Argentina se opõe a taxar super-ricos e ameaça derrubar iniciativa defendida por Lula no G-20

Representante de Milei reclama de vazamento de postura contrária e diz que outros diplomatas ‘não são sérios’ ao comentar negociação em andamento

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Foto do author Felipe Frazão
Atualização:

ENVIADO AO RIO - Em nova frente de embates no G-20, a delegação da Argentina indicou nesta sexta-feira, dia 15, que se opõe à proposta de taxação de grandes fortunas, antes aprovada por todos os países do grupo. O gesto dos argentinos preocupa integrantes do governo brasileiro, que veem risco de a proposta de ser derrubada.

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Um integrante do Ministério da Fazenda entende a mudança de posição como “uma linha vermelha” cruzada pela Argentina e confirmou ao Estadão a postura beligerante da delegação enviada ao Rio por Buenos Aires. Diplomatas do Itamaraty também disseram que há dificuldades de convencimento dos argentinos. O relato é reforçado por embaixadores de países europeus e africanos.

A ausência de entendimentos já faz a reunião final de sherpas avançar noite adentro. A previsão agora é que seja retomada às 9h neste sábado, dia 16, indo além do cronograma original. O Itamaraty previa dificuldades, e representantes de países estrangeiros foram avisados de que a discussão vai se estender.

Argentina, de Milei, indicou que se opõe à proposta de taxação de grandes fortunas Foto: Jose Luis Magana/AP

Flagrado pelo Estadão ao telefone num intervalo da reunião final de sherpas, o ex-senador e negociador diplomático da Argentina Federico Pinedo se negou a revelar quais são as objeções levantadas pelo governo. A reportagem perguntou a ele se procedia a informação de que haviam se insurgido contra a taxação, vazada da reunião a portas fechadas.

“Nós somos sérios, se há outros que não são, lamento. A negociação não terminou. Até que termine, não vamos falar nada”, disse o representante de Javier Milei.

O presidente ultraliberal Javier Milei tem ordenado uma blitz sobre a diplomacia argentina, que convive com demissões há meses, num processo de intervenção da Casa Rosada, com raízes ideológicas. Milei substitui recentemente a economista Diana Mondino, até então ministra das Relações Exteriores, pelo empresário Gerardo Werthein, antes seu embaixador nos Estados Unidos.

No G-20 as equipes não foram trocadas, mas alteraram sua posição, segundo integrantes da Fazenda e do Itamaraty.

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Informações extraoficiais também indicam que a Argentina ainda não aderiu ao projeto de Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza. Segundo negociadores que participam da reunião, os enviados argentinos também voltaram a expor resistências aos assuntos de clima e costumes - como questões de gênero - embora um embaixador pondere que Buenos Aires tem interesse em financiamento climático, com expectativa de receber recursos.

Representante de Javier Milei, o ex-senador da Argentina Federico Pinedo participa da reunião final de sherpas no Rio Foto: Isabela Castilho

Milei confirmou presença no G-20. Ele deve discursar duas vezes, a portas fechadas, diante dos demais presidentes e primeiros-ministros. Escolheu falar sobre os temas da Fome e Pobreza e Reforma da Governança Global, mas não sobre Clima. Segundo um secretário do Itamaraty, cada líder vai discursar duas vezes na cúpula. Apenas o anfitrião Lula poderá falar na abertura de cada sessão de debates.

O libertário também não conseguiu ainda abrir portas com Lula para uma reunião bilateral já solicitada antes. Rivais ideológicos, eles cultivam um histórico de ofensas e provocações públicas, além de exigências de desculpas não atendidas.

Os sherpas dos países do G-20 estão reunidos há quatro dias no Rio, finalizando os acordos do grupo e as referências a eles, a fim de que constem na Declaração de Líderes do Rio, a ser assinada e divulgada durante a cúpula, nos dias 18 e 19. O comunicado oficial do G-20 usaria como base o consenso atingido nos debates de Finanças antes.

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O texto da reunião ministerial dizia: “Com pleno respeito à soberania tributária, buscaremos cooperar para garantir que os indivíduos ultrarricos sejam efetivamente tributados. A cooperação pode envolver o intercâmbio de boas práticas, o incentivo a debates sobre princípios tributários e a criação de mecanismos contra a elisão e evasão tributárias, incluindo enfrentar práticas tributárias potencialmente nocivas. Esperamos a continuidade das discussões sobre essas questões no G20 e em outros fóruns relevantes, contando com as contribuições técnicas de organizações internacionais relevantes, acadêmicos e especialistas”.

Um embaixador do Itamaraty disse que o Brasil espera que a África do Sul, próxima presidente do G-20, dê sequência à iniciaitva de taxação de grandes fortunas. Inicialmente, a proposta de Fernando Haddad era que um grupo de países do bloco lançasse a ideia, que acabou encampada por todos, em julho. A intenção é evitar fuga de capitais para paraísos fiscais.

Uma das propostas discutidas era que todos os países adotassem a taxação de 2%, mas essa alíquota não deve estar formalizada do comunicado do G-20. apenas as linhas gerais da proposta. Esse embaixador disse que seria possível arrecadar anualmente entre US$ 200 e US$ 300 bilhões, porque as fortunas são estimadas na casa dos trilhões de dólares.

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Antes do G-20, Milei viajou aos Estados Unidos, onde encontrou o aliado político e ex-presidente Donald Trump, que toma posse novamente em janeiro. Trump obteve uma vitória eleitoral completa em 5 de novembro, levando o controle do Senado e da Câmara.

O governo brasileiro já prevê atrasos e complicações em manter vigentes políticas sugeridas no G-20, com o retorno de Trump, entre elas a ideia de tributar os super ricos.

Apesar disso do elo político com Trump, integrantes da alta gestão do Itaramarty dizem que continuam a negociar e que a postura de Milei não é nova, e precede a vitória de Trump sob Joe Biden. No entanto, ele abriu várias frentes de embate político dentro e fora do país.

Outros países também manifestaram anteriormente dificuldades de identificar o domicílio tributário ou fiscal e outras questões técnicas, como problemas legais que impedem destinar arrecadação a um fundo internacional - uma proposta de uso dos recursos.

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