Arquivos de JFK revelam segredos familiares de parentes que eram ativos da CIA

Novos registros sobre o assassinato do presidente John F. Kennedy revelaram os nomes de ativos da CIA, cujas atividades de espionagem eram um segredo até mesmo para os membros da família

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Por Ben Brasch (The Washington Post), Jonathan Edwards (The Washington Post) e William Wan

Crescendo, John Smith conhecia seu avô como um acadêmico sério — um professor de óculos na Universidade de Maryland que escrevia livros sobre presidentes anteriores à Guerra Civil. Ele também sabia que E.B. Smith havia viajado pelo mundo em sua juventude.

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O que ele não sabia até esta semana era que seu avô já tinha sido um agente do governo dos EUA, fornecendo informações da era soviética para a CIA (Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos, na sigla em inglês).

A divulgação de mais de 77 mil páginas relacionadas ao assassinato do presidente John F. Kennedy em 1963 pelo governo Trump até agora trouxe poucas novas revelações sobre o crime. No entanto, a revelação de muitos nomes que antes estavam censurados expôs as identidades de pessoas que trabalharam nos serviços clandestinos — papéis que, em muitos casos, permaneceram ocultos por décadas, até mesmo de familiares próximos.

Algumas famílias estão descobrindo pela primeira vez como pais, avôs ou cônjuges participaram da espionagem americana — como informantes da CIA coletando informações sobre apoiadores de Fidel Castro, agentes de campo instalando escutas em uma agência chinesa ou acadêmicos extraindo fragmentos de inteligência de um oficial soviético.

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John F. Kennedy Foto: : John F. Kennedy Presidential Library and Museum, Boston

Para John Smith, a notícia sobre o trabalho de seu avô veio na forma de duas páginas curtas que poderiam facilmente passar despercebidas em meio à avalanche de documentos divulgados nesta semana: um relato de 1991, agora sem edições, sobre E.B. Smith pressionando um oficial da KGB por informações soviéticas relacionadas ao assassinato de Kennedy.

“Claro, é surpreendente”, disse John Smith, de 45 anos, após saber por um repórter do Washington Post da aparição de seu avô nos arquivos. Mas, em retrospecto, fazia sentido. Seu avô era uma pessoa extrovertida que já havia morado na União Soviética e mantinha conexões lá mesmo depois de voltar para os Estados Unidos.

E.B. Smith foi para a União Soviética em 1976 como professor Fulbright na Universidade Estatal de Moscou, onde fez amizade com um estudante chamado Vyacheslav “Slava” Nikonov. Nikonov vinha de uma família soviética de grande renome — seu avô era Vyacheslav Molotov, ministro das Relações Exteriores de Joseph Stalin e homônimo do coquetel molotov.

Os dois mantiveram contato. Em 1991, quando Smith fez uma viagem a Moscou, Nikonov era um alto funcionário da KGB encarregado de ajudar a melhorar as relações entre a KGB e a CIA, de acordo com o documento recém-revelado. O memorando descreve os esforços de Smith para obter informações sobre os laços dos soviéticos com Lee Harvey Oswald, assassino de Kennedy.

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Nikonov, que havia se tornado vice-diretor da KGB sob Vadim Bakatin, disse a Smith que havia “revisado pessoalmente” cinco volumes de arquivos sobre Oswald para determinar se ele tinha sido um agente soviético, segundo um teletipo de novembro de 1991 marcado com a instrução “destruir após o uso.”

Nikonov afirmou estar “confiante de que Oswald nunca foi um agente controlado pela KGB. Pela descrição de Oswald nos arquivos, ele duvidava que alguém pudesse controlá-lo.”

Nikonov também revelou que agentes da KGB haviam monitorado Oswald “de perto e constantemente enquanto ele esteve na URSS.” Um detalhe curioso da vigilância: “O arquivo também indicava que Oswald era um péssimo atirador quando tentou praticar tiro na União Soviética.”

Smith “voluntariamente” relatou em detalhes minuciosos tudo o que havia aprendido a um oficial de inteligência dos EUA, de acordo com o documento. O arquivo não revela a opinião da CIA sobre sua avaliação.

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Após a morte de seu avô em 2013, aos 92 anos, John Smith comprou o antigo chalé dele nos arredores de Annapolis. Pelos arquivos agora revelados, ele descobriu que Nikonov já havia dormido na mesma casa.

Atualmente com 68 anos, Nikonov é membro do parlamento russo e foi alvo de sanções do governo dos EUA em 2022 devido à invasão da Ucrânia pela Rússia. Ele não respondeu ao pedido de comentário do The Washington Post.

Um dos objetos mais valorizados pela família de John Smith é uma foto de seu avô — que era ativo no Partido Democrata — sentado com Kennedy no Salão Oval. Após descobrir o papel de seu avô na coleta de informações sobre o assassinato de Kennedy, Smith disse que a imagem agora tem um significado ainda maior.

Dorothy North, de 76 anos, residente da Califórnia, descobriu nesta semana que seu falecido marido também havia sido um ativo da inteligência para a CIA, após um repórter entrar em contato com sua família. Um dos arquivos o descrevia como uma “fonte de longa data de valor excepcional.”

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“É um choque”, disse ela. Ele nunca mencionou — antes ou depois de se casarem em 1977 — que havia trabalhado ao lado da CIA. Ele faleceu em 2002.

Durante o dia, Robert North lecionava na Universidade de Stanford, treinando a nova geração de cientistas políticos, sendo pioneiro no uso de computadores para analisar relações internacionais e escrevendo livros sobre como as atitudes das pessoas podem influenciar o comportamento de organizações e países.

Mas, fora da sala de aula, North fornecia a autoridades dos EUA informações de inteligência que extraía de suas pesquisas geopolíticas. Um memorando da CIA datado de 24 de outubro de 1962 — no auge da crise dos mísseis de Cuba — relata que North viajou para Miami e conversou com 25 ex-apoiadores do ditador cubano Fidel Castro. Ele informou aos agentes de inteligência dos EUA que vários desses cubanos suspeitavam de um homem — Manuel Ray — como um “possível agente comunista adormecido”, um infiltrado instruído a permanecer inativo até ser ativado para uma missão. Ray faleceu em 2013.

Dorothy North descreveu seu falecido marido como uma pessoa tranquila, empática e gentil. A única pista que ela teve sobre seus envolvimentos com a inteligência era o fato de que o FBI frequentemente o visitava para entrevistá-lo depois de suas viagens de pesquisa.

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Ela disse esperar que a revelação não mude a forma como as pessoas veem seu marido. Ele foi um veterano da Segunda Guerra Mundial, tendo lutado contra soldados japoneses na Batalha de Saipan, em 1944.

Ele era um patriota, disse Dorothy, e provavelmente via seu trabalho para os oficiais de inteligência dos EUA como uma maneira de ajudar seu país.

Quando criança, na década de 1960, Mark Mills sabia que seu pai trabalhava para o governo dos EUA. O trabalho dele manteve a família se mudando por Tailândia, Vietnã, Canadá e Taiwan.

Se alguém perguntasse, sua mãe cuidadosamente orientava ele e seus três irmãos a dizerem que o pai trabalhava para o Departamento de Estado.

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Foi só quando Mark tinha 18 anos que soube com certeza que seu pai, Bryan Mills, era um agente da CIA. Nesse dia, seu pai ligou e pediu a Mark que levasse cabos de ligação até o escritório dele, porque a bateria do carro havia descarregado.

Mark se lembrou de ter dirigido por portões de controle no norte da Virgínia até chegar a um estacionamento para funcionários da CIA. Mesmo assim, seu pai nunca mencionou uma palavra sobre o trabalho dele.

Nos anos seguintes, Mark, de 67 anos, foi descobrindo alguns detalhes aqui e ali — após a aposentadoria de seu pai e mais tarde em um serviço memorial para ele na sede da CIA, em Langley.

Mas foi só nesta semana que Mark soube, por um repórter do Washington Post, que seu pai havia se envolvido em operações de espionagem sensíveis em Cuba.

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O nome dele apareceu recém-revelado em um memorando dirigido ao diretor da Inteligência Central, detalhando uma operação de vigilância que deu errado.

Em 1959, após a revolução cubana, a mídia estatal chinesa abriu um escritório em Havana. A CIA não perdeu tempo e colocou escutas no local. Um ano depois, Bryan Mills foi enviado para expandir a operação, alugando um apartamento diretamente acima da agência chinesa para instalar mais equipamentos, de acordo com o memorando.

Mas depois que Mills deixou Cuba, as coisas deram errado. As autoridades cubanas prenderam três técnicos — que se passavam por turistas — cuja verdadeira missão era instalar equipamentos de vigilância no apartamento que Mills havia alugado.

“As informações iniciais indicaram que os três técnicos seriam acusados de espionagem ‘contra o povo da China’”, lê-se no memorando. O arquivo termina com uma nota sombria: “As esposas dos técnicos estão dizendo aos vizinhos que seus maridos estão em uma viagem. Esta história será ajustada dependendo do que a governo cubano decidir.”

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Mark disse que seu pai nunca mencionou a viagem a Cuba.

“Mas eu sabia que ele tinha passado por situações complicadas”, disse ele. Quando criança, no início da década de 1960, seu pai ia para o Vietnã, e a família não tinha notícias dele por um ou dois meses. Ele via a preocupação constante no rosto de sua mãe.

“Ele nunca falava sobre nada disso”, disse Mark. “Para mim, ele era apenas o pai.”

Este conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA.