Conteúdo investigado: Vídeo de uma entrevista do presidente da Rússia, Vladimir Putin, em que ele faz críticas ao presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após encontro entre o petista e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, na Assembleia Geral da ONU.
Onde foi publicado: TikTok e X.
Conclusão do Comprova: É falso que Vladimir Putin tenha criticado Lula durante entrevista a uma emissora de TV por conta do encontro no dia 20 de setembro de 2023 entre o presidente brasileiro e Volodymyr Zelensky.
Um vídeo com uma narração em português que viralizou nas redes sociais mostra, na verdade, uma entrevista de Putin à emissora norte-americana CNBC em 13 de outubro de 2021, quase dois anos antes do encontro entre Lula e Zelensky. Putin não menciona nenhum dos dois presidentes em qualquer trecho da entrevista, que dura pouco mais de 20 minutos.
Os presidentes do Brasil e da Ucrânia se reuniram em 20 de setembro de 2023, durante a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, nos Estados Unidos. O Comprova não localizou qualquer registro na imprensa sobre supostas críticas de Putin ao encontro entre os dois.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Apenas uma publicação do conteúdo no TikTok tinha alcançado 854,9 mil visualizações até 25 de setembro de 2023. Outro post, no X (ex-Twitter) acumulava 30,6 mil visualizações até a mesma data.
Como verificamos: O primeiro passo foi tentar localizar o vídeo original por meio da busca reversa de imagens. Para isso, fizemos a busca utilizando um dos frames do vídeo, o que levou à publicação original no canal do YouTube da emissora de TV norte-americana CNBC, cuja logomarca aparece no microfone sustentado pela repórter durante a entrevista. O vídeo foi publicado no canal em 18 de outubro de 2021.
Em seguida, fizemos buscas pelos termos “interview”, “Vladimir Putin”, “CNBC” e “2021″ no Google, o que levou a quatro publicações no site da emissora: o vídeo completo da entrevista, uma matéria feita com base nas declarações sobre criptomoedas, outra sobre energia e geopolítica e, por fim, a transcrição original da entrevista.
Por último, o Comprova buscou por eventuais publicações na imprensa profissional sobre declarações de Vladimir Putin criticando o encontro entre Lula e Zelensky.
Entrevista com Putin é de outubro de 2021
Diferentemente do que afirma a narração em português, a entrevista de Vladimir Putin usada nos vídeos virais não foi concedida após o encontro entre Lula e Zelensky, que ocorreu em 20 de setembro deste ano. Os conteúdos desinformativos usam as imagens de uma entrevista do presidente feita em 13 de outubro de 2021 na Rússia.
Pouco antes de falar com exclusividade com a CNBC Internacional, Putin havia discursado na abertura do Fórum Internacional da Semana da Energia Russa 2021, que aconteceu na capital, Moscou.
Putin não citou Lula ou Zelensky
Na entrevista concedida em russo à jornalista Hadley Gamble, Putin falou sobre energia e economia, além de política externa, e não mencionou em nenhum momento o então ex-presidente do Brasil, Lula, nem o já presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. A CNBC publicou uma transcrição oficial da entrevista, que contou com a ajuda de um intérprete, e o presidente russo também não mencionou o Brasil ou a Ucrânia.
Primeiramente, a repórter perguntou sobre planos de sucessão do governo russo, e se ele gostaria mesmo de ser presidente aos 84 anos – Putin disse que não responderia a perguntas como aquela. Ela, então, passou a fazer perguntas sobre política externa: mencionou a Arábia Saudita, os Estados Unidos e as relações com esses países do ponto de vista da produção de energia.
Gamble também perguntou a Putin sobre o uso de criptomoedas no mercado de petróleo, sobre um afastamento da Rússia com relação ao uso do dólar americano e sobre o uso da moeda dos Estados Unidos como reserva mundial. Por fim, ela o questionou sobre as relações com a China e sobre a prisão do advogado e ativista Alexei Navalny, opositor de Putin preso no início de 2021, acusado de terrorismo. Em nenhuma das respostas da entrevista, Putin cita o Brasil ou a Ucrânia.
O Comprova não localizou nenhuma entrevista ou publicação na imprensa profissional sobre eventuais críticas de Putin a Lula após encontro com Zelensky, na Assembleia Geral da ONU.
O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível contatar o perfil responsável pela publicação no TikTok porque não há possibilidade de enviar mensagens entre usuários que não se seguem mutuamente. Já o vídeo publicado no X foi retirado do mesmo perfil que publicou o conteúdo no TikTok.
O que podemos aprender com esta verificação: A publicação de vídeos em outros idiomas, com supostas traduções para o português, tem um grande potencial para enganar, principalmente quando o idioma falado no conteúdo original não é dominado por muitas pessoas, como é o caso do russo. Nesses casos, desinformadores se aproveitam para criar narrações inverídicas que se encaixem em uma situação sobre a qual queiram desinformar.
Ao encontrar conteúdos assim, é importante buscar elementos que ajudem a identificar onde e quando o vídeo foi feito. Deste modo, pode-se chegar ao conteúdo original, com tradução, como foi o caso no vídeo aqui investigado.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já checou outros conteúdos sobre relações da Rússia com o Brasil: no ano passado, mostrou que era falso que Holanda, Índia e Rússia tinham oferecido apoio militar a Bolsonaro; no mês passado, mostrou que um homem que pedia divisão do Brasil não era membro da Otan.
O vídeo aqui investigado também foi checado pela agência Aos Fatos e pelo UOL.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.