Artigo: Consequências de uma intervenção militar em Caracas

Só a menção da ideia já ajudou o governo Maduro, mas sua aplicação afastaria países latino-americanos e não teria garantia de sucesso

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Por Rick Noack
Atualização:

Em agosto do ano passado, o presidente Donald Trump provocou temores de uma guerra nuclear ao ameaçar a Coreia do Norte com “fogo e fúria”. Na época, a ideia de ele vir a apertar a mão de Kim Jong-un parecia apenas uma piada idiota. 

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Mas, naquele mesmo mês, Trump pensou seriamente em invadir a Venezuela, segundo reportagem da agência Associated Press. Numa reunião no Salão Oval da Casa Branca, o presidente perguntou várias vezes aos assessores presentes se os EUA teriam condições de invadir o conturbado país sul-americano. Trump discutiu posteriormente o mesmo assunto em reuniões com o então presidente colombiano, Juan Manuel Santos, e outros líderes latino-americanos, ainda segundo a reportagem. 

Presidente Nicolás Maduro durante cerimônia de promoção de militares da Força Armada Nacional Bolivariana, em Caracas. Foto: EFE/PRENSA MIRAFLORES/USO EDITORIAL/NO VENTAS

A AP disse que a Casa Branca não quis fazer comentários a respeito. Um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, porém, disse à agência que “todas as opções” foram consideradas para “ajudar a restaurar a democracia e devolver a estabilidade à Venezuela”.

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Seguem algumas ressalvas que podem bem ter sido apresentadas a Trump pelos líderes latino-americanos, e por sua própria equipe, para dissuadi-lo de uma iniciativa com potencial de provocar uma enorme reação regional e internacional.

1. A simples discussão do assunto ajuda enormemente o governo venezuelano. Há meses, as reservas monetárias da Venezuela vêm se esgotando, trabalhadores altamente qualificados fogem do país e investimentos externos continuam a declinar. A hiperinflação tornou praticamente sem valor a moeda local, o bolívar. 

O governo venezuelano atribui a crise econômica às sanções dos Estados Unidos. Renegociar a dívida ficou cada vez mais difícil para a Venezuela, uma vez que suas exportações e seu comércio exterior diminuíram muito ou pararam inteiramente. 

Responsabilizar os EUA pelos percalços da Venezuela tornou-se uma estratégia já esgotada pelo governo do presidente Nicolás Maduro. Mas a ameaça de Trump de uma “opção militar” foi o bastante para dar novo alento a Maduro e desencadear protestos anti-EUA em Caracas, mesmo que poucos analistas nos Estados Unidos tenham levado a sério a hipótese de invasão. 

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Em resposta à reportagem, Maduro repetiu suas críticas anteriores aos EUA e aproveitou para denunciar a “visão supremacista e criminosa” de Washington. A reação foi semelhante à do Irã no início do ano ante o apoio anunciado por Trump a grupos opositores iranianos. O regime de Teerã acusou imediatamente a oposição de ser ligada a potências estrangeiras. Uma pesquisa feita em seguida constatou que apenas 9% dos iranianos achavam que o apoio de Trump ajudou os opositores que foram às ruas se manifestar contra o governo.

2. A reação a uma eventual invasão não foi só da Venezuela. Respondendo à ideia de invasão levantada por Trump, o então assessor de Segurança Nacional, H. R. McMaster, e outros funcionários de alto escalão argumentaram que uma intervenção dos EUA na Venezuela poderia facilmente provocar uma reação em cadeia na América Latina. Líderes latino-americanos, quando questionados diretamente por Trump se apoiariam tal ação militar, rejeitaram totalmente a ideia. 

Alguns governantes latino-americanos aprofundaram em anos recentes suas relações com os EUA, apesar da impopularidade de Donald Trump entre eleitores da região. Uma intervenção militar americana na Venezuela poderia levar a pressões populares para forçar esses líderes a repensar sua cooperação com os Estados Unidos.

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3. Os riscos da “diplomacia das canhoneiras”. Uma mudança de governo na Venezuela nascida no exterior poderia facilmente resultar na subida de um regime no mínimo tão instável quanto o de Nicolás Maduro. A Guerra do Iraque é o exemplo mais óbvio do que acontece quando regimes são derrubados por potências estrangeiras. 

Na América Latina, golpes apoiados pela CIA ou intervenções diretas dos Estados Unidos resultaram frequentemente em desastre. Em 1954, por exemplo, a derrubada arquitetada pela CIA do então presidente da Guatemala, Jacobo Arbenz, levou uma guerra civil e a uma sucessão de juntas autoritárias.

Segundo a reportagem da AP, durante as conversações sobre a Venezuela Trump citou as invasões do Panamá e de Granada, nos anos 1980, como exemplos de intervenções bem-sucedidas dos Estados Unidos no exterior. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ 

*É JORNALISTA

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