O que é antissemitismo? Colunista do ‘NYT’ explica em respostas simples

Casos de preconceito aumentam pelo mundo com a guerra entre Israel e os terroristas do Hamas na Faixa de Gaza

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Por Bret Stephens

Em um tempo de condenação ampla ao antissemitismo, muitos têm dificuldade em defini-lo. Eu me imagino tendo esta conversa com qualquer um tentando entender este fenômeno ancestral:

Pergunta: Estou com dificuldades para compreender algumas das afirmações e contra-afirmações sobre o que são — ou não — discursos e comportamentos antissemitas. Sendo honesto, não ajuda que tantos judeus proeminentes tenham percepções tão acentuadamente distintas sobre o tema.

Resposta: Dois judeus, três opiniões.

Isso soa como estereótipo.

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E é. É também uma das poucas coisas com as quais a maioria do judeus concorda em relação a nós enquanto povo.

OK, então de acordo com sua opinião e meia, o que é antissemitismo?

É uma teoria conspiratória que argumenta que os judeus são singularmente propensos a adotar modos nefastos para alcançar fins malevolentes e, portanto, devem ser impedidos por qualquer meio necessário, incluindo violência.

Esta é a definição comumente aceita?

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Não, é a minha. Uma definição mais amplamente citada vem da Aliança Internacional de Memória do Holocausto, que define antissemitismo em parte como “uma certa percepção a respeito dos judeus que pode ser expressada como ódio aos judeus”. Mas a expressão “uma certa percepção” levanta mais dúvidas que respostas.

Então por que você chama o antissemitismo de teoria da conspiração? Não se trata de simples intolerância contra judeus?

Poucas coisas são simples a respeito do antissemitismo porque poucas são simples a respeito dos judeus. Nós somos uma nação, uma religião, uma cultura, um “outro”. Em várias épocas, nós também fomos considerados, falsamente, uma raça, da maneira mais perversa pelos nazistas.

O antissemitismo se expressou ao longo dos séculos como oposição política a judeus, ódio religioso, desprezo cultural, xenofobia ou racismo. É um vírus mutante que se adaptou a preconceitos que reinaram em diferentes eras. Mas o fio comum ligando todas as suas cepas é que o antissemitismo tipicamente assume a forma de uma teoria conspiratória.

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Manifestantes queimam bandeira de Israel durante protesto em apoio aos palestinos, Marrocos, 10 de dezembro de 2023. Foto: AP

Por exemplo?

Deicídio, para começar — a ideia de que os judeus fizeram os romanos matar Jesus. Depois, na Idade Média, apareceu a crença de que pragas eram causadas por judeus que envenenavam poços. A seguir, judeus usaram seu poder financeiro para iniciar guerras; ou seu controle sobre os meios de comunicação e Hollywood para manipular a opinião pública e degradar a moral pública; ou sua influência no Congresso e na Casa Branca para levar os Estados Unidos a guerras no Oriente Médio e fazer avançar interesses israelenses.

Não há alguma verdade neste último ponto? Figuras como Paul Wolfowitz não foram em grande medida responsáveis por levar os EUA à guerra no Iraque?

Na realidade, os indivíduos responsáveis por levar os EUA à guerra no Iraque foram George W. Bush, Dick Cheney e Donald Rumsfeld. Culpar autoridades judias de segundo escalão por ações de autoridades cristãs de primeiro escalão é uma expressão clássica de antissemitismo.

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Eu não tinha percebido.

Nem as pessoas que fizeram essa acusação 20 anos atrás. Há muito antissemitismo inconsciente, assim como muito racismo inconsciente.

Mas se o antissemitismo é uma teoria da conspiração, por que tantas pessoas classificam o antissionismo como uma forma de antissemitismo? Podem falar o que for a respeito do antissionismo, mas direto ele é.

Lembre-se que o antissemitismo também pode assumir a forma de ódio político, e o sionismo — ou seja, o apoio à existência do Estado judaico, não a qualquer de suas políticas — é hoje a principal expressão da política judaica. Mas até o antissionismo expressa-se cada vez mais como uma teoria conspiratória.

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De que forma?

Pense nisso da seguinte maneira: para o alemão antissemita do século 19, os judeus eram impostores e vigaristas — impostores porque alegavam ser cidadãos alemães quando os antissemitas alegavam que eles eram “semitas”; e vigaristas porque sua atividade era usurpar dos alemães “verdadeiros” seu patrimônio. Para o antissionista do século 21, judeus são impostores e vigaristas — impostores porque alegam ter laços ancestrais com a Terra Santa quando os antissionistas alegam que eles são colonizadores europeus; e vigaristas porque estão usurpando os palestinos de seu patrimônio.

Em ambos os casos, os judeus são “o outro”. A única diferença é que gerações passadas de antissemitas acusavam os judeus de ser médio-orientais, enquanto os antissionistas de hoje os acusam de ser europeus.

Interessante. Mas não há judeus ultraortodoxos que se consideram antissionistas?

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Sim. E se você é um desses judeus, considere-se absolvido das acusações de antissemitismo. Também, se for contrário a qualquer forma de nacionalismo enquanto princípio, você pode então se opor honrosamente ao nacionalismo judaico. Mas você não pode apoiar todos os direitos à existência exceto o da nação judaica. Isso é antissemitismo.

Mas apoiar o estatuto da nação palestina não requer opor-se ao estatuto da nação judaica?

Não é um ou o outro. Pode e deve haver os dois. Israel veio a existir da maneira mais legítima possível — por meio de uma votação nas Nações Unidas que foi imediatamente rejeitada por Estados árabes que se empenharam em destruir o recém-nascido Estado judaico. Em 2000, o então primeiro-ministro israelense, Ehud Barak, ofereceu ao líder palestino Yasser Arafat um Estado palestino. Arafat rejeitou a oferta, e 23 anos de tragédias se seguiram.

Incluindo a atual tragédia em Gaza, na qual o Estado de Israel tem sido amplamente acusado de cometer genocídio.

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Esta acusação também é uma forma de antissemitismo. E é obviamente falsa: se Israel realmente quiser cometer genocídio em Gaza, tem meios para tanto. Acusar judeus do mesmo crime do qual eles foram as maiores vítimas na história é um insulto singularmente vil. E a acusação de genocídio é tão atroz que dá licença para qualquer forma de violência impedi-lo, incluindo o tipo de massacre que vimos em 7 de outubro.

Soldados israelenses se posicionam perto da Faixa de Gaza, Israel, 11 de dezembro de 2023. Foto: AP / Ohad Zwigenberg

Eu também não concordo com a acusação de genocídio em si, mas ainda penso que a resposta de Israel é desumana, desproporcional e contraproducente.

Eu discordo, mas essa crítica é inteiramente legítima, da mesma forma que é legítimo se opor à política de assentamentos na Cisjordânia ou ao governo extremista de Binyamin Netanyahu. Muitos israelenses e judeus americanos também o fazem.

Eu costumava pensar no antissemitismo como um fenômeno da direita, conectado a racistas como David Duke. Mas agora só se fala sobre antissemitismo entre pessoas que se definem como progressistas. Como isso ocorreu?

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Considere a seguinte citação: “Qual é a religião mundana do judeu? Vender. Qual é o seu deus mundano? O dinheiro”. Joseph Goebbels? Não, é Karl Marx.

Sempre houve uma vertente virulenta de antissemitismo na esquerda, que a União Soviética praticou domesticamente e propagou internacionalmente ao longo de grande parte da Guerra Fria. A academia ocidental deu seguimento à obra dos soviéticos enfatizando narrativas de “descolonização” implicando Israel obsessivamente e esquecendo-se dos demais. Quando foi a última vez que você ouviu estudantes universitários manifestando-se contra os violentos maus-tratos aos curdos praticados pelo governo da Turquia ou denunciando os abusos da Índia na Caxemira?

Espero que a pergunta não seja rude, mas: por que os judeus? Por que o antissemitismo sofre mutações e persiste ao longo de tantos séculos?

Os judeus defendem há longa data um conjunto de ideias que, apesar de não serem radicais hoje, foram radicais em determinadas épocas. Entre elas: monoteísmo, liberdade, alfabetização universal e o que a tradição judaica chama de “argumento pelo bem do céu”.

O monoteísmo impõe um padrão ético único — como “Não matarás” — sobre todas as pessoas, independentemente de seus países ou culturas. É a semente da ideia de direitos universais. A história do Livro do Êxodo serviu de inspiração para povos em busca da liberdade — “Deixe meu povo ir!”. Alfabetização, um prerrequisito para tornar-se um judeu adulto, é a base da libertação da mente. E o argumento pelo bem do céu — inscrevendo diálogo e dissenso na tradição religiosa — é central para qualquer sociedade democrática.

Não é de se espantar que o judeus tenham inspirado tanto ódio de qualquer governante, religião ou ideologia buscando manter seu povo em servidão e ignorância. Onde quer que o antissemitismo mostre sua cara, não apenas os judeus estarão na mira. Também estarão em risco a liberdade, a educação e a dignidade humana — valores que todos nós, judeus ou não, deveríamos compartilhar. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

*Bret Stephens é colunista na sessão de Opinião do New York Times. Escreve sobre relações internacionais e política.

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