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Assassinato de John F. Kennedy completa 60 anos com novos indícios sobre a morte que abalou o mundo

Depoimento de ex-agente do serviço secreto alimenta nostalgia sobre o caso, num momento em que a geração do pós-guerra avança na terceira idade

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Foto do author Daniel Gateno
Atualização:

Com pitadas de livros de suspense e mistério, a morte de John F. Kennedy, que completa 60 anos na quarta-feira, 22, é questionada até hoje. O veredito final da Comissão Warren, que determinou que o presidente foi morto por Lee Harvey Oswald até hoje gera dúvidas nos Estados Unidos e em outros países.

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Em meio a tanta polêmica, um dos momentos mais revisitados da história americana foi remexido este ano por uma testemunha do assassinato. O ex-agente do Serviço Secreto dos EUA, Paul Landis, optou por revisitar os acontecimentos daquele dia ensolarado de 22 de novembro de 1963.

Aos 88 anos, Landis resolveu trazer à tona novos elementos para as investigações, que já foram extensivamente apuradas por peritos, acadêmicos e jornalistas. O relato de Landis contraria a teoria desenvolvida na Comissão Warren sobre o que aconteceu naquela tarde em Dallas, no Estado americano do Texas.

Kennedy visitava a cidade antes do início da campanha presidencial para as eleições de 1964. O então presidente não tinha anunciado a sua candidatura à reeleição, mas já fazia esforços para angariar apoio para a campanha e por isso viajou ao Estado do Texas, considerado um bastião anti-Kennedy. O plano era que o então presidente fizesse um trajeto de 16 quilômetros de conversível aberto que passava pelo centro da cidade até o Trade Mart, onde ele iria discursar durante um almoço. No conversível aberto, estavam o motorista, o segurança, o ex-governador do Texas, John Connally e sua esposa, Nellie. O presidente e sua esposa, Jacqueline Kennedy sentaram-se atrás deles.

O então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, durante evento na Casa Branca em abril de 1963  Foto: William J. Smith / AP

O cortejo passava pela Dealey Plaza quando Kennedy foi atingido por tiros no pescoço e na cabeça, enquanto o governador Connally levou um tiro nas costas. Segundo a investigação, o ex-militar Lee Harvey Oswald puxou o gatilho três vezes, mas errou um dos disparos. A Comissão Warren decidiu que uma das balas disparadas naquele dia atingiu o presidente nas costas, saiu pela frente de sua garganta e continuou sua trajetória atingindo Connally, ferindo suas costas, seu tórax, um pulso e uma perna. Os céticos desta teoria batizaram a versão oficial como teoria da “bala mágica”.

Oswald, que negou qualquer responsabilidade pelos crimes, se considerava marxista e participou do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA. Além disso, chegou a renunciar a cidadania americana e desertar para a União Soviética, mas depois retornou aos Estados Unidos. Dois dias após a morte de Kennedy, Oswald foi assassinado a tiros por Jack Ruby, durante uma transferência para outra prisão. Ruby apontou que cometeu o crime porque queria ser visto como herói nacional.

O então presidente americano John F Kennedy acena de seu conversível aberto um minuto antes de ser assassinado em Dalas, Texas  Foto: Jim Altgens / AP

A versão de Landis

A Comissão Warren chegou a conclusão de que apenas um projétil atingiu Kennedy e Connally porque a bala foi encontrada na maca em que o ex-governador do Texas estava sendo tratado no hospital. Por isso, os investigadores apontaram que a bala tinha saído de seu corpo durante os procedimentos cirúrgicos que salvaram a sua vida.

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Para Landis, que não foi entrevistado pela Comissão Warren, a história é diferente. O ex-agente do Serviço Secreto aponta que ele encontrou o projétil no banco de trás do conversível em que Kennedy estava sentado e não no hospital. Segundo Landis, ele guardou o projétil e colocou a bala ao lado da maca em que Kennedy estava, assumindo que isso poderia ajudar os médicos a descobrir o que tinha acontecido. Contudo, o ex-agente aponta que duas macas se aproximaram e o projétil saltou de uma para outra.

Landis teoriza que o projétil atingiu Kennedy nas costas mas não penetrou profundamente o presidente e acabou expelida quando seu corpo foi retirado da limusine. A versão de Landis contraria à Comissão Warren de que a bala que saiu das costas de Kennedy atingiu Connally e reacende questionamentos sobre a possibilidade de um segundo atirador na cena do crime.

O novo relato de Landis virou um livro que foi publicado este ano nos Estados Unidos: “The Final Witness: A Kennedy Secret Service Agent Breaks His Silence After Sixty Years”,

Paul Landis, um dos agentes do Serviço Secreto que estava acompanhando o presidente americano John Kennedy quando ele foi assassinado, resolveu contar uma versão diferente de sua história  Foto: Amir Hamja/The New York Times

“Eu não sei o que vai acontecer por conta do relato de Landis, mas eu continuo acreditando na história que o meu amigo de longa data, Clint Hill, o agente do Serviço Secreto que salvou Jackie Kennedy de ferimentos mais sérios naquele dia horrível e não acredita na história de Landis”, apontou Larry Sabato, cientista político americano e professor da Universidade de Virgínia e autor do livro “The Kennedy Half-Century: The presidency, Assassination and Lasting Legacy of John F. Kennedy”, publicado em 2014.

Sabato afirmou que a história de Landis é muito suspeita porque, segundo suas apurações, ninguém se lembra de ter visto Landis na sala de cirurgia do hospital. “60 anos é muito tempo, não acredito que seria possível ele ter deixado uma bala na maca ao lado de Kennedy, principalmente com todos os olhos grudados naquela cena”, questionou o cientista político.

“Eu não acredito que o FBI ou o Congresso americano irão autorizar novas investigações por conta do relato de Landis, a história dele tem várias perguntas sem respostas”, aponta Peter Ling, professor de história americana da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, e autor de uma biografia sobre o ex-presidente americano chamada “John F. Kennedy”, que foi publicada em 2013 quando o assassinato de Kennedy completou 50 anos.

Paul Landis aponta para um livro em que mostra onde ele estava localizado durante o trajeto do ex-presidente americano John F Kennedy, que foi assassinado em Dalas, Texas, no dia 22 de novembro de 1963  Foto: Amir Hamja / NYT

Ling destaca que a possibilidade de múltiplos atiradores na cena do crime já havia sido questionada por uma comissão da Câmara dos Deputados dos EUA para a investigação do assassinato de Kennedy. “O que Landis questiona já havia sido achado e a comissão de fato afirmou que tinham evidências de múltiplos atiradores e que Lee Harvey Oswald não agiu sozinho com apenas um rifle”.

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O professor da Universidade de Nottingham aponta que ele acredita que mais de um atirador participou do crime. “É isso que fascina depois de 60 anos, que não sabemos quem eram os outros atiradores e existem tantas possibilidades”, completa o especialista.

Visibilidade

O assassinato de Kennedy segue sendo discutido 60 anos depois por conta de tudo que Kennedy representava, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão. O então presidente, que foi morto aos 46 anos, era o mais novo da história dos Estados Unidos e também o primeiro católico a morar na Casa Branca, sendo que um segundo presidente católico só foi assumir a presidência em 2021, com Joe Biden. A sua administração assumiu o poder em 1960, em plena Guerra Fria, e foi marcada pela adoção de leis que ampliaram direitos sociais e aumentaram a integração racial.

Carismático e bem vestido, Kennedy era considerado um presidente moderno, junto a sua esposa Jackie Kennedy e seus filhos Caroline e John Jr. “O casal Kennedy foi exemplo de modernidade nos anos 60. Eles eram elegantes e definidores de tendências. O que é notável é a sua capacidade de transcender o tempo porque eles poderiam andar por qualquer rua nos Estados Unidos em 2023 normalmente, parecendo da nossa época”, analisa Sabato.

Para Ling, o fato da geração dos Baby Boomers (nascidos entre 1945 e 1964) estar envelhecendo, também aponta para um sentimento de nostalgia desta geração sobre Kennedy. “Nos anos 60 existia um otimismo exacerbado que era representado por Kennedy, um sentimento de que aquela geração iria melhorar o mundo, ir para a Lua e atingir feitos sensacionais. Kennedy era a imagem desta positividade, era considerado um símbolo do futuro”, afirmou o professor da Universidade de Nottingham, no Reino Unido.

O então presidente dos Estados Unidos, John F Kennedy, senta ao lado de sua então esposa, Jacqueline Kennedy, durante o baile de inauguração do mandato de Kennedy, no dia 20 de janeiro de 1961  Foto: AP / AP

“A ideia de que o presidente mais novo da história nos Estados Unidos seria assassinado de forma tão brutal, sentado ao lado de sua esposa, era impensável e um final trágico para um período cheio de promessas e oportunidades”, disse Sabado, da Universidade de Virgínia. “Eu dou uma aula sobre o JFK e o seu assassinato ainda choca os jovens que nasceram décadas depois da morte do presidente Kennedy. E os pais e avós deles contaram esta história e o choque do dia 22 de novembro de 1963 e os seus longos efeitos na história americana”, afirma o especialista.

O professor da Universidade de Virgínia destaca que chegou a conhecer Kennedy quando tinha 11 anos em 1963 e estava participando de um comício. “Como uma criança católica eu era fascinado pelo ex-presidente e fiquei totalmente traumatizado quando ele faleceu”.

Teorias da conspiração

Os claros questionamentos aos resultados da Comissão Warren em relação a morte de Kennedy fizeram com que diversas teorias da conspiração fossem criadas para justificar o assassinato de Kennedy. A lista vai de CIA até União Soviética, passando pelo regime de Fidel Castro em Cuba, até os cubanos anti-Castro e a máfia americana.

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“Existem tantas teorias porque os americanos ficaram insatisfeitos com o Relatório da Comissão Warren e porque para a maioria das pessoas, um ato tão covarde e desastroso não parece possível ter sido executado apenas por Lee Harvey Oswald”, destaca Sabato.

Segundo Peter Ling, da Universidade de Nottingham, uma das principais teorias é de uma possível participação da CIA na morte de Kennedy porque eles não confiavam no ex-presidente e acreditavam que ele não deu o apoio necessário a organização após o conflito da Baía dos Porcos em 1961, quando uma operação feita por exilados cubanos nos Estados Unidos e apoiados por Washington falhou em sua tentativa de retomar o controle de Cuba, que estava sob administração de Fidel Castro desde 1959.

Um tanque do exército de Cuba se posiciona próximo de grupos contrários ao regime de Fidel Castro, que estavam exilados nos EUA e foram armados e treinados por Washington para invadirem a ilha  Foto: Reuters/Reuters

Além disso, segundo essa teoria, Kennedy diminuiria gradativamente o número de tropas americanas no Vietnã caso fosse reeleito, o que não agradaria a CIA.

“Todas as evidências indicam que Kennedy era um guerreiro da Guerra Fria e queria uma posição forte no Vietnã, principalmente após o fracasso da operação da Baía dos Porcos, então acredito que ele manteria tropas no Vietnã se tivesse sido reeleito e manteria a retórica da Guerra Fria, então não existem grandes indícios de que esta teoria é verdadeira”, avalia Ling.

A participação da União Soviética na morte de Kennedy também é citada como uma das principais teorias da conspiração e seria uma forma de produzir uma crise em Washington e fortalecer Moscou, assim como a acusação de que o ex-ditador de Cuba Fidel Castro estaria envolvido na morte do popular ex-presidente.

“Kennedy autorizou tentativas de assassinato de Castro em Cuba em diversas ocasiões, então existem teorias de que Castro poderia ter feito o mesmo com Kennedy. Esta teoria faria sentido porque Lee Harvey Oswald foi acusado de ser pró-Castro e o assassinato de Kennedy seria uma forma de ele se mostrar leal a Havana e ao socialismo global”, destaca o professor da Universidade de Nottingham. Ling também aponta que existe uma teoria de que cubanos contra o regime de Castro poderiam ter matado Kennedy pela falta de apoio do ex-presidente aos exilados após o episódio da Baía dos Porcos.

Entre as teorias mais famosas também está a do envolvimento da máfia na morte de Kennedy, por conta de uma insatisfação de diversas organizações criminosas com Kennedy após um suposto apoio da máfia de Chicago ao ex-presidente durante a campanha eleitoral de 1960.

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Arquivos confidenciais

No final do ano passado, o governo americano divulgou uma nova coleção de documentos relacionados ao assassinato de Kennedy, com registros que incluem a viagem de Oswald à Cidade do México várias semanas antes da morte do ex-presidente, em novembro de 1963; a viagem de Oswald à Finlândia em 1959, ano em que desertou para a União Soviética; e imagens de seu pedido de visto cubano.

De acordo com Ling, ainda não é certo quando todos os arquivos serão divulgados. “Avalio que o FBI e a CIA não querem expor as suas falhas de inteligência neste momento. Até agora, o que foi revelado não nos trouxe nada de novo, mas certamente algumas informações sobre Lee Harvey Oswald não foram divulgadas, principalmente as falhas das agências em relação ao seu monitoramento quando ele retornou da União Soviética”.

O especialista também avalia que Washington não quer liberar informações sobre o assassinato de Kennedy em 1963 porque ainda é um acontecimento recente. “Se liberarem informações de 1963, relacionadas a pessoas que ainda estão vivas, então o público vai pressionar por novas informações sobre a Guerra do Iraque e em outros momentos também. Então os arquivos de Kennedy serão revelados, mas não tão rápido quanto esperamos”.

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