À medida que a Guerra do Afeganistão esfriava, a CIA esperava mudar gradualmente seu foco principal do contraterrorismo para focar na espionagem tradicional contra potências como a China e Rússia.
Mas os atentados da quinta-feira, 26, e a série de eventos que se desenrolaram rapidamente desde o colapso do governo afegão e a tomada do país pelo Taleban alteraram esse plano. Como um buraco negro, o Afeganistão pode atrair a CIA e outras agências de inteligência internacionais de volta a uma complexa missão de contraterrorismo nos próximos anos.
As autoridades americanas estão reformulando os planos para conter as ameaças que podem emergir, segundo oficiais e ex-oficiais do governo: negociação de novas bases nos países da Ásia Central; determinar como oficiais clandestinos podem administrar fontes no país sem os postos militares e diplomáticos que forneceram cobertura para espiões por duas décadas; e descobrir de onde a CIA poderia lançar ataques de drones como o deste fim de semana.
Os EUA e seus aliados querem evitar que o Afeganistão se transforme em um paraíso terrorista semelhante à Síria há uma década e ao Afeganistão antes de 11 de setembro, quando o caos da guerra atraiu uma miscelânea de terroristas e novos grupos extremistas nasceram. A ameaça mais urgente no Afeganistão é o braço local do Estado Islâmico, disseram autoridades americanas. Os líderes da Al-Qaeda também podem tentar retornar ao país.
Embora o Taleban possa não querer nenhum dos grupos no Afeganistão, eles podem ser incapazes de mantê-los afastados. A determinação de Biden em acabar com o envolvimento dos militares no Afeganistão significa que, a partir do próximo mês, qualquer presença dos EUA no país provavelmente seria parte de uma operação clandestina que não é publicamente reconhecida.
A nova missão da CIA será mais restrita. Não terá mais que ajudar a proteger milhares de soldados e diplomatas e se concentrará em caçar grupos terroristas que podem atacar além das fronteiras do Afeganistão. Mas a rápida saída dos EUA devastou as redes da agência, e os espiões provavelmente terão que reconstruí-las e gerenciar fontes do exterior.
Os EUA também terão que lidar com parceiros problemáticos como o Paquistão, cuja ambiguidade frustrou gerações de líderes americanos. William Burns, o diretor da CIA, disse que ela está pronta para coletar inteligência e conduzir operações à distância, mas ele disse aos congressistas americanos neste ano que a capacidade das operações de reunir inteligência e agir em relação às ameaças diminuirá.
Sem uma grande presença militar dos EUA no Afeganistão, qualquer ataque de drone contra um alvo do Estado Islâmico ou da Al-Qaeda terá que partir do Golfo Pérsico. Esses voos longos reduzem a quantidade de tempo que os aviões têm para caçar alvos, aumentando o risco de erros e alvos perdidos.
O Departamento de Estado ainda precisa garantir o acesso a bases em países da Ásia Central que já fizeram parte da União Soviética, e não está claro se isso vai acontecer. A Rússia deixou claro que se opõe a qualquer presença dos EUA na Ásia Central. Enquanto as ex-repúblicas soviéticas às vezes tentam equilibrar a influência de Moscou com acordos com Washington, a Rússia exerce muito mais controle do que há 20 anos, quando os EUA tiveram acesso a bases no Usbequistão, Tajiquistão e Quirguistão.
A história mostra que essa ação multitarefa pode ser difícil e que existem custos. Quando os militares e a CIA se concentraram na guerra do Iraque, o Afeganistão sofreu com a desatenção. Um novo governo mais hostil na China emergiu enquanto os EUA estavam obcecados com o retorno da ação russa na Europa e a ascensão do Estado Islâmico. ] SÃO JORNALISTAS
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.