LONDRES - A Anistia Internacional (AI) considera que a transferência irresponsável de armas ao Iraque durante décadas forneceu ao Estado Islâmico (EI) seu arsenal letal, e pede medidas urgentes aos governos para reduzir a proliferação de armamento no país, na Síria e em outras regiões instáveis.
A organização de direitos humanos divulgou nesta terça-feira, 8, em sua sede em Londres um relatório, denominado “Taking Stock: The Arming Of Islamic State", que documenta o emprego de armamento e munição por parte da organização jihadista, responsável pelos recentes atentados em Paris, que deixaram 130 mortos e mais de 350 feridos.
Segundo o relatório, o arsenal que o grupo terrorista utiliza para cometer crimes de guerra e contra a humanidade no Iraque e na Síria foi fabricado em mais de uma dúzia de países, como Rússia, China, EUA e países da União Europeia (UE), apesar de uma grande proporção vir das reservas de armamento do exército iraquiano.
"O amplo e variado armamento empregado pelo grupo armado que se autodenomina Estado Islâmico é um caso sobre como o comércio imprudente de armas alimenta as atrocidades em larga escala", declarou Patrick Wilcken, da AI.
Segundo ele, "a pobre regulação e a falta de supervisão dos enormes fluxos de armas que vão ao Iraque há décadas deram ao EI e a outros grupos armados uma bonança sem precedentes de acesso a armamentos".
A AI afirma que, após assumir o controle de Mossul em junho de 2014, o EI adquiriu reservas de armas iraquianas, fabricadas em nível internacional, que usou para controlar outras partes do Iraque.
Com elas realizaram campanhas de abusos, como assassinatos sumários, estupros, torturas e sequestros, que obrigaram centenas de milhares de pessoas a fugir e se transformar em deslocados ou refugiados.
Segundo a Anistia, que identifica mais de 100 tipos diferentes de armas e munição empregadas pelo EI na Síria e no Iraque, a magnitude do arsenal do grupo terrorista "reflete décadas de irresponsáveis transferências de armamento ao Iraque".
"Isto se agravou por múltiplos erros para tramitar as importações de armas e instaurar mecanismos de supervisão, a fim de evitar o uso impróprio durante a ocupação liderada pelos EUA após 2003", apontou a organização. "Ao mesmo tempo, os controles frouxos sobre as reservas militares e a corrupção endêmica por sucessivos governos iraquianos se somaram ao problema", acrescentou a AI.
A maior parte do armamento convencional empregado pelos terroristas de EI data do período entre a década de 1970 e de 1990, e inclui pistolas, revólveres, morteiros, entre outros, sendo muito comuns, segundo o relatório, os fuzis Kalashnikov da época da União Soviética, de fabricação russa e chinesa.
A guerra entre Iraque e Irã (1980-1988) foi um "momento seminal" no desenvolvimento do mercado de armas moderno em nível global. A AI acrescenta que pelo menos 34 países diferentes proporcionaram armas ao Iraque, enquanto 28 deles faziam simultaneamente o mesmo com o Irã.
A organização também indica que após um embargo de armas da ONU em 1990, houve um aumento massivo nas importações ao Iraque, após a invasão desse país em 2003, e mais de 30 países - entre eles, membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU - forneceram equipamento militar ao exército iraquiano na década passada.
Durante os últimos dez anos, quantidades substanciais desse equipamento acabaram nas mãos de grupos insurgentes, como o EI.
Por essa razão, a AI pede a todos os governos que adotem um embargo completo às autoridades sírias, assim como aos grupos armados da oposição implicados em crimes de guerra, contra a humanidade e outros abusos aos direitos humanos.
"O legado da proliferação de armas e o abuso no Iraque e os arredores da região já destruíram as vidas de milhões de pessoas e representam uma contínua ameaça", comentou Wilcken. Ele ressaltou que "as consequências das transferências de armas imprudentes ao Iraque e à Síria e sua subsequente captura pelo EI devem servir de alerta aos exportadores de armas de todo o mundo". /EFE
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