteceu em 2017, quando o preço médio registrou uma alta de quase 20% -- também puxada pela Petrobras.

O gás natural boliviano foi tema de outro boato que circulou nas redes sociais neste ano. Uma postagem viral atribuía ao governo de Jair Bolsonaro o suposto fim da importação do produto, com o Brasil autossuficiente no recurso. A informação é falsa, pois, apenas em 2020, o Brasil já importou 3,3 bilhões de quilogramas líquidos do gás boliviano.

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Este conteúdo também foi checado pela AFP Checamos.

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Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook  é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas:  apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

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