Amazônia colombiana enfrenta garimpeiros, narcotráfico e contrabando

A cidade fronteiriça de Leticia, que foi dominada por grupos narcotraficantes em 1970, hoje sofre com exploração ilegal e abandono do Estado

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Foto do author Fernanda Simas

ENVIADA ESPECIAL A BOGOTÁ - A 157 quilômetros do rio Itaquaí, na Amazônia, onde foram assassinados o jornalista inglês Dom Phillips e o indigenista brasileiro Bruno Pereira, e cruzando para o lado colombiano, está a cidade de Leticia. Dominada por grupos narcotraficantes nos anos 1970, e mesmo sob forte presença militar hoje, ela sofre os mesmos problemas de outros pontos da Amazônia colombiana e brasileira: narcotráfico, exploração ilegal e abandono do Estado.

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Com 643 mil km², a Amazônia colombiana é formada por 10 Departamentos (Estados) e representa cerca de um terço do país, um território mais ou menos do tamanho da Califórnia. Na região vivem 64 dos 115 povos indígenas da Colômbia e a preocupação com a morte de lideranças é uma realidade.

“Muitas mortes de líderes ambientais estão relacionadas ao narcotráfico. Os líderes são vistos como obstáculos para atividades de narcotraficantes, donos de plantações ilegais, para a atividade nos corredores onde saem as drogas para o exterior”, explica o criador e ex-ministro do Ministério da Saúde da Colômbia, Manuel Rodríguez Becerra.

Letícia é uma cidade da Colômbia, capital do departamento de Amazonas Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO

Onde mais líderes são mortos

O país registrou 65 homicídios de líderes ambientais em 2020, segundo o Global Witness, se tornando o mais perigoso da lista. No mundo, foram 227. Apenas em 2021, a Organização de Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (Opiac), denunciou a morte de 46 líderes, sendo 16 indígenas.

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“Essa situação é grave. Não podemos continuar sendo vítimas daqueles que querem ativar ou ajudar o narcotráfico”, afirmou o coordenador de direitos humanos da Opiac, Óscar Daza, em evento na ocasião. Desde o acordo de paz assinado entre o governo colombiano e a antiga guerrilha Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) em 2016 até 2021, foram 611 líderes mortos, segundo o Indepaz.

“O problema do assassinato dos nossos líderes tem a complexidade do problema do Amazonas, e de outras regiões fora da Amazônia que estão afetadas por esses conflitos cruzados. É preciso melhorar as condições de vida dos povos de lá, enfrentar o problema do narcotráfico de forma integral. A situação é muito difícil justamente porque não se resolve apenas com medidas policiais. E falta uma ação integral do governo colombiano”, diz o especialista em meio ambiente e professor da Universidade do Rosario Manuel Guzmán Hennessey.

De acordo com o que se sabe até agora sobre a morte de Pereira e Phillips, no Brasil, as evidências apontam para atividades ilegais de pesca e caça, junto ao contrabando, como pano de fundo para os assassinatos. O indigenista Pereira havia sofrido ameaças recentes sobre o trabalho que realizava na Amazônia.

Os analistas afirmam que a omissão do Estado na região amazônica fortalece a atividade de grupos ilegais na região das fronteiras e é preciso ir além da resolução militar para melhorar a segurança.

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“Desde que Bolsonaro chegou ao governo, reeditou o que foi a política militar sobre a região Amazônica dos anos 1970, muito influenciada por ditaduras. A posição forte era que a Amazônia era destinada ao desenvolvimento do Brasil. Bolsonaro está reeditando essa política e todos os anúncios que faz, de que a Amazônia se destina ao desenvolvimento do Amazonas brasileiro e as reivindicações indígenas são exageradas, mostra isso”, considera o ex-ministro Rodríguez.

Para Guzmán, o clamor internacional que o caso brasileiro gerou deveria levar a ações concretas. “Mas não tenho ilusões. Ocorreram outros assassinatos e, infelizmente, o movimento da opinião internacional não tem sido suficiente para que os governos tomem ações integrais e definitivas sobre o problema. Uma ação conjunta entre os três países sem dúvida ajudaria.”

Desmatamento

A maior parte do desmatamento na Colômbia ocorre na Amazônia. Em 2020, segundo o IDEAM, o país perdeu 171.685 hectares de bosques, 63% na Amazônia. O chamado arco do desmatamento está nos Departamentos de Guaviare, Caquetá, Meta - onde o candidato presidencial Rodolfo Hernández levou vantagem no primeiro turno - e Putumayo - onde o candidato Gustavo Petro se saiu melhor.

A votação no resto do território amazônico favoreceu Petro no primeiro turno. Os dois candidatos apresentam propostas semelhantes ao meio ambiente.

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O principal motivo do desmatamento no país atualmente é o uso da terra para a criação de gado. “A intenção desses grupos armados é tomar o território, desmatar e abrir grandes áreas para fazendas de gado. Hoje, grande parte do desmatamento ocorre por conta da criação de gado por empresários criminosos financiados pelo dinheiro do narcotráfico ilegal e mineração ilegal”, diz Rodríguez.

Petro, em seu plano de governo, menciona a proteção aos defensores de direitos ambientais e considera autoridades indígenas como protetores do território e dos direitos humanos; pede investigação dos responsáveis por conflitos ambientais. Fala, também, em duas medidas para combater o desmatamento da Amazônia: impulsionar a lei orgânica de ordenamento territorial e frear a apropriação ilegal de prédios, as atividades ligadas ao narcotráfico e a mineração em fronteiras agrárias.

Hernández propõe colocar em vigor novamente o Acordo de Escazú e uma estratégia de segurança territorial. Seu programa também fala em garantir renda básica aos que trabalham pela proteção das florestas, formar grupos especializados para frear o desmatamento e fortalecer as autoridades ambientais, além de judicializar crimes de mineração e desmatamento.

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“As melhores propostas são do candidato Petro, mas acredito pouco, e não votarei nele no segundo turno, ainda nem sei se votarei em branco. Há 30 anos acompanho a política ambiental de todos os presidentes. O fenômeno é que chegam à presidência com boas promessas, mas depois não conseguem implementar”, diz o ex-ministro Rodríguez.

Guzmán considera a ratificação do Acordo de Escazú uma decisão muito prejudicial do Congresso. “Seria outra forma de proteger nossos líderes ambientais e sociais. Esperamos que o novo Congresso atue rapidamente em julho, quando assumir, e reveja isso”.

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