Alcançar a paz completa na Colômbia, como promete o presidente Gustavo Petro, passa diretamente por um acordo com a última guerrilha em ação na América Latina: o Exército de Libertação Nacional (ELN). Para avançar nos diálogos com a guerrilha, o governo tenta firmar um cessar-fogo bilateral com um grupo que mantém sua cúpula inabalada, mas, ao mesmo tempo, possui uma estrutura federativa com frentes militares independentes.
Segundo analistas, apenas uma trégua bilateral trará a confiança necessária para avançar na negociação. “Avançar de maneira segura e efetiva em um diálogo com o ELN é o passo mais estratégico na busca pela paz total, poderia arrastar o resto dos grupos à margem da lei. Com certeza, será a negociação mais complexa, mas com mais possibilidades de futuro”, afirma o general aposentado Juan Carlos Buitrago Arias, autor do livro “Os princípios não se negociam”, sobre as máfias na Colômbia.
A guerrilha e o governo retomaram as negociações de paz em novembro e um cessar-fogo bilateral havia sido anunciado em dezembro, mas foi suspenso pelo governo na semana passada, após o ELN afirmar desconhecer tal acordo. Para a guerrilha, tal decisão deve resultar da mesa de diálogos que este ano ocorrerá no México, tendo Cuba, Venezuela e Noruega como países garantidores.
“Para muitos analistas, o não querer acordar um cessar-fogo é um indício por parte do ELN de que não há vontade real. No entanto, é preciso lembrar que uma parte das negociações de paz entre o então governo de Juan Manuel Santos e as Farc ocorreu durante períodos de cessar-fogo e outra parte não”, diz a analista política Silvana Amaya.
Em dezembro, o ELN havia anunciado uma trégua unilateral para o Natal e as festas de fim de ano e pediu que o governo atuasse em consonância com seu desejo de paz. Nesse contexto, Bogotá avaliou, segundo o ministro do Interior, Alfonso Prada, que seria possível ter um cessar-fogo bilateral e o decretou.
Agora, Petro pede que o ELN volte a uma trégua e os dois lados possam, enfim, negociar o cessar-fogo durante as conversas de paz. Pablo Beltrán, o principal negociador da guerrilha, afirmou que o assunto poderia ser discutido “no próximo ciclo” de negociações que deve ocorrer ainda no começo deste ano.
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Outros grupos
Atualmente, um cessar-fogo bilateral está em vigor com outros grupos criminosos, com os quais o governo também pretende chegar a um acordo de paz: Segunda Marquetalia, Autodefensas de la Sierra Nevada, Estado Mayor (uma das dissidências das Farc) e Clan del Golfo.
Nesse sentido, o governo anunciou a criação de um grupo de Alto Nível para classificar e caracterizar organizações criminosas “de alto impacto” que desejam fazer parte do plano de Paz Total. O grupo deverá estudar tais grupos, conversar e classificar se têm vertentes políticas e como devem integrar o processo de paz.
A promessa de campanha de Petro que se tornou uma meta de governo é considerada um desafio dentro do período de quatro anos de mandato justamente pela complexidade de firmar acordos com grupos de diferentes características. “Levar adiante diferentes processos de paz com diversos grupos de forma simultânea aumenta a complexidade (da meta de paz total) e reduz a margem de manobra de Petro”, afirma Silvana Amaya.
ELN X Farc
As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) deixaram as armas em 2017 após o acordo de paz fechado no ano anterior e entraram para a vida política colombiana, como pediam. Após quatro anos de governo do presidente Iván Duque - que suspendeu as negociações com o ELN em 2019 - a eleição de Petro trouxe de volta o tema da paz.
A chegada de um presidente de esquerda - o primeiro da história do país - é um dos principais motivos que levaram o ELN de volta à mesa de diálogos, não apenas pelo fato de essa ser uma promessa do novo líder. O ELN é uma guerrilha guevarista que, à princípio, não almeja se tornar um grupo político, mas sempre pediu que ideias de esquerda tivessem um lugar de destaque na política da Colômbia, o que começa a acontecer.
Essa diferença entre as duas principais guerrilhas colombianas vem desde a origem dos dois grupos. “As Farc são de origem camponesa, o ELN foi criado por estudantes de ideologia comunista, quer mudar a sociedade colombiana e busca alcançar uma verdadeira revolução social mais além de uma participação política”, explica Silvana Amaya.
O ELN pegou em armas em 1964, tem um comando central, mas, diferente das Farc, suas frentes são autônomas no campo militar e se trata de uma estrutura federativa. Esse aspecto torna a negociação com esse grupo mais complexa. “O comando e controle do Comando Central do ELN sobre as estruturas que atuam na Colômbia e na fronteira não são suficientemente fortes. Isso ocorreu na negociação passada, não houve poder humano que forçasse a incorporação de chefes do grupo ao diálogo. Hoje ocorre o mesmo”, avalia o general Buitrago.
Com cerca de 2.500 combatentes e uma ampla rede de colaboradores, o ELN está presente em 20% dos municípios da Colômbia e em regiões fronteiriças com a Venezuela e o Equador.
As Farc, quando começaram a negociar, haviam sofrido diversos golpes estratégicos e perdido muita força militar. Isso não ocorre com o ELN, que mantém a cúpula intacta.
“Outra grande diferença é que o processo de diálogo com o ELN envolve diretamente a Venezuela, como disseram os chefes do grupo”, diz Buitrago.
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