PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Escreve toda semana

Opinião|O que as prisões de Lula e Chávez ensinam sobre a condenação de Donald Trump

Ao observar a trajetória de muitos demagogos populistas como Trump na América Latina, vi esse filme várias vezes. E o final costuma ser feliz para os vilões

PUBLICIDADE

Foto do author Andrés Oppenheimer
Atualização:

Muitos analistas estão especulando que a condenação do aspirante presidencial republicano Donald Trump por falsificação de documentos de suas empresas para encobrir um escândalo sexual pode fazer com que ele perca nas eleições de 5 de novembro. Não estou tão seguro. Ao observar a trajetória de muitos demagogos populistas como Trump na América Latina, vi esse filme várias vezes. E o final costuma ser feliz para os vilões.

PUBLICIDADE

Logo após ser declarado culpado das 34 acusações criminais no tribunal de Nova York, Trump afirmou que o sistema de Justiça dos Estados Unidos supostamente põe em prática um complô contra sua pessoa. Ele disse que “isto foi uma vergonha” e que “Sou um homem muito inocente. Estou lutando pelo nosso país, estou lutando pela nossa Constituição”.

Enquanto o escutava, não consegui evitar estabelecer paralelos com uma grande lista de populistas latino-americanos que jogaram o mesmo jogo de vitimização após serem condenados por vários delitos e que foram eleitos anos depois. O finado homem-forte da Venezuela, Hugo Chávez, foi condenado por dar um golpe de Estado em 1992, indultado dois anos depois e eleito presidente em 1998.

O ex-presidente dos EUA e atual candidato pelo partido Republicano, Donald Trump Foto: Matt Rourke/AP

Grande parte da estratégia de campanha de Chávez foi apresentar-se como vítima de um sistema supostamente corrupto. O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, o líder colombiano, Gustavo Petro, a ex-presidente da Argentina Cristina Fernández de Kirchner, o ex-presidente do Equador Rafael Correa e vários outros populistas também jogaram a carta da vitimização depois de serem declarados culpados ou desqualificados para postular-se à presidência.

E, em muitos casos, eles foram reeleitos sem problemas. Lula foi condenado em 2017 por acusações de corrupção e lavagem de dinheiro cometidas durante seu governo de 2003 a 2010 e sentenciado a 26 anos de prisão. Passou 580 dias na cadeia, até que um tribunal anulou sua sentença em 2021. Um ano depois, ganhou as eleições presidenciais brasileiras.

Publicidade

Fernández de Kirchner, da Argentina, e Correa, do Equador, afirmam ser vítimas de “lawfare”, um termo que usam desonestamente para se referir a uma suposta conspiração das elites e do poder Judiciário para perseguir defensores do povo. Trump, que enfrenta outros três processos penais, incluindo um por tentar subverter o resultado das eleições de 2020, atacou não somente o sistema de Justiça americano, mas também o juiz, a quem acusou sem provas de ser “corrupto”, e inclusive o júri.

Mas eu não me apresaria em prognosticar uma derrota eleitoral de Trump, entre outras coisas porque ele tem um controle férreo sobre o Partido Republicano e o apoio de poderosos meios de comunicação de direita.

A apresentadora da Fox News Jeanine Pirro disse pouco depois do veredicto que a Justiça tinha atuado “para derrubar um candidato a presidente”. Seu colega apresentador da Fox News Sean Hannity disse que o veredicto de Trump foi “uma condenação sem delito”.

Como se os americanos tivessem esquecido que a Fox News teve de pagar US$ 787 milhões em um julgamento por afirmar falsamente que as eleições de 2020 tinham sido manipuladas. Os documentos judiciais mostraram que executivos e apresentadores da Fox News sabiam perfeitamente que o presidente Joe Biden havia ganhado, mas a emissora teria mentido para não perder sua audiência trumpista. Já antes de seus últimos ataques ao poder Judiciário, Trump tinha defendido seus seguidores presos no violento ataque ao Capitólio de 6 de janeiro de 2021, que resultou em cinco mortes, qualificando-os como “patriotas” e “reféns”.

E Trump segue negando que perdeu as eleições de 2020 apesar de 60 tribunais terem rejeitado os argumentos de seus advogados — que inclusive a Suprema Corte, de maioria conservadora, considerou infundados.

Publicidade

PUBLICIDADE

É certo que populistas latino-americanos como Chávez ou Lula ganharam eleições somente depois de ser indultados ou ter suas sentenças revogadas. Ainda assim, vale a pena ressaltar as similitudes entre a condenação penal de Trump e a história recente de vários populistas latino-americanos.

Em quase todos os casos, eles se apresentam como supostas vítimas de elites sinistras, atacam instituições democráticas, como o poder Judiciário, qualificam jornalistas incômodos como “inimigos do povo” e não respeitam resultados de eleições que perdem. Ao longo do caminho, monopolizam grandes manchetes e muitas vezes acabam ganhando eleições. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Opinião por Andrés Oppenheimer

Andrés Oppenheimer foi considerado pela revista Foreign Policy 'um dos 50 intelectuais latino-americanos mais influentes' do mundo. É colunista do The Miami Herald, apresentador do programa 'Oppenheimer Apresenta' na CNN em Espanhol, e autor de oito best-sellers. Sua coluna 'Informe Oppenheimer' é publicada regularmente em mais de 50 jornais

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.