O que se sabe sobre acidente de trem que gerou nuvem tóxica e retirada de moradores nos EUA

Produtos são ‘uma sopa tóxica’, segundo especialistas, e moradores relatam sintomas

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Por Nick Keppler, Anna Phillips e Justine McDaniel

A Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) afirmou nesta terça-feira, 14, que o trem com produtos tóxicos que descarrilou Ohio no dia 3 tinha mais produtos do que o divulgado no início. A afirmação aumenta ainda mais a preocupação dos moradores da região, que buscam respostas sobre o risco de estarem expostos a toxina. Apesar disso, a agência garantiu que não detectou nenhum nível perigoso de toxinas na área.

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Após o acidente, ocorrido na cidade da Palestina do Leste, nos limites de Ohio com a Pensilvânia, as autoridades determinaram que os moradores das proximidades se retirassem para evitar contaminação causada pelos produtos. A preocupação crescente levou mesmo os moradores de áreas que não receberam a ordem para sair de casa a se perguntar se deveriam deixá-las.

O odor tóxico ainda está presente na Palestina do Leste e é insuportável para os moradores. A lista de produtos carregados pelo trem só foi divulgada depois de uma semana de perguntas. No domingo, a EPA publicou a lista da Norfolk Southern com os produtos químicos derramados e quais vagões foram danificados. Havia 20 vagões com materiais perigosos, dos quais 10 descarrilaram, segundo o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes.

Coluna de fumaça sobre Palestina do Leste, em Ohio, após liberação e uma explosão controlada de produtos químicos de trem descarrilado, em imagem do dia 6 Foto: Gene J. Puskar/AP

Ainda não se sabe se os produtos químicos continuam a ser liberados no local do acidente. Os odores continuam após mais de uma semana, e moradores relatam dores de cabeça, ardor nos olhos e outras queixas.

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Os destroços do trem ainda não foram completamente retirados e, conforme checou a reportagem do The Washington Post, os trabalhadores realizam o trabalho de botas e capacetes, mas sem máscaras e outros equipamentos de proteção.

O solo onde o trem descarrilou está revestido de um pó branco e os trens continuam passando sobre os trilhos. Há relatos de moradores que registram peixes mortos de um lago na região e que não se sentem seguros em beber água da torneira.

Uma ‘sopa’ química

Quando o trem descarrilou, no dia 3, investigadores federais e especialistas em segurança química se concentraram imediatamente no cloreto de vinila, um gás tóxico altamente inflamável que estava distribuído em cinco vagões. Com medo de que eles explodissem e enviassem estilhaços para os bairros vizinhos, as autoridades decidiram liberar e queimar o material – o que acabou enviando gases perigosos, como cloreto de hidrogênio e fosgênio, para o ar.

A EPA informou mais tarde que, além do cloreto de vinila, o trem transportava outros produtos químicos, incluindo éter monobutílico de etilenoglicol, acrilato de etilhexil, isobutileno e acrilato de butila. Os vagões que carregavam acrilato de etilhexil e acrilato de butila foram danificados no acidente e parte desses produtos químicos foi perdida.

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Trem da Norfolk Southern na rota da Palestina do Leste, em imagem desta terça-feira, 14. Empresa é responsável pelo trem de carga que descarrilou no último dia 3 Foto: Angelo Merendino/via AFP

Segundo o porta-voz da EPA em Ohio, James Lee, os materiais que mais foram liberados no acidente foi o cloreto de vinila e acrilato de butila. As agências governamentais e a ferrovia não detalharam a quantidade de produtos químicos liberados no ar e derramado no solo.

Segundo especialistas, enquanto esses produtos estiverem sendo emitidos, o ar não é seguro para respirar. “Quanto desses produtos estava lá? Quantos galões foram?”, questionou a epidemiologista ambiental Lynn Goldman, reitora de saúde pública da Universidade George Washington.

Os sintomas relatados por moradores são consistentes com o que alguns dos produtos químicos podem causar. “Eu não gostaria de ser exposto a nenhum deles em quantidades significativas”, disse Erik Olson, diretor estratégico do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais, um grupo de defesa ambiental. “Todos eles representam perigos se inalados.”

A EPA disse que nenhum nível preocupante de toxinas foi detectado no ar, embora alguns especialistas questionem as medições iniciais e defendem que testes mais robustos deveriam ser feitos. A agência disse que forneceu dados aos órgãos de saúde antes de autorizar os residentes retirados a voltarem para casa.

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Especialistas afirmam que após um incêndio ou liberação química de um produto, o ar fica limpo e a preocupação principal com a contaminação muda para o que pode ter entrado no solo. Entretanto, os moradores ainda sentem odores e o mal-estar permanece. “O que é realmente importante é que os funcionários do governo estejam monitorando os níveis para garantir que estejam seguros”, disse Goldman.

Segundo a Agência de Substâncias Tóxicas e Registros de Doença, o éter monobutilíco de etilenoglicol, um líquido combustível usado comercialmente como solvente em lacas de spray e tinta, pode irritar os olhos e o nariz e causar dores de cabeça e vômitos em pessoas expostas a ele em altos níveis.

Os outros três produtos liberados (dois deles químicos e um gás inflamável) também são conhecidos por causar dores de cabeça, náuseas e problemas respiratórios.

A exposição a grandes quantidades dos outros três produtos químicos, dois deles líquidos e um, o isobutileno, um gás inflamável, também é conhecida por causar dores de cabeça, náuseas e problemas respiratórios.

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“A coisa toda era um pouco de sopa tóxica”, disse David Masur, diretor executivo do grupo de defesa PennEnvironment. “Parece um pouco como um filme de ficção científica quando você é informado de que um dos subprodutos que estão sendo lançados é um agente que usamos contra nossos inimigos na 1ª Guerra”, acrescentou, referindo-se ao fosgênio.

EPA realiza testes de toxinas em residências

A EPA informou que cerca de 450 pessoas da região afetada pelo acidente solicitaram testes em casa para examinar os níveis de toxina no ar. Até a noite desta segunda-feira, 13, a agência disse ter feito os testes em 291 residências. Nenhuma detecção de cloreto de vinila ou cloreto de hidrogênio foi relatada. Outras 181 casas ainda precisavam ser examinadas. Os testes estão restritos às casas que realizaram solicitação.

Organizações ambientais afirmam que a empresa responsável pelo trem deveria fazer mais, como criar um fundo para os moradores. A empresa, Norfolk Southern, disse na segunda-feira que estuda essa proposta.

Em ações coletivas, os moradores pediram à empresa que ela forneça acompanhamento médico às pessoas afetadas. A Norfolk Southern disse na segunda-feira que pagou mais de US$ 1 milhão (R$ 5,1 milhões) aos moradores em “reembolsos e adiantamentos em dinheiro” para hospedagem e outras despesas e está “no processo de entrar em contato e se reunir com as empresas locais afetadas”. A empresa também doou dinheiro para a Cruz Vermelha de Ohio e para o corpo de bombeiros local.

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As ordens de retirada dos residentes da Palestina do Leste foram suspensas na semana passada, antes que a contabilidade total do que o trem estava puxando tivesse sido liberada.

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