Vídeo engana ao afirmar que petista vandalizou e mudou horário de relógio durante ataque no Planalto

Relógio de Balthazar Martinot, do século XVII, foi destruído por bolsonarista às 15h33 do dia 8 de janeiro; depois, outros apoiadores do ex-presidente tocaram na peça e tornaram a jogá-lo no chão, às 16h12

PUBLICIDADE

Foto do author Clarissa Pacheco

O que estão compartilhando: que um “cúmplice” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva alterou a hora do relógio de Balthazar Martinot, destruído nos ataques golpistas em Brasília no dia 8 de janeiro, para esconder que os atos de vandalismo tinham ocorrido antes da invasão dos bolsonaristas.

PUBLICIDADE

O Estadão investigou e concluiu que: é enganoso. O vídeo mostra um homem com roupa camuflada se aproximando do relógio de Balthazar Martinot, peça histórica trazida ao Brasil em 1808 por Dom João VI, e alterando o horário no visor do relógio. Antes de ele girar os ponteiros, o relógio de mais de 400 anos mostrava 12h35. Depois, passou a mostrar 15h50.

Mas, isso não prova que ele era um “cúmplice” de Lula, tampouco que os atos de vandalismo aconteceram às 12h35 – antes da invasão – ou que foram liderados pela “esquerda”. Na verdade, o relógio estava parado há anos. O homem ajusta os ponteiros para a mesma hora em que ele estava sendo filmado: por volta de 15h50. O horário exato aparece nas imagens do circuito interno do Planalto: 15h52. A câmera de segurança que filmou o objeto está localizada perto das escadas da ala oeste, no 3º andar do Palácio do Planalto

 Foto: Reprodução

Saiba mais: Em janeiro deste ano, o Estadão Verifica desmentiu um conteúdo parecido, que afirmava que o fato de o relógio mostrar um horário diferente quando foi destruído era prova de que já havia vândalos no Palácio do Planalto antes da invasão dos apoiadores de Jair Bolsonaro. Na ocasião, o arquiteto Rogério Carvalho, diretor de curadoria dos Palácios Presidenciais, afirmou que, na verdade, o relógio estava parado há muitos anos – quando o arquiteto teve o primeiro contato com a peça, no primeiro mandato de Lula [de 2007 a 2010], a máquina já não funcionava.

Publicidade

O homem que aparece nas imagens girando os ponteiros do relógio de Balthazar Martinot não é o único a ter contato com a peça histórica, nem o primeiro a mexer nela. Quando ele altera o horário do relógio para 15h50, a câmera de segurança que registra o ato marca 15h52 do dia 8 de janeiro de 2023, cerca de 1 hora após a invasão dos golpistas às sedes dos Três Poderes.

Antes dele, várias pessoas tiveram algum tipo de contato com o objeto. O primeiro é um homem que usa uma camisa preta com uma ilustração de Jair Bolsonaro e as palavras “Bolsonaro Presidente”. Ele lança o relógio ao chão às 15h33 e, em seguida, tenta destruir a câmera de segurança do local. Ele foi identificado como Antônio Cláudio Alves Ferreira, morador de Catalão (GO), e foi preso em Uberlândia (MG) no dia 23 de janeiro. A imprensa goiana informou que o homem atuava em acampamentos bolsonaristas.

Às 15h33, homem se aproxima sozinho de relógio do século XVII e o joga ao chão; depois, tenta destruir câmera de segurança Foto: Reprodução
Homem que jogou o relógio ao chão pela primeira vez usava caminha preta com rosto e nome de Jair Bolsonaro Foto: Reprodução

Dez minutos depois, às 15h43, um grupo de seis pessoas usando roupas verdes, amarelas, azuis, além de bandeiras do Brasil, recoloca o relógio sobre o armário onde ele estava originalmente, antes do primeiro ataque.

Grupo de seis pessoas usando roupas nas cores da bandeira do Brasil recolocam relógio no lugar após ele ser lançado ao chão pela primeira vez Foto: Reprodução

Às 15h46, um homem com camisa amarela se aproxima da peça, abre e fecha a porta do armário, mas não toca no relógio, apesar de fotografá-lo.

Publicidade

Homem usando camisa amarela abre porta de armário, depois de relógio ter sido jogado ao chão e recolocado no lugar Foto: Reprodução

Em seguida, o homem que altera o horário no relógio se aproxima. São 15h52 quando ele retira um aparelho celular do bolso, parece conferir as horas e, em seguida, abre a tampa que protege os ponteiros e altera o horário para 15h50.

Às 15h50, homem com roupa camuflada se aproxima de relógio e ajusta horário para o mesmo em que ele realiza o ato; câmera de segurança marca 15h52 Foto: Reprodução

Vinte minutos depois, às 16h12, um homem usando chapéu camuflado, camisa amarela e envolto em uma bandeira do Brasil lança de novo o elogio ao chão. É possível perceber que o relógio continua a marcar o mesmo horário desde a alteração: 15h50.

Vinte minutos depois de ponteiros terem sido alterados, homem lança relógio ao chão de novo; máquina continua a marcar mesmo horário Foto: Reprodução

O Estadão Verifica não encontrou registros oficiais que identifiquem o homem que altera os ponteiros do relógio, mas ele aparece em outras imagens do mesmo dia, vandalizando outros pontos do Palácio do Planalto:

Homem que alterou horário de relógio usa óculos escuros com haste metálica, roupa inteira camuflada e cinto azul; ele aparece em outras imagens causando destruição Foto: Reprodução
Mesmo homem que girou ponteiros de relógio aparece em fotografias vandalizando uma sala no Palácio do Planalto. REUTERS/Adriano Machado 

Como lidar com postagens do tipo: Publicações que tentam culpar o governo pelos atos de 8 de janeiro e imputar os atos de vandalismo a infiltrados da esquerda são comuns, mas as narrativas foram sendo desmentidas ao longo do tempo. Não há investigação policial que aponte que havia infiltrados no local, além de os atos terem sido premeditados e organizados por bolsonaristas, que chegaram a publicar convocações nas redes sociais.

Publicidade

O Estadão Verifica mostrou como boatos desinformavam sobre o horários dos atos golpistas para tentar convencer as pessoas de que havia petistas nos prédios da Praça dos Três Poderes antes do início da depredação.

Bolsonaristas também já espalharam fotos de presos em El Salvador como se fossem infiltrados nos atos antidemocráticos e até usaram a imagem de uma bandeira do PT furtada no Congresso por um golpista como suposta prova de que os atos foram comandado pelo partido do presidente Lula.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.