THE WASHINGTON POST - Em uma cidade ucraniana duramente atingida pela invasão da Rússia, cinco músicos chegam com seus instrumentos ao subsolo – tentando abafar explosões estrondosas com seus violinos, violoncelo e baixo para aqueles que se abrigam no metrô.
A invasão russa da Ucrânia interrompeu os planos para o Kharkiv Music Fest, um festival internacional anual de música clássica tradicionalmente realizado na segunda maior cidade da Ucrânia. Os organizadores decidiram, então, improvisar em meio à guerra – migrando as apresentações para uma estação de metrô e o porão de uma empresa, em busca de segurança em relação aos ataques aéreos.
“A música pode unir”, disse o diretor de arte do festival, Vitali Alekseenok. “É importante agora que aqueles que ficaram em Kharkiv estejam unidos.”
O concerto original incluiria um recital do pianista francês Lucas Debargue e seria realizado no grande salão da Filarmônica de Kharkiv no sábado.
Em vez disso, o “concerto entre explosões” – como ele vem sendo chamado nas mídias sociais – começou com o hino nacional ucraniano, levando os membros da plateia a colocar as mãos sobre o coração.
Bach e Dvorak contra as bombas
O programa incluiu a música de Bach, Dvorak e outros compositores, bem como arranjos de canções folclóricas ucranianas. Centenas de pessoas de todas as idades assistiram ao show, às vezes abraçados.
O programa foi adaptado para destacar as conexões entre a cultura ucraniana e a cultura da Europa Ocidental, disse Alekseenok.
A professora de música e violinista Olha Pyshchyta disse ao jornal The Washington Post no domingo que se apresentar no metrô despertou uma série de emoções, após um mês de guerra.
Ela disse que estava com raiva – e cansada – “Mas no show, sentimos união”. “Eu, como todos os ucranianos, estou esperando a vitória”, acrescentou.
O violinista Stanislav Kucherenko disse ao Post que o concerto foi diferente de qualquer outro que ele já havia tocado. “Não havia emoção no palco que geralmente acontece quando se apresenta para as pessoas”, disse ele, mas “eu sabia que estava onde deveria estar”.
Kucherenko disse que a música tem uma “forte influência no estado psicoemocional de uma pessoa” e pode, “em condições de guerra”, ajudar as pessoas a lidar com o medo e o estresse e inspirar “fé e otimismo”.
Sergiy Politutchy, diretor do Kharkiv Music Fest, disse à Sky News que o show mostrou que “em meio à escuridão, existem valores eternos e um futuro para nosso país”.
O concerto foi um dos poucos eventos musicais de Kharkiv desde a invasão russa.
Antes da guerra, Kharkiv era conhecida como a capital intelectual da Ucrânia. Com mais de 30 universidades, transbordava de estudantes e era um conhecido centro científico e cultural. Mas ataques de mísseis devastaram suas joias arquitetônicas do século 19; cerca de metade da população,700 mil pessoas, fugiu, de acordo com a administração regional, e aqueles que ficaram regularmente procuram abrigo subterrâneo contra ataques aéreos.
Na semana passada, o violoncelista ucraniano Denys Karachevtsev chamou a atenção global ao tocar uma melodia sombria de Bach nas ruas de Kharkiv, cercado por janelas quebradas, prédios bombardeados e escombros.
Voluntários contra a guerra
Trabalhando como voluntário no esforço de guerra durante o dia, auxiliando na retirada de civis e distribuindo ajuda humanitária, Karachevtsev, de 30 anos, disse ao Post que decidiu ficar na cidade apesar do pesado bombardeio para apoiar as pessoas de sua cidade natal e elevar seu ânimo. Ele disse que a música encorajou as pessoas a “continuar lutando”.No mês passado, quando as tropas russas se aproximavam de Kharkiv e as pessoas tentavam fugir, um menino sentou-se em um piano branco brilhante no saguão de um hotel e começou a tocar.
Um vídeo dele, gravado por um correspondente do Post, se tornou viral, atraindo a atenção do mundo e dos compositores Philip Glass e Paul Leonard-Morgan, que disseram que nunca imaginaram que sua música se tornaria a trilha sonora evocativa de uma guerra.
Em outro lugar, um vídeo de uma menina ucraniana de 7 anos, Amelia Anisovych, cantando Let It Go, do filme Frozen, dentro de um abrigo antiaéreo em Kiev a catapultou para a fama.
Como milhões de outros, ela fugiu para a Polônia. Amelia cantou o hino nacional da Ucrânia em um evento este mês para arrecadar fundos para aqueles que fogem da guerra.
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