Após ser cenário do pior acidente nuclear da história, que nesta segunda-feira, 26, completa seu 35 anos, Chernobyl — que na época pertencia à antiga União Soviética —, agora, pode se tornar Patrimônio Mundial da Unesco.
Ao menos é o que o governo da Ucrânia tem em mente para a área da usina onde, às 1h23 da madrugada de 26 de abril de 1986, o reator número 4 da central de Chernobyl, situado a cerca de 130 quilômetros de Kiev, explodiu durante um teste de segurança.
De acordo com relatórios oficiais, a explosão espalhou até 200 toneladas de material com uma radioatividade de 50 milhões de curies, o equivalente a 500 bombas atômicas como a lançada em Hiroshima.
Até hoje, uma área de cerca de 2,600 km², conhecida como zona de exclusão, delimita a região mais afetada pela radiação.
Oficialmente, o acidente matou 31 pessoas, forçou a retirada de 1 milhão de habitantes da região, provocou centenas de casos de doenças e a destruição do meio ambiente local. Ainda assim, nos últimos anos, a área tem registrado recordes de turistas, principalmente após a estreia da série de TV “Chernobyl", da HBO.
Para marcar o 35º aniversário do desastre, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, deve visitar nesta segunda-feira a zona de exclusão de 30 quilômetros ao redor da central nuclear.
Na esperança de que a entrada na lista de patrimônios da Unesco possa significar mais financiamento junto ao órgão da Organização das Nações Unidas (ONU).
"Acreditamos que colocar Chernobyl na lista de patrimônio da Unesco é um primeiro e importante passo para ter este grande lugar como um destino único de interesse para toda a humanidade", disse o ministro da Cultura da Ucrânia, Oleksandr Tkachenko à agência Reuters.
"A importância da zona de Chernobyl está muito além das fronteiras da Ucrânia. Não se trata apenas de comemoração, mas também de história e direitos do povo", comentou.
Antes de enviar um pedido à ONU, os locais que buscam proteção da Unesco devem ser incluídos em uma lista nacional de patrimônio histórico e cultural, de acordo com o ministro.
Tkachenko disse que seu ministério decidiu recentemente incluir um enorme radar militar construído perto da cidade de Chernobyl na década de 1970 na lista. Ele também está discutindo a expansão para toda a Zona de Exclusão de Chernobyl, de 30 km.
O que foi o desastre de Chernobyl?
Em 25 de abril de 1986, uma manutenção de rotina estava prevista para ocorrer no quarto reator da Central Nuclear de V.I. Lenin. Na ocasião, os engenheiros planejavam testar se o reator ainda poderia ser resfriado caso a usina ficasse sem energia. No entanto, durante o teste, na madrugada de 26 de abril, um erro humano fez com que o reator ficasse sobrecarregado. Apesar das tentativas para desligar totalmente o equipamento, outra sobrecarga provocou uma reação em cadeia de explosões em seu interior. Por fim, o núcleo do reator ficou exposto, lançando material radiativo na atmosfera.
Como o governo soviético reagiu ao desastre?
Inicialmente, o governo soviético tentou abafar a tragédia. Durante 10 dias, o combustível nuclear queimou e liberou na atmosfera elementos radioativos que contaminaram, segundo algumas estimativas, até 75% da Europa, especialmente as então repúblicas soviéticas da Ucrânia, Belarus e Rússia, sem que nenhum comunicado fosse feito. O líder da URSS na época, Mikhail Gorbachev, não falou publicamente sobre a questão até 14 de maio.
Onde fica Chernobyl?
O desastre ocorreu próximo à cidade de Chernobyl, na antiga União Soviética, que investiu intensamente em energia nuclear após a Segunda Guerra Mundial. Desde 1991, a partir da dissolução da URSS, a área pertence à Ucrânia. A área fica localizada ao sul da atual fronteira entre o país com a Bielorrússia. Contudo, mesmo que o desastre tenha ficado mundialmente conhecido como a tragédia de Chernobyl, a cidade mais icônica da região se chama Pripyat.
Quantas pessoas morreram em Chernobyl?
Passadas mais de três décadas da tragédia, o balanço de vítimas da catástrofe continua sendo objeto de debate. O comitê científico da ONU (Unscear) reconhece oficialmente apenas 30 mortes entre os operários e bombeiros que faleceram vítimas da radiação após a explosão. Em 2006, a ONG Greenpeace calculou em quase 100.000 o número de mortes provocadas pelos efeitos radioativos da catástrofe nuclear.
Quais os efeitos do desastre de Chernobyl?
Além das mortes, o contato com a radiação também provocou uma série de efeitos colaterais em milhares de trabalhadores e moradores da região. Isso, é claro, sem falar no impacto do acidente sobre a saúde mental da população.
O Comitê Científico da ONU sobre os Efeitos da Radiação Atômica calcula que mais de 6 mil crianças e adolescentes desenvolveram câncer de tireoide após a exposição à radiação do acidente, embora alguns especialistas tenham contestado essa alegação.
No total, cerca de 10 milhões de pessoas foram expostas de alguma forma à radiação, principalmente russos, ucranianos e bielo-russos; 96 cidades e vilarejos foram esvaziados.
Os efeitos do desastre também atingiram a fauna e a flora da região. Após o acidente, uma área de cerca de 10km² ficou conhecida como “floresta vermelha” por causa da coloração marrom-avermelhada que tomou conta das árvores após absorverem a radiação.
Como está Chernobyl hoje?
A central de Chernobyl manteve a produção de energia elétrica até dezembro de 2000, quando a pressão dos países ocidentais resultou na paralisação do último reator operacional. Após anos de adiamento, no final de 2016 foi instalado um arco gigante de aço sobre o reator danificado, estrutura que cobriu o "sarcófago" de concreto, rachado e instável, e que deve garantir a segurança pelos próximos 100 anos.
Embora as autoridades afirmem que os humanos não poderão viver na região de forma segura por pelo menos 24.000 anos, o local atrai cada vez mais turistas intrigados com sua história e riscos. Os passeios pela região são considerados seguros, desde que todos sigam à risca as regras de segurança, que passam pela “medição” de radiação dos turistas e de não tocar em paredes ou sentar no chão, por exemplo. / AFP e REUTERS.
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