Não é verdade que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha afirmado que o Partido dos Trabalhadores (PT) precisa estimular "a negação da política" e que defenda "fascismo, nazismo, qualquer outra coisa menos democracia". As declarações estão em vídeo editado que circula desde 2017 na internet e voltou a gerar engajamento no Facebook nas duas semanas recentes.
O conteúdo original utilizado para distorcer as declarações é de uma transmissão ao vivo feita na página oficial de Lula no Facebook, em 22 de setembro de 2017. Trata-se de um evento de lançamento da campanha de filiação ao PT em São Paulo. O vídeo original tem 44 minutos, com cerca de 20 minutos de discurso do ex-presidente. Já o vídeo manipulado tem três minutos e 32 segundos.
Já nas primeiras frases é possível notar a edição de imagens e áudio para gerar interpretações equivocadas. O vídeo manipulado começa com a suposta declaração de Lula: "Eu penso que as pessoas devem se filiar ao PT, primeiro, porque o PT precisa convencer as pessoas [vídeo é cortado] a negação da política". E continua: "Fascismo, nazismo, qualquer outra coisa menos democracia."
No discurso original, Lula diz o oposto. "Eu penso que as pessoas devem se filiar ao PT, primeiro, porque o PT precisa convencer as pessoas de que não existe saída para o Brasil e para qualquer país do mundo fora da política. Ou seja, o PT precisa ser um partido que enfrente essa discussão, contra a negação da política. Fora da política nós teremos fascismo, nazismo, qualquer outra coisa menos democracia", disse Lula.
É possível reparar os cortes no vídeo a partir do posicionamento do ex-presidente em frente à câmera. Frequentemente, Lula muda de lugar rapidamente e seus gestos são interrompidos. Além disso, vários trechos são utilizados mais de uma vez, como nessa passagem: "Nós podemos, na campanha, utilizar [corte] aquela menina que ficou famosa [corte] a Ana Júlia [corte] somente em época de eleição. A gente tem que estar sistematicamente discutindo política cultural [corte] somente em época de eleição". O sentido original dessas frases também é distorcido.
A publicação falsa mais recente é de 13 de setembro e conta com mais de 4,6 milhões de visualizações no Facebook. O título é "O vídeo que Palocci gravou sem Lula saber", legenda usada desde o primeiro compartilhamento encontrado pelo Estadão Verifica a partir da busca reversa de imagens no Google, de 18 de outubro de 2017. Outro aspecto comum em postagens é a afirmação de que o conteúdo estaria sendo guardado "a sete chaves" pelo partido.
O nome de Antonio Palocci, ex-ministro de Lula e Dilma Rousseff, aparece nas publicações como tentativa de aumentar a veracidade do relato. Em 6 de setembro daquele ano, Palocci havia prestado depoimento ao então juiz federal Sérgio Moro e acusado Lula e o PT de terem firmado "pacto de sangue" com a empreiteira Odebrecht. Condenado a 12 anos de prisão por Moro ainda em 2017, Palocci passou a cumprir pena em regime domiciliar após fechar acordo de delação premiada em novembro de 2018.
O vídeo manipulado tornou-se relevante novamente durante o período eleitoral de 2018. Lula foi anunciado como candidato à Presidência da República pelo PT, mas teve candidatura impugnada com base na Lei da Ficha Limpa, considerando a condenação em segunda instância na Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro no caso tríplex de Guarujá.
O Projeto Comprova e o Fato ou Fake já haviam checado esse conteúdo, selecionado para checagem por meio da parceria entre Estadão Verifica e Facebook. Para sugerir verificações, envie uma mensagem para (11) 99263-7900.
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