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Análise|A incerteza na Colômbia está derrubando os investimentos e mais

A instabilidade econômica e política pode significar problemas para o crescimento. No entanto, o governo tem uma nova oportunidade de colocar o país de volta aos trilhos.

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Por Luis Fernando Mejía*

BOGOTÁ — O crescimento do PIB da Colômbia despencou no ano passado, caindo para apenas 0,6%, depois de registrar alta de 7,3% em 2022. Este rápido declínio na expansão econômica era amplamente esperado, mas a extensão da contração do investimento fixo do país foi surpreendente, caindo para o nível mais baixo desde 2005. Dezenove anos depois, com um governo em apuros, os colombianos esperam um retorno do elevado crescimento e da redução do desemprego. Será que vão consegui-lo?

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O aumento das taxas de juros e uma tributação corporativa que está entre as mais altas do mundo ajudam a explicar a queda maciça do investimento fixo – um declínio de 9% em termos reais que representa apenas 17,8% do PIB do país – mas são apenas parte da história. O aumento da incerteza econômica e política também desempenhou um papel significativo, uma vez que o presidente Gustavo Petro enfrenta um momento crucial no seu mandato de quatro anos para conseguir que pelo menos algumas das suas principais reformas sejam aprovadas pelo Congresso.

Para as dúvidas crescentes decorrentes das longas discussões a respeito das reformas estruturais, o governo alimentou mais incertezas ao anunciar medidas controversas em setores econômicos estratégicos, ao mesmo tempo que lançava a ideia de uma nova Constituição. Tudo isso está se somando para afetar tanto o investimento como as perspectivas de crescimento da Colômbia. Em 2 de maio, a OCDE instou as autoridades a aplicarem políticas para dar vida nova ao investimento, ao mesmo tempo que previa uma decepcionante expansão do PIB de 1,2% para 2024.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, discursa em uma marcha pelo Dia Internacional dos Trabalhadores, em Bogotá, Colômbia  Foto: Fernando Vergara/AP

Reformas pendentes

O governo de Petro investiu – e esgotou – seu capital político em três ambiciosas reformas estruturais. A reforma da saúde tem enfrentado forte oposição técnica e política, ao tentar implementar um modelo completamente novo. Embora o Congresso tenha rejeitado recentemente a proposta, o governo pretende apresentar uma versão mais concisa, embora com os mesmos objetivos. Consequentemente, o investimento no setor da saúde permanece praticamente estagnado, aguardando o fim desta indefinição.

Uma reforma do mercado de trabalho visa proteger os trabalhadores formais – uma minoria – aumentando o custo do emprego formal. Segundo nossos cálculos do Fedesarrollo, a reforma deverá eliminar cerca de 400 mil empregos formais, e não resolverá as questões mais prementes do mercado de trabalho do país: alto desemprego e elevada informalidade. Na verdade, a reforma provavelmente agravará ambos os problemas. A incerteza que rodeia esta reforma altamente contestada e inoportuna afasta ainda mais o investimento.

Finalmente, a reforma das pensões tenta resolver muitos dos problemas do atual sistema de pensões da Colômbia, que cobre apenas 25% dos idosos e direciona 54% dos subsídios de pensões públicos para os 20% de renda mais alta – os 20% mais pobres recebem apenas 5%. Há um debate contínuo sobre a dimensão do pilar público e o fato de a reforma não ajustar parâmetros básicos como a idade dos pensionistas e a taxa de substituição. Além disso, as disposições para as mulheres, que poderiam obter uma pensão com apenas 850 semanas em vez do padrão exigido de 1.300 semanas de contribuições para as pensões, poderão tornar a reforma significativamente mais dispendiosa, colocando pressão adicional sobre o limitado espaço fiscal de que o governo dispõe. Apesar destas preocupações, o Senado aprovou recentemente a reforma e é provável que seja aprovada na Câmara dos Deputados.

Apoiadores do presidente colombiano Gustavo Petro erguem cartaz em favor da confecção de uma nova Constituição na Colômbia  Foto: Joaquin Sarmiento/AFP

Medidas governamentais

O governo Petro contribuiu para a incerteza com anúncios e medidas que impactaram negativamente pelo menos três setores-chave: petróleo e gás, mineração e infraestrutura. Os setores do petróleo e do gás e da mineração suportaram o peso da reforma fiscal de 2022, representando mais de 50% das novas receitas fiscais estimadas (cerca de 1% do PIB por ano). O governo não permitiu novos contratos para a exploração de petróleo e gás, e Petro comparou desfavoravelmente o petróleo e o carbono à cocaína, enviando um sinal desanimador aos potenciais investidores.

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No que diz respeito à infraestrutura, o governo decidiu no ano passado não aumentar os pedágios rodoviários para compensar a inflação, embora tais ajustes sejam explicitamente previstos em contratos público-privados. A renúncia à cláusula custou financeiramente ao governo, uma vez que deve agora cobrir a perda de rendimentos dos empreiteiros privados. O custo para a reputação é maior: esta violação unilateral mina a confiança dos investidores atuais e futuros no governo e a sua vontade de honrar as suas obrigações contratuais. Embora o governo Petro tenha discutido o avanço de uma nova rodada de parcerias público-privadas, os chamados projetos “5G”, as perspectivas parecem sombrias no clima atual.

O presidente Petro anunciou a intenção do governo de rever a Constituição de 1991, supostamente para garantir que sejam cumpridos os seus principais objetivos. Embora a maioria dos analistas políticos acredite que esta proposta já morreu, a mera discussão da elaboração de uma nova Constituição sugere que existe uma pequena, mas real, possibilidade de um novo conjunto de regras para investidores privados. Isto representa outra barreira potencial ao crescimento do investimento.

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, participa da Feira Internacional do Livro ao lado do presidente da Colômbia, Gustavo Petro, em Bogotá, Colômbia  Foto: Fernando Vergara/AP

Implicações para o crescimento

O Fedesarrollo desenvolveu vários cenários para prever o crescimento potencial da produção da Colômbia sob taxas variáveis de investimento a longo prazo. O nosso cenário pessimista pressupõe que a taxa de investimento fixa permaneça nos atuais 17,8% do PIB, o que resultaria numa taxa de crescimento a longo prazo de aproximadamente 2,3%. O cenário médio pressupõe uma recuperação dos investimentos em petróleo e gás e em infraestrutura, aumentando a taxa de investimento para 19,6% do PIB e aumentando a taxa de crescimento de longo prazo para 2,9%. O cenário otimista prevê que a taxa de investimento suba para 23,1%, semelhante às taxas máximas observadas no início deste século, elevando potencialmente a taxa de crescimento a longo prazo da Colômbia para 4%.

Acelerar a taxa de crescimento a longo prazo de 2,3% para 4% faria com que os rendimentos duplicassem aproximadamente a cada 17 anos, em comparação com cada 30 anos. Isto reduziria quase pela metade o tempo que a Colômbia levaria para alcançar o status de renda alta. A aceleração econômica seria traduzida na criação mais rápida de empregos, na melhoria dos serviços públicos e em uma redução mais rápida das taxas de pobreza e de pobreza extrema. Estas melhorias são fundamentais para o bem-estar da população da Colômbia.

O que vem a seguir

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Embora o governo tenha demonstrado responsabilidade fiscal – sobretudo ao eliminar os dispendiosos subsídios à gasolina com um aumento de preços de mais de 60% e ao aderir à regra fiscal – estas ações por si só não são suficientes para garantir um crescimento econômico sustentável. Um anúncio recente do governo quanto ao relaxamento da regra fiscal é desnecessário e contraproducente.

O crescimento a longo prazo depende não só do cumprimento das metas fiscais, mas também da manutenção de um ambiente estável de regulação. Os investidores geralmente estão dispostos a assumir o risco, mas evitam a incerteza. Após 20 meses no cargo, o legado de Petro em termos de crescimento e emprego está em jogo, e o governo ainda tem a oportunidade de conduzir a economia e o país como um todo de volta ao caminho certo./TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Análise por Luis Fernando Mejía*

Americas Quarterly-*Mejía é diretor executivo do Fedesarrollo, um dos centros de estudos estratégicos mais reconhecidos da América Latina. Foi vice-ministro e ministro do planejamento da Colômbia de 2014 a 2018.

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