É falso que ex-senadora do PT defendeu aborto para evitar que crianças nasçam com sinusite

Discurso feito em 2017 por Regina Sousa era crítica à reforma trabalhista que permitia trabalho de gestantes em locais insalubres, mas foi tirado de contexto nas redes sociais

PUBLICIDADE

Foto do author Clarissa Pacheco

É falso que a ex-senadora Regina Sousa (PT-PI) tenha defendido o aborto para evitar que crianças nasçam com sinusite e rinite. Um trecho de apenas 20 segundos de uma fala da senadora durante uma sessão, no dia 11 de julho de 2017, foi usado em publicações na internet de forma distorcida. No vídeo, Regina diz que a grávida não pode “ficar nove meses na incerteza de como é que vai nascer essa criança, se vai ter alguma doença, se vai nascer com rinite, com sinusite”. Os posts que viralizaram nas redes afirmam que ela defendia o aborto. Na verdade, Regina Sousa falava sobre a reforma trabalhista.

 Foto: Reprodução

PUBLICIDADE

A fala completa da parlamentar está disponível nas notas taquigráficas da 103ª sessão deliberativa extraordinária do Senado Federal. O Senado votava a reforma trabalhista proposta pelo governo de Michel Temer (MDB), depois de ter sido aprovada na Câmara dos Deputados.

O trecho usado no vídeo desinformativo foi recortado do momento em que a senadora petista criticava a iminente aprovação do texto com um artigo que permitia que gestantes trabalhassem em locais insalubres com o argumento de que as mulheres o faziam porque queriam. Não há nenhuma menção a aborto na fala de Regina Sousa, nem em qualquer outro momento da sessão, que se encerrou às 22h20 daquele mesmo dia. Veja o vídeo original do discurso da senadora (a partir de 2h59m20s):

Trabalho insalubre para gestantes

Regina Sousa tinha sido mencionada na sessão outras vezes, mas tomou a palavra pela primeira vez pouco depois das 21h30. Às 21h36, ela iniciou uma crítica ao artigo 7º do texto que estava em votação porque havia entrelinhas que mexiam no aviso prévio que acabariam obrigando os trabalhadores a assinarem os chamados “acordo de demissão”. Em seguida, ela criticou que os senadores aprovassem um texto que obrigaria mulheres grávidas a trabalharem em locais insalubres por medo de perderem a gratificação:

“O que mais me impressiona também são os dois discursos. Um dia desses, na Comissão de Assuntos Sociais, eu vi senadores fazerem discursos em defesa dos trabalhadores na votação do projeto dos aeronautas – merecidamente, eles ficam fora dessa reforma e conseguiram um projeto de lei avançado. Eles fizeram uma defesa impressionante dos trabalhadores e aqui têm outra postura com os outros trabalhadores? Fazem dois discursos? Como é que pode? No dia da votação do Marco Legal da Primeira Infância, foram uns 80 discursos aqui, elogiando a proteção às crianças, e, agora, querem botar a mulher para trabalhar em local insalubre, porque elas querem?! Aqui vêm senadoras e deputadas dizerem que elas querem. Elas podem até querer por medo de perder a gratificação de insalubridade. Então, se os senhores patrões – há muitos aqui – são tão modernos, paguem a insalubridade enquanto a mulher estiver afastada do local insalubre durante a gravidez e no período da licença, até ela voltar ao trabalho no local insalubre. Paguem! Não são modernos? Podem perfeitamente pagar. Então, vamos deixar de demagogia de dois discursos, porque, se há alguém demagogo aqui, não somos nós. A grávida vai ficar nove meses na incerteza de como é que vai nascer essa criança, se vai ter alguma doença, se vai nascer com rinite, sinusite... [Pausa] Eu peço que os senadores respeitem. Eu vou parar de falar. Senador, recomponha meu tempo, porque é brincadeira senador dar gargalhada na hora em que a gente está falando. Por favor!”

Publicidade

Mesmo com o protesto da senadora sobre o trabalho de gestantes em locais insalubres, o texto aprovado naquela mesma sessão manteve o dispositivo. Foram 50 votos favoráveis, 26 contrários e uma abstenção. Três senadores estavam ausentes no momento da votação e um deles não votou – o senador Eunício Oliveira (MDB-CE), que presidiu a sessão. A senadora Regina Sousa e toda a bancada do PT no Senado votaram contra a proposta.

Esse mesmo conteúdo viralizou nas redes em 2017 logo após a fala da senadora justamente porque o vídeo compartilhado era um recorte de menos de um minuto de fala. Em 2018, o vídeo voltou a circular com a informação falsa de que Regina Sousa defendia o aborto na ocasião. Ela usou o Twitter para desmentir as alegações:

-----------------------------------------------------------------------------------------------------------

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.