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Opinião | O que está por trás das ameaças de Trump contra o Panamá?

Presidente eleito dos EUA ameaçou retomar o controle do Canal do Panamá por conta das “altas taxas”

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Foto do author Andrés Oppenheimer
Atualização:

O presidente eleito Donald Trump, que nas semanas mais recentes sugeriu que o Canadá se tornasse um estado dos EUA e que Washington comprasse a Groenlândia, ameaça agora exigir a devolução do Canal do Panamá. Vou compartilhar minha teoria a respeito do motivo pelo qual ele está dizendo essas coisas.

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Em uma publicação na sua rede social de 21 de dezembro, Trump disse que o Panamá está cobrando taxas “ridículas” pelo uso do Canal do Panamá, e manifestou receios de que o Panamá não consiga garantir o livre trânsito de navios por essa rota. Se isso não mudar, “exigiremos que o Canal do Panamá nos seja devolvido, na sua totalidade e sem questionamentos”, escreveu.

O canal, que permite a travessia de navios entre os oceanos Pacífico e Atlântico, é fundamental para as economias dos EUA e da América Latina. Qualquer interrupção no transporte através do canal, o que nunca aconteceu desde que o Panamá o administra, poderia aumentar os preços das exportações asiáticas para o continente americano e vice-versa.

Trump tem usado seus discursos para ampliar a ideia de que os EUA devem controlar outros territórios Foto: Rick Scuteri/AP

O canal foi construído principalmente pelos EUA em território panamenho no início do século 20 e foi administrado pelos americanos durante décadas. Após os Acordos do Canal do Panamá, assinados pelo ex-presidente Jimmy Carter em 1977, o canal passou para as mãos do Panamá em 1999.

Trump também alertou que não permitirá que o canal caia nas mãos da China. Embora a China não controle o canal, uma subsidiária da Hutchinson Holdings, com sede em Hong Kong, opera dois dos seus vários portos, entre outros na América Latina.

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O que está por trás da ameaça de Trump ao Panamá? Uma teoria é que Trump ameaça constantemente outros países como tática de negociação. Mas não há muito o que negociar com o Panamá: o maior problema nas relações entre o Panamá e os EUA é o fluxo de imigrantes sem documentos cruzando da selva panamenha de Darién, e o presidente panamenho José Raúl Mulino está cooperando com sucesso para fechar essa rota.

Uma explicação mais plausível pode ser que, tal como as frequentes explosões de Trump contra o México, a China ou o Canadá, Trump esteja atacando o Panamá para manter a sua base política energizada.

Os demagogos populistas muitas vezes tiram da cartola sucessivos conflitos com inimigos reais ou imaginários para se embrulhar na bandeira e se apresentar como salvadores do país. Trump não foge à regra, de acordo com esta linha de pensamento.

Os panamenhos foram pegos de surpresa pela explosão de Trump, porque o presidente panamenho é um dos mais pró-EUA da região.

Em uma entrevista na segunda feira, 6, que ampliarei no Miami Herald e que será transmitida na CNN em espanhol no domingo, Mulino me disse que defenderá a soberania e a independência do Panamá.

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“O canal pertence aos panamenhos e continuará pertencendo aos panamenhos”, disse-me Mulino. “Não há outra maneira de ver a questão além dessa.”

Rejeitando as alegações de Trump de que o Panamá talvez não seja capaz de garantir a passagem segura dos navios através da via navegável interoceânica, Mulino acrescentou que o tráfego através do canal nunca foi interrompido, a não ser quando os EUA invadiram o Panamá em 1989.

As tarifas do canal são definidas em audiências públicas pela Autoridade do Canal do Panamá, uma agência governamental autônoma que administrou o canal de forma eficiente durante mais de duas décadas e o expandiu significativamente com grandes despesas em 2016, ressaltou. Antigos diplomatas dos EUA no Panamá disseram-me que, de fato, o Panamá fez um bom trabalho na manutenção e modernização do canal.

Minha opinião: em vez de criar conflitos com outros países, Trump deveria concentrar-se em problemas muito maiores dentro do seu próprio país.

Os EUA têm os cuidados de saúde mais caros entre os países ricos, uma epidemia de tiroteios em massa, uma crise climática crescente que está causando a destruição de regiões inteiras e uma desigualdade de renda galopante.

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Por que Trump não fala nessas questões, que são muito mais importantes do que as tarifas do Canal do Panamá? Ou ele está tentando nos distrair das questões realmente importantes, ou está tentando criar um conflito para agradar os xenófobos dentro de sua base.

Seja como for, as declarações dele são lamentáveis./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Opinião por Andrés Oppenheimer

Andrés Oppenheimer foi considerado pela revista Foreign Policy 'um dos 50 intelectuais latino-americanos mais influentes' do mundo. É colunista do The Miami Herald, apresentador do programa 'Oppenheimer Apresenta' na CNN em Espanhol, e autor de oito best-sellers. Sua coluna 'Informe Oppenheimer' é publicada regularmente em mais de 50 jornais

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